O mistério da casa do sol nascente
Diário da Manhã
Publicado em 10 de abril de 2018 às 00:54 | Atualizado há 4 meses
A música The House of the Rising Sun – que conta uma história de pobreza e tragédias na cidade norte-americana de Nova Orleans – passou a ser conhecida mundialmente através da banda britânica The Animals, em 1964. De autoria desconhecida, a intrigante canção é objeto de estudo de vários pesquisadores, que acreditam que suas primeiras versões podem ter surgido ainda no século XVI, com letras variáveis, bem antes até mesmo da fundação da cidade de Nova Orleans em 1718. Também conhecida como Rising Sun Blues, teve sua primeira documentação fonográfica realizada pelos artistas Clarence “Tom” Ashley and Gwen Foster que fizeram a versão para a gravadora Vocalion Records no dia 6 de setembro de 1933.
No último dia 6, a história da canção voltou a ser lembrada em publicação do site The Vintage News. O autor, Stefan Andrews, afirma que as origens da música “precedem Nova Orleans, e começam a partir de casas ‘obscenas’ do século XVI, consideradas fatais para os jovens homens da época”. Andrews fala sobre a tradição iniciada com Rising Sun, que abriu espaço para que várias outras canções tradicionais fossem redesenhadas por bandas de rock nos anos 1960 e 1970. “Originalmente um folk tradicional, Rising Sun, conhecida através de vários nomes, fala da vida em Nova Orleans, numa época em que a pobreza era fatal para muitas pessoas. Como a maioria das baladas clássicas, descobrir sua autoria é complicado e incerto”.
DESENVOLVIMENTO
A ramificação de baladas que deu origem à famosa The House of the Rising Sun, de acordo com Andrews, surge num momento de maior apelo popular nas letras das músicas, uma espécie de reforma contemporânea na estrutura lírica, que apesar de trazer, através dos instrumentos, elementos presentes nas baladas épicas, tinham como foco narrativas próximas à realidade das pessoas da época. “Musicólogos afirmam que a música é baseada um tipo de baladas que se diferenciava das tradicionais. Elas eram populares entre o século XVI e XIX e, ao contrário das tradicionais – que eram épicas por natureza – falavam de amor, religião, lendas e maravilhas (algumas eram consideradas canções para ouvir consumindo álcool)”.
Nesse tipo de balada, chamada de ‘broadsheet’, era comum que se associasse letras que combinassem com o título de alguma canção famosa, modificando-se parcialmente a estrutura da ‘original’ (como não haviam registros oficiais de música folk na época, é difícil falar em versões ‘originais’). “No caso de Rising Sun, a teoria é de que ela lembra The Unfortunate Rake, um folk do século XVI que através dos anos já foi recriada em um grande número de variantes”. O primeiro registro escrito da letra de Rising Sun que se tem notícia foi feito em 1925, por Robert Winslow Gordon, em publicação da coluna Old Songs That Men Have Sung na revista Adventure Magazine.
Andrews relembra uma letra que fala sobre o medo das DSTs no século XVI. “A primeira variante conhecida desta peça lamenta a morte de um jovem com sífilis. Outras variantes lamentam a morte de jovens soldados, navegantes, cowboys ou empregadas – todos eles perderam a vida muito cedo”. A tendência em associar a canção aos bordéis do século XVI se dá ao fato de que muitos deles, tanto nos Estados Unidos como na Inglaterra, recebem o apelido de Rising Sun (Sol nascente, em português).
VERSÕES
Além da versão considerada ‘universal’, lançada pela banda The Animals em 1964, The House of the Rising Sun já passou pela garganta de vários outros intérpretes influentes na música moderna. Antes mesmo da banda The Animals, foi gravada por Joan Baez (1960), Bob Dylan (1961) e Nina Simone (1964). O fato de várias mulheres também cantarem a música criou uma outra teoria quanto a sua origem. Nesse caso, a ‘casa do sol nascente’ não remete diretamente aos bordéis, mas ao local onde as prostitutas eram retidas para tratar de sífilis. Como a cura com mercúrio não funcionava na maioria das vezes, era pouco provável que elas voltassem para a casa. Essa hipótese foi levantada em 2006, através de uma publicação da BBC: House of the Rising Sun – the History and the Song.
Outra versão memorável foi feita pelo músico norte-americano (de origem árabe) Idris Muhammad, em 1976. Sua versão transportou a música do folt tradicional para o campo da música negra dos Estados Unidos: o funk, soul e o jazz.
Uma das versões mais incomuns da canção foi gravada pelo músico Jandek, em seu álbum Blue Corpse (1987), considerado um de seus mais acessíveis em meio à discografia experimental. O cantor e instrumentista é conhecido pelo estilo recluso, e avesso à imprensa e à exposição pública. Desde 1978, Jandek, através de sua gravadora, Corwood Industries, lançou de forma independente mais de 100 álbuns e DVDs contendo traços de folk e blues executados de forma totalmente incomum – alguns críticos definem o acabamento das canções como “dissolvido”. House of the Rising Sun é a primeira e única adaptação de música tradicional encontrada na discografia de Jandek. Ela contém um arranjo único, e não busca inspiração em nenhum outro arranjo moderno já feito da música.