Uma delícia suculenta que envolve recheio tradicional, leva carnes de frango e de porco, azeitona, guariroba, entre outros ingredientes e técnicas culinárias, sua receita traz saberes guardados e repassados por gerações de famílias. O empadão goiano - assim como o alfenim, a pamonha e a chica doida - está em processo de virar Patrimônio Imaterial Cultural goiano em projetos de lei do deputado Coronel Adailton.
A consagração do empadão, deve ser questão de tempo já que, ao contrário de outras iguarias regionais (a exemplo do arroz com pequi), consegue ser quase unânime. “Aqui, em nosso estabelecimento, o empadão é, sem dúvidas, o prato mais pedido. Ele tem a característica de agradar turistas de diversos cantos do mundo”, afirma um dos sócios de um estabelecimento que vende o prato na conhecida Carioca na cidade de Goiás.
O dom do empadão de agradar, pode ser devido à sua origem miscigenada. Pois, conforme o chef de cozinha vilaboense Aloísio Godinho, a origem de tal prato é remota e vem de longe. “A raiz do empadão vem da massa da empanada (massa quebradiça com manteiga e farinha que não leva fermento), da Espanha, que por sua vez, influenciou a empadinha do sul da França. Quando chegou aqui sofreu adaptações de variados povos, e assim, nasceu o empadão", detalha.
O que caracteriza o empadão goiano, como explica Aloísio, é o seu recheio peculiar, composto obrigatoriamente, por: pão, pernil de porco ou lombo em lasca, coxa, sobrecoxa ou peito de frango em lascas, guariroba, azeitona, queijo meia cura e molho de tomate.
“Se no recheio vier só: frango batata e molho ou então ter camarão ou linguiça não é empadao e sim empada. Para ser empadão precisa ter todos os ingredientes do recheio. E pode ser até um empadão pequeno que se vier com todos esses ingredientes vai ser um empadão. Engraçado né?", reflete.
José Adão e a esposa Elenina vendem empadão na cidade de goiás: prato é quase unanimidade.
Alfenim quase caiu em esquecimento. Foto: imprensa criativa
Valorização
Para o chef, reconhecimento como o título de patrimônio imaterial serve para ressaltar esse modo de saber fazer que foi moldado, guardado e repassado pelas famílias goianas. Ele ressalta que ações de valorização tem sido importantes para que outros pratos tradicionais da cultura regional não se percam no tempo, assim como quase aconteceu com o alfenim.
O doce que veio com a colonização portuguesa foi espalhado em algumas capitais do Brasil, porém ganhou destaque na cidade de Goiás, tem como uma das principais divulgadoras, a vilaboense dona Sílvia da Silva Curado, 90. Há cerca de 60 anos, ela modela alfenins à mão. Faz verônicas, flores e pombas do Divino Espírito Santo. Porém, era uma das poucas a produzir o doce.
“Fazer alfenim é laborioso e artesanal.Trabalha com calda quente que constipa a mão e dá trabalho”, explica Aloísio, ressaltando que nos últimos anos, os vilaboenses começaram a ter mais interesse em aprender e repassarem a receita.
“O historiador Rafael Lino foi um dos repassadores de tal tradição na cidade de Goiás. Ele ministrou cursos da iguaria e há ainda fazedores de alfenim em Pirenópolis e Trindade”.
Resgate
Mas outro doce goiano que não tem recebido a mesma atenção do alfenim e do empadão, segundo Aloísio, são as flores de coco, uma herança mineira. “Elas vieram com os mineiros que foram expulsos pelos emboabas. Eles trouxeram para cá a aranha que em Goiás se transformou em em flor de coco. Não é encontrado com facilidade, sou um dos grandes divulgadores dessa tradição que foi repassada a mim pela doceira Dona Alice”, conta.
Já a professora do curso de astronomia da UEG em Pirenópolis Patricia Rios Pina, que é coordenadora da unidade na cidade, conta que outro doce típico da terra dos pireneus, também esquecido, é o manjar de fubá de arroz. “inclusive ele pouco conhecido pelos mais novos”, ressalta.
“Essa é uma receita que eu ainda não executei, mas sei que algumas famílias ainda fazem. Inicialmente se faz uma calda com açúcar e água, não muito grossa, um pouco mais líquida que a calda do pudim, e reserva. Depois faz um mingau bem consistente de fubá, leite e açúcar. Coloca-se no refratário as colheradas do mingau, por cima a calda e leva ao forno” ensina.
Comidas de Piri
Entre as comidas típicas de Pirenópolis que merecem valorização ela ressalta pratos como a sopa dourada, o queijo leite e a rosca de “mulher parida”. “Tem ainda galinha cabidela, paçoca de pilão (antigamente feita no pilão movido a água), frango caipira com angu, receitas que são tipicamente goianas”, aponta.
Em relação à comida rural, conta que pode se encontrar na cidade histórica, pratos com preparos que nunca saíram das fazendas como: a carne de rendenho, o pau-a-pique, bolo da senzala, cavaco de queijo, matula de galinha e trouxinha da Sinhá. "São receitas que, provavelmente, eram feitas em outras fazendas, porém levavam nomes e o “fazer” diferentes”, explica.
Locais que sempre serviram os pratos são de certa forma sobreviventes. Isso porque, segundo a professora, com o surgimento da alta gastronomia, em meados dos anos 70, muitos chefes de cozinha priorizaram a criação de novas receitas com combinações/sabores diferentes dos tradicionais.
“Mas com o passar dos anos viu-se a necessidade de retomar suas origens e priorizar suas culturas. E daí surgiram várias releituras de receitas tradicionais, o que se pode encontrar facilmente em vários restaurantes de alta gastronomia desde o início do século XXI”, explica.
Chef Patrícia Rios Pina explica que doces típicos de Pirenópolis como o manjar de fubá de arroz tem sido esquecido
Correlata:
Diferença dos empadões entre as cidades históricas
Nascida em Goiânia e moradora de Pirenópolis, a professora de gastronomia Patrícia, conta que parte de sua família é de Jaraguá. Logo, vê certas diferenças na forma de consumir a delícia entre as cidades. “Me lembro que o empadão era uma forma de juntar a família aos finais de semana e não só em datas comemorativas. E aqui em Pirenópolis, para as famílias tradicionais, o empadão só é feito e comido no Natal”, compara.
Quanto ao preparo, salienta que o empadão feito por sua família, sempre colocava o frango desfiado, já em Pirenópolis, as famílias colocam os pedaços de frango. “É bem difícil dizer o que é tipicamente feito em cada cidade, pois cada família tem o seu ‘saber e fazer’, que é sempre influenciado pelo poder aquisitivo do momento e pelo gosto de cada uma”, conclui.
Onde encontrar pratos típicos em Pirenópolis
Fazenda Babilônia - GO-431, s/n - Zona Rural, Pirenópolis
Dona Cida Restaurante - R. do Carmo, 22 - Bairro do Carmo
Casa Nova Empadão - R. Rui Barbosa, 2-194 - Centro
Pamonharia Peixoto - Rua Direita
Restaurante Tempero do Rosário - R. Comendador Joaquim Alves, 27 - Centro
Onde encontrar pratos típicos na cidade de goiás
Tempero e Arte - Av. Contorno Leste e Laro e Carioca
Restaurante Flor do Ipê R. da Boa Vista, 32)
Restaurante Braseiro R. Sen. Caiado, 104
Pamonharia Vila Boa Av. Dário de Paiva Sampaio
Box:
MESA PATRIMONIAL - PRODUTOS GASTRONÔMICOS RECONHECIDOS POR LEI
Marmelada de Santa Luzia, Lei estadual 21.278, 05 abril de 2022; projeto de lei Deputado Coronel Adailton;
Chica Doida, Lei Estadual nº 21.307, 25 abril 2022; Projeto de lei deputado Coronel Adailton;
Capina do Largo de Santa Efigênia, Lei Estadual 21469, 20 julho de 2022, que inclui as quitandas Josephina´s; Projeto de Lei deputado coronel Adailton;
Pamonha, Lei Estadual 21 729, 20 dezembro de 2022; Projeto de lei deputado coronel Adailton;
Doce Alfenim - lei Nº 21.753, 29 de dezembro de 2022, projeto deputado coronel Adailton;
Pit Dog, Lei nº 2028/20) de 08 de outubro 2020, Projeto lei deputada Adriana Accorsi;
Queijo cabacinha Lei Nº 20.963, de 13 de janeiro de 2021, projeto lei do deputado Eduardo Prado.
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Aprenda a fazer empadão goiano receita: Aloísio Godinho
ingredientes
250 ml de banha de porco
1 ovo inteiro
2 colher de sopa de fermento em pó químico.
1 colher de chá de sal
Água até o ponto da massa.
Modo de fazer:
Misture a farinha, o sal, a banha de porco e o ovo fazendo uma farofa dessa mistura com as mãos. Depois acrescente aos poucos a água, amassando com as pontas dos dedos, de modo que fique uma massa podre. Deixe descansar por duas horas em temperatura ambiente. O segredo está em não sovar muito a massa.