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FIM DE SEMANA

O rádio de ontem e de hoje

Reportagem do DM traz um recorte deste veículo na história no Estado. Fala ainda de sua “quase morte”, ressurgimento e adaptação na era da tecnologia

Jk discursa no microfone da Rádio Clube Foto Hélio de Oliveira

Ele sobreviveu à ditaduras e à chegada de diversas tecnologias. Moldou o imaginário brasileiro e goiano e continua relevante na era do ChatGpt. Comunica de forma única e instantânea e coleciona momentos gloriosos na história da comunicação brasileira. Neste ano em que se celebra os 100 anos rádio no Brasil, reportagem do DM traz um recorte dessa história no Estado, que é, ainda mais longa do que “A Hora do Brasil”.

Para uma “caixinha” que poderia caber informações do mundo inteiro, o rádio em seus primórdios servia a interesses então governistas. A primeira transmissão radiofônica oficial no Brasil aconteceu no dia 7 de setembro de 1922, durante a comemoração do centenário da Independência e foi veiculado o discurso do então presidente da República, Epitácio Pessoa.

Em Goiás o rádio só veio aparecer em 1942, 20 anos depois. Se vivia a Ditadura do Estado Novo e nas vésperas de o Brasil entrar na Segunda Guerra Mundial. Na época, o capitalismo estava em crise e Getúlio Vargas lançava a emblemática Marcha Para o Oeste, um programa que incentiva brasileiros a migrarem para o Centro do Brasil. E foi neste contexto que surgiram as primeiras emissoras do estado.

O atraso da chegada do veículo em Goiás, de acordo com o pesquisador e professor universitário Edmilson Ferreira Marques, autor da tese “Tecnologia, política e cultura na história do rádio em Goiás”,

020 0 em entrevista a TBC Memória, se deu pela falta de infraestrutura no estado e, sobretudo, à uma rede ineficiente de energia elétrica. “Não havia suporte para rádio funcionar o dia todo. Tinha cidade que nem tinha energia. O desenvolvimento do setor possibilitou as rádios”, explica.

De forma precária, mas mesmo assim com alcance em algumas cidades, a primeira emissora, a Rádio Amplificadora, surgiu em Anápolis. “Era um sistema de alto-falante e Abelardo Velasco teve ideia de fazer um transmissor. Mas não possuía a legalização do estado e funcionava na clandestinidade”, conta.

Assim, a primeira transmissão radiofônica oficial do estado ficou eternizada no dia 5 de julho de 1942 e fez parte da programação do Batismo Cultural de Goiânia, a nova capital, pela ZYG-3, que foi ainda a pioneira nas transmissões esportivas no estado.

Posteriormente, a rádio se tornou a Rádio /Clube de Goiânia S/A e era mantida pelo prefeito da cidade, Venerando de Freitas Borges. “Venerando de Freitas foi incentivado por um outro representante, Francisco Pimenta Neto, enviado na fiscalização da Comunicação, representante do DIP repressão do estado novo”, conta o pesquisador.

Desenvolvimento

Tudo nessa época era amador e feito de forma precária, de modo que nas externas, os fios precisam estar conectados à sede da rádio. Não podia ir muito longe. O cenário começou a mudar em 1946, com a chegada de novas emissoras. Neste ano, João Simonetti e Emetti Simonetti lançaram a rádio Carajá de Anápolis, que desta vez era regulamentada.

No ano seguinte surgiu em 1947, a rádio Xavantes de Ipameri, que foi criada por Augusto Ceva, filho de um importante nome em grupo que construía a Estrada de Ferro Goyaz. De forma geral, as rádios exibiam conteúdos de emissoras de outros estados, como as famosas radionovelas e as canções da Indústria Cultural, do Brasil e sobretudo dos Estados Unidos.

Mas a época de ouro do rádio ocorreu em 1950 e marcou o profissionalismo e a chegada das tecnologias. Neste ano foi fundada, pelo então governador Coimbra Bueno, a Rádio Jornal Brasil Central S/A. “Eles tinham atrelado à rádio a Fundação Brasil Central, que foi muito importante na criação de Brasilia”, explica o jornalista Iúri Godinho, responsável pelo perfil no Instagram @goiastemhistória.

O principal objetivo da emissora em sua criação, era lutar pela transferência da capital federal do Rio de Janeiro para o Brasília. Por isso, tinha como slogan: “Rádio Brasil Central, Fundação Coimbra Bueno. Pela mudança da Capital Federal para Brasília”. Em 1961, com a compra da rádio pelo Governo de Goiás, a rádio se tornou efetivamente um veículo de comunicação governamental.

Com o passar do tempo, a rádio conquistou ênfase no jornalismo e mantendo no ar um dos noticiosos mais antigos do estado, o “Mundo em sua casa”, que existe há mais de 40 anos. A equipe de esporte da rádio ficou famosa e ficou conhecida como Escrete de Ouro. Mas em 2016, foi anunciado o fim da Equipe Esportiva da emissora.

Cici, a precursora

Foi na Rádio Brasil Central que Cici Pinheiro, grande nome do teatro brasileiro, se tornou a primeira voz feminina do rádio goiano; Ela produziu Rádio o programa Magazine no Ar. Depois viriam o Cinema em Revista e Noturno Romântico.

Já na Rádio Clube de Goiânia, escreveu e interpretou a radionovela “Uma Senhora Mais Brilhante Que o Sol”, que marcaria a vinda da imagem de Nossa Senhora de Fátima a Goiânia. Ainda nos anos 1950, Cici Pinheiro mudou-se para São Paulo ao lado de grandes nomes do teatro, fez vários papéis, aperfeiçoou sua interpretação e conviveu com artistas consagrados. Diante da insistência da família, ela voltou para Goiânia, e aqui criou seu próprio grupo de teatro.

Pioneiras e resistentes

Vale lembrar que a Rádio Clube também rendeu frutos e existe até hoje, pelo nome Sagres. Entre os primeiros locutores estavam: Luiz Carlos Pimenta Netto, Antônio Caldas, Waldir Gonzaga, Wilmar Guimarães e Inácio Xavier da Silva que construíram uma programação musical e cultural. A rádio Clube também era responsável pela transmissão em solo goiano do "Repórter Esso" - o primeiro programa jornalístico no rádio brasileiro.

Ao longo da história grandes nomes também estiveram na emissora, como: Lourival Batista Pereira, Dalva de Oliveira, Cunha Júnior, Luiz Espíndola, Conrado de Oliveira, Valdemir Celestino, Lázaro Santos, Sandes Júnior, Barbosinha, Carlos Alberto Menezes, Justino Guedes, entre outros.

Em 1987 a rádio viveu problemas financeiros, se enfraqueceu e perdeu espaço na preferência do ouvinte. No dia 1º de dezembro de 1997, o jornalista e político Jorge Kajuru comprou a emissora que se transformou "Rádio K do Brasil". Com um estilo, digamos, intenso e dinâmico, a emissora se destacou na cobertura de eventos políticos, esportivos e culturais.

Em 2003, agora sob a direção de Joel Luiz Datena, filho de José Luiz Datena, a rádio mudou mais uma vez de nome. Depois de escolha popular, os ouvintes escolheram a "Rádio 730 AM" como a nova marca da emissora. Em 2013, Joel vende a 730 ao empresário e ex-presidente do Atlético-GO Maurício Sampaio.

Em 2019, foi anunciada uma parceria com o político e jornalista Jorge Kajuru para criar a Rádio K Sagres, também em parceria com a Rádio Mania Goiânia.

Entrevista

“O rádio já foi condenado à morte, mas resiste”

A frase é do jornalista Marcelo Heleno, que já passou por 11 rádios, incluindo a Rádio K e 730. Em entrevista ao DM fala da adaptabilidade do rádio na modernidade, cona experiências, entre outros assuntos. Veja trechos da entrevista a seguir

DM - O rádio é relevante após tantas mudanças tecnológicas?
Marcelo Heleno - Sim. Porque o rádio se reinventou e sempre teve um caráter espontâneo e instantâneo. Ele permite falar coisas na hora que está acontecendo, assim como podcasts e sites fazem. Pode transmitir acontecimentos importantes ao vivo, como no congresso, jogos de futebol e julgamentos. Você pode ouvir rádio e fazer outra coisa, tem linguagem própria instantânea que o torna único. Já foi condenado à morte, mas resiste, claro, com público menor, fazendo coisas diferentes e tendo sua relevância. Ele sempre estará vivo enquanto tiver coisas para dizer na sociedade.

DM - Como foi esta adaptação?
MH - Ele teve que acompanhar a evolução da linguagem e das tecnologias. Antigamente as emissoras eram clubes fechados, porque tudo tinha de ser importado. Tinha que comprar as antenas transmissores e, quem custeava eram quem tinha acesso ao serviço. Depois se modernizou e o radiojornalismo os locutores faziam a leitura de jornais impressos. Estamos falando de um Brasil, do início do século XX, em que a maior parte da população era analfabeta e desde então sempre se reinventou.

DM - Qual foi a fase de maior mudanças?
MH - Nos anos 80, com a consolidação da TV como principal meio de comunicação, na chegada dos CDs, DVDs, ele não morreu porque conseguiu se segmentar. Assim se consolidaram rádios de rocks, sertanejas, populares, só de notícias, ou de esportes. Assim foi, acompanhando a evolução e se adaptando aos meios tecnológicos. Uma rádio musical, em que tudo está disponível, dentro do que você quer é maior que streaming.E na áreas do jornalismo, as rádios estão nos sites e portais. As pessoas podem falar nos programas de rádio de outras cidades e países. O radio nao está mais nos aparelhos, se ouve no celular, computador, carro…

DM - Qual história mais marcante viveu no rádio?
MH - Tenho várias histórias marcantes: entrevistei muita gente ma Rádio K depois na 730. Fui um dos produtores do debate de 98 entre Marconi e Iris debate que foi mediado por Juca Kfouri. Kajuru conseguiu articular a passagem de muita gente pela rádio, como Marcelo Rezende. Foi também marcante entrevistar Lula, Brizola e Dilma. Em relação à Dilma, na pré campanha pra primeira eleição, ela concedeu uma entrevista e tudo estava transcorrendo normal. Lá pelas tantas, ela falou que o governo era igual a casa dela em Minas, onde a mãe que comandava a casa, o pai trabalhava chegava e distribuía doces. Aí perguntei para ela: a senhora organiza e Lula bagunça? Acabou sendo divertido, um amigo me ligou que assistiu o programa, que transformou em uma matéria do “Congresso em Foco”, que depois foi para O Globo, Estadão e correu o mundo. Mesmo com uma audiência menor, o rádio consegue se multiplicar utilizando a tecnologia.

DM - Como era rádio quando começou?

MH - Lembro quando era estagiário na Rádio Universitária e fazemos transmissões esportivas com equipamentos obsoletos, mas mais na raça. O repórter era de campo e pista. A gente ficava seguindo o jogador para entrevistá-lo no final primeiro.

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