Bons filmes nascem de histórias surpreendentes, enredos envolventes, produções de qualidade técnica e bons atores. A sétima arte requer investimento, técnica e oportunidade para que talentos possam surgir.
O Cinema Sul Coreano, com o filme Parasita (2019), conquistou três estatuetas no Oscar de 2020 e fez história por ser o primeiro filme de língua não inglesa a ganhar na categoria Melhor Filme, mostrando ao mundo a importância de incentivos públicos e privados para que o cinema nacional possa crescer e dar frutos.
Mas, antes que o Cinema Sul Coreano chegasse a esse patamar, sofreu um forte período de estagnação durante a ditadura militar de 1961, que permaneceu vigente por 26 anos e afetou negativamente a indústria cinematográfica, por meio de leis que dificultavam a criação de estúdios e restringia a quantidade de filmes independentes, além da forte censura.
Desse modo, a população não consumia a produção nacional que era escassa e pouco divulgada, preferindo os filmes internacionais. O primeiro incentivo veio da parte do governo, que cria, ainda no regime militar, um sistema de cotas para filmes nacionais nos cinemas do país.
O programa previa um mínimo de exibição para filmes nacionais por ano, que atingiu seu pico de 146 dias, em 1985. Com o fim do regime, os incentivos aumentaram, e foram criados um conselho cinematográfico, uma academia de cinema e um arquivo de cinema, tudo para valorizar a produção nacional e trazer incentivos de financiamento público e privado.
Essa política, chamada "onda coreana" ou hallyu, é um projeto do governo para fortalecer a cultura coreana, por investir em vários setores culturais do país, como música pop, quadrinhos, séries de TV e cinema.
Incentivos no mundo
Para quem achava que investir em cinema é apenas coisa de sul-coreano está enganado. Em todos os países existe alguma lei ou projeto de incentivo para a sétima arte, a diferença é a qualidade e a força de tais incentivos.
Um dos exemplos clássicos de arrecadação de fundos para a produção de filmes por meio da iniciativa privada é o Marketing indireto. Neste modelo, empresas investem em determinados filmes para que seus produtos possam aparecer nos mesmo, gerando uma forma de publicidade.
Em 1995 a Mercedes-Benz pagou US$ 3 milhões de dólares para que o veículo Z3 Roadster aparecesse no longa 007 Contra Goldeneye, como o carro do agente secreto James Bond. A ação de marketing rendeu para a marca US$ 240 milhões com vendas antecipadas, mais 9 mil pedidos após a exibição do filme.
Outra forma inteligente de atrair produções milionárias e gerar empregos para o país é o "Runaway Productions", termo usado pela indústria americana de Hollywood para descrever produções cinematográficas e televisivas destinadas ao lançamento, exibição inicial ou transmissão televisiva nos EUA, mas filmadas fora de Hollywood.
Nesse modelo os governos de países oferecem 25%, em alguns casos até 60% de reembolso para produções americanas para que o filme seja gravado em seu território. O retorno para o país seria na geração de empregos e visibilidade, já que normalmente tais incentivos requerem alguns pré-requisitos, tais como o diretor ou roteirista ser cidadão do país do set de gravação e o primeiro ou segundo ator mais bem pago na produção.
Países como Canadá, Austrália, Nova Zelândia, México, Malásia e China já vem fazendo uso desse modelo há alguns anos. Nomes como Seth Rogen e Rachel Ac Adams, atores canadenses consagrados em Hollywood, são frutos de tais políticas.
O cinema brasileiro vai muito bem, muito obrigado! Mas até quando?
O Brasil é rico culturalmente e isso reflete na música, na gastronomia, na literatura e no cinema, é claro. O país já chegou perto de ganhar várias premiações do Oscar, com Fernanda Montenegro, Cidade de Deus, Carlinhos Brown, entre outros.
Mas nem só de Oscar vive o cinema, e outras premiações também tem o seu valor. O filme Bacurau, lançado no ano passado faturou o Prêmio do Júri no Festival de Cannes e foi escolhido como Melhor Filme na principal mostra do Festival de Cinema de Munique, na Alemanha.
Este é um dos exemplos, pois o cinema nacional já havia ganhado prêmios equivalentes, de que o Brasil chama sim a atenção e tem a sua essência majestosa e cultural expressa nas telinhas.
Contudo, no cenário político atual o cinema está sendo literalmente abandonado. Um dos exemplos foi o veto que o atual presidente Jair Bolsonaro fez para o Regime Especial de Tributação para Desenvolvimento da Atividade de Exibição Cinematográfica (Recine), que concede isenções para a instalação de cinemas em cidades menores.
Além disso, o projeto também prorrogava os incentivos fiscais da Lei do Audiovisual, que permitem a pessoas físicas e jurídicas abater do Imposto de Renda valores que financiaram projetos de produção cinematográfica e audiovisual aprovados pela Agência Nacional do Cinema (Ancine).
Contudo, ainda existe os amantes da arte e do bom gosto que lutam para que a chama da estética e da polifonia seja exibida ao grande público, para que o mesmo possa sair da realidade por alguns minutos para se alimentar de ideias e questionar a própria realidade.
Um dos exemplos é o trabalho do professor de cinema na Universidade Federal de Goiás e Mestre em Cinema e Televisão pela Escola de Comunicações e Artes da USP, Lisandro Nogueira, com a mostra “o amor, a morte e as paixões”, que chega em sua 13ª edição.
Ele pontua que o atual governo vem fazendo uma "guerra cultural", que como o próprio nome diz, acontece no âmbito cultural , das ideias, dos valores e dos símbolos.
Em sua campanha Bolsonaro não apresentou propostas concretas e sim se baseou em questões morais, dando ênfase para argumentos em defesa de Deus e da família em torno de um moralismo simplório.
Toda forma de arte que questiona tal moralismo é atacada pelo atual governo e o cinema está sendo alvo do mesmo. Contudo, a sétima arte resiste, e nas palavras de Lisandro Nogueira tem o poder de ''agregar pessoas, comunidades, países, e, fortalecer o sentimento de paz e reflexão no mundo.''
*Com informações da BBC e do jornal Nexo