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Crônica do amor que nasce – ou morre

Quinta-feira à noite, jogo do Corinthians, tinha de secar algum rival do alvinegro, mas não tem jeito: converso lirica­mente com Paulo Mendes Campos. Relê-lo dá nisso.

Xico Sá, boêmio do Crato, mais um gênio do copo, do amor, da crô­nica, respondeu o clássico O amor acaba, de Mendes Campos, uma das mais lindas e populares crôni­cas de amor.

Ao reler a resposta do homem, cocei os dedos para pôr no papel algumas frasesinhas vagba. Ei-las:

Quando começa o amor, Xico? Quando começa o amor, Paulo?

O amor começa, vos digo, em uma noite de sexta-feira, a noite da folia, da cachaça e do pecado.

O amor começa em qualquer geografia, LSD ou GPS.

O amor começa na redação do jornal, revendo um filme cabeça do Godard, ou um do Truffaut, Jules et Jim, em que “o cara que nasceu para filmar o amor” retrata dois amigos que se apaixonaram pela mesma mulher. Haja coração!

O amor começa, principalmen­te, num bar fuleiro, onde se con­versa por horas a fio sobre as lutas anarquistas do século XX e a ascen­são do discurso de ódio no Brasil pós-golpe.

O amor começa, sabe onde? No puteiro, com alguém gritando “vou tirá-la desse lugar, vou levá-la para morar comigo”, acredita Odair José?

O amor começa com “você sabe o que temos de fazer agora, né”.

O amor começa com abraços, beijos, olhares e sorrisos.

O amor começa quando a fila para, porque o amor é ligeiro, é rá­pido, é avançado, o amor é o cen­troavante do Corinthians em im­pedimento.

O amor, contudo, não carece de tira-teima comentado por Arnaldo César Coelho e Casagrande.

O amor é impedimento, sim. Como o tipo que ama mulher com­prometida, por exemplo. Todavia isso não significa que o amor de al­guma forma não tenha começado, o amor pede licença, o amor de­testa cartório, burocracia, o amor é tão forte quanto aos onze dias de maldade que incendiaram Goiâ­nia em 2016.

O amor é tão lindo que às vezes já começa subindo os créditos e the end. Vai duvidar que não era amor o que deveras sentia?

O amor começa num luar com Jorge Ben Jor, comida natural e as­séptica. Nunca confie num amor que começa com todo aquele cená­rio perfeito, maré cheia, sol cintilan­te, música good vibes, tudo no mais áureo clichê da lindeza.

O amor tem de começar na contramão, o amor tem de come­çar numa avenida do Setor Central de Goiânia, para depois ir ao litoral carioca, hotel, baseados, o sal ma­rinho em suas peles, uma metidi­nha em pé romântica antes da lari­ca, a fome de viver, de amar, a perna bamba diante do garçom que pen­sa “porra, já fui bom nisso”.

O amor começa quando o cafajes­te bate na mesa e diz “o amor acaba”.

O amor, porém, acaba quando o vagaba é tomado e tudo come­ça de novo.

Por essas e outras que fico aqui, bebendo e pensando... amar é coi­sa de superbonder, amor é... parou, seu cronista, amor é estátua e um casal apaixonado num bar cheio de almas vazias, olhando-se e bei­jando-se no embalo da sinfonia do tesão, do êxtase e do prazer.

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