Amigo, por gentileza, irei declamar-me, vai se acostumando: Gal, de 18 anos, fotógrafa, estudante de Publicidade e Propaganda, estava sentada, esses dias, numa manhã qualquer, em minha frente, com as pernas cruzadas e palheiro na mão direita.
O sono matutino consumia-me, e ela sentenciou: “O artista incompreendido contaminou a cena cultural. Em todo lugar ele está”.
Acendi um cigarro, e prestei atenção. “Ele acha que é gênio. Fala sobre sua arte como se fosse um vanguardista dos anos 20”, diz ela, sorrindo. “Então, ele seria o cara que sempre garganteia sobre os feitos de sua arte, mas, no fundo, no fundo, é um idiota”, esbocei, tentando compreendê-la.
Ela meneou a cabeça, concordando.
Gal domina a arte da ironia e nunca – ou quase nunca – sabemos quando ela está brincando ou falando sério. Malu é fã do avô Machado de Assis, o mestre mor da ironia nas letras portuguesas, e adora um samba, a nossa folia sonora.
Pena que o escritor nunca ganhara um Nobel da Literatura, premiação sempre que escolhe a galera que escreve em inglês. Nada a ver. Mas isso é outra história.
Bem, nobre amigo que me aturou até aqui, deixe eu lhe contar: conheci-a há mais ou menos três, quatro meses. Ela era caloura de Publicidade e Propaganda na Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), e eu veterano em Jornalismo que estava finalizando um livro-reportagem sobre a Rádio Libertária à lá gonzo.
Quando a vi pela primeira vez, fiquei impressionado: ela tomou meu cigarro e deu, duas, três tragadas, devolvendo-me. Olhei-a e pensei: “que menina folgada”.
Foi amor à primeira vista.
Após pouquíssimos dias de convivência, desisti de rotulá-la. Malu é tão fofa quanto os versos de Manuel Bandeira, e tentar achar uma palavra para descrevê-la, entre as várias insignificantes dos dicionários, é perda de tempo.
Gal é cabeça.
Gal tem a sensibilidade do clique, e eu fico impressionado. Quando deparo-me com suas fotos, tenho a impressão de que sou fisgado pelos ângulos de sua Canon. Diariamente solto alguns de meus comentários de tiozão dominical sobre sua arte, e ela ri. E eu adoro sua risada. É leve, é bela, é envolvente, é benevolente, é atraente e é aconchegante.
Atento leitor, Gal é dez, dez não, é mil. “Você é um jornalista/escritor, Beck”, me disse ela, quando cheguei em sua casa, com a cara toda queimada, após lhe mostrar uma reportagem. Neste dia, o fatídico 28 de abril de 2017, a gente correu da polícia como nos tempos de chumbo. Corremos da polícia em plena democracia.
Gal é a metonímia que recheia os versos do poeta, é a elipse da frase que chama o leitor para dialogar com o texto, é a metáfora que forma imagens, é a anáfora, como estas que vos escrevo mediocremente, é a ironia que deixa a sentença leve; Malu é a Gal Costa do século XXI com pitadas de Maria Bethânia, duas de suas deusas.
Gal, tu não és uma artista incompreendida. Nunca. Está longe de sê-la. Tu és uma artista da porra, desculpe-me a falta de elegância, porque tuas fotos são sensivelmente maravilhosas. Elas falam o que não consigo dizer. E dão-me tapas na cara, porque são magistrais.
Adoro-te, Gal, saibas disto.