Os clubes brasileiros tiveram de ser criativos nos últimos meses para manterem de pé os programas de sócio torcedor. Com os estádios fechados por causa da pandemia do novo coronavírus e sem receitas com bilheteria, as diretorias apostaram em soluções variadas para não perderem a contribuição mensal dos participantes. Em vez de descontos em ingressos, chip de celular, promoções em lojas virtuais e até concurso para lançamento de camisa foram algumas das soluções.
Segundo estimativas de especialistas em marketing esportivo, o sócio torcedor chega a representar até 15% do faturamento dos clubes. A quantidade de participantes dos programas teve quedas acentuadas nesta temporada porque uma das principais motivações para contribuir deixou de existir com a pandemia. As partidas com portões fechados desanimaram quem procura participar de olho apenas em descontos e prioridade na compra de ingressos. Portanto, restou aos clubes mostrar que ser sócio torcedor traz outras vantagens.
No Grêmio, a proposta foi reforçar o comércio virtual. Quem mantivesse os pagamentos do sócio torcedor em dia, teria descontos em dobro na loja do clube na internet. "O clube teve nesse ano uma queda de receita no sócio torcedor de somente 15% pela nossa projeção. Mas conseguimos aumentar em sete vezes o volume de vendas na loja virtual em relação ao ano passado", disse ao Estadão o diretor de marketing do clube, Beto Carvalho.
A falta de jogos ainda faz falta, é claro. O Grêmio estima que em dia de jogos o clube chega a vender R$ 400 mil em produtos oficiais nas lojas da arena. Porém, além de estimular o comércio virtual, a diretoria montou um programa para que os descontos nos ingressos sejam aplicados futuramente, quando a presença de público for restabelecida.
O Cruzeiro teve a ideia de criar um fundo de investimento voltado ao sócio torcedor. O objetivo é unir torcedores que querem emprestar dinheiro a quem quer pegar algum crédito. Só podem participar dessa modalidade participantes da categoria mais cara do sócio torcedor, a Diamante, cuja mensalidade é de R$ 1 mil. Segundo o diretor financeiro do clube, Matheus Rocha, o objetivo é captar R$ 9 milhões em cotas de R$ 25 mil cada.
"A pandemia deixa as pessoas mais distantes e o clube quer estreitar o relacionamento com o torcedor e fazer com que participem dessa vida financeira do clube", disse Rocha. "O fundo de investimento tem condições vantajosas. Estamos fazendo um experimento e temos no nosso radar outras formas de captações também", completou.
Rival do Cruzeiro, o Atlético-MG conseguiu ganhar mais de 20 mil novos sócios meses atrás com um concurso em que os torcedores poderiam desenhar uma camisa especial do time. O Internacional, por sua vez, organizou uma campanha para premiar quem permanecesse como sócio torcedor. Os colorados receberam uma camisa especial e o nome escrito em um monumento na frente do Beira-Rio. Com isso, o clube gerou um aumento de 28% nas receitas em novembro.
O Palmeiras encontrou uma saída diferente. O clube prepara o lançamento da própria operadora oficial de celulares, a Alô Verdão. O intuito é conseguir elevar as receitas e também aumentar a quantidade de participantes do sócio-torcedor, o Avanti. Quem já for contribuinte do programa terá descontos especiais na compra do chip. "Queremos mostrar que participar do Palmeiras como integrante do Avanti vai bem além de só ir ao estádio. Agora trazemos um produto que vale no Brasil inteiro", comentou o diretor de marketing do clube, Roberto Trinas.
Depois de registrar uma queda de 40% no quadro de sócios, o Fortaleza divulgou uma promoção com desconto de 50% em todos os planos, desde que a assinatura seja anual. "Também entendemos o momento que a sociedade como um todo vive. O jogo de futebol é o carro-chefe, e sem ele, o torcedor tem suas prioridades dentro de casa. O desemprego e a redução do salário foi um fato em boa parte de nossa população este ano", disse o presidente do clube, Marcelo Paz.
SOLUÇÕES POSITIVAS - Para especialistas em marketing esportivo, os times de futebol conseguiram captar que o fanatismo da torcida não mudaria mesmo durante a pandemia e sem poder receber público nos estádios. "Acredito que os clubes tentaram manter essa ligação e buscaram diferentes formas de oferecer produtos e benefícios, mesmo cientes das dificuldades. De qualquer maneira, o desafio é constante, e aqueles que tiveram mais criatividade e manterem esse elo próximo, mais oferecendo do que recebendo, certamente colherá os frutos durante e após a pandemia", disse o professor da ESPM Marcelo Palaia.
Para André Monnerat, diretor de negócios da Feng Brasil, empresa especializada em programas de sócios e engajamento de fãs, os clubes procuraram encontrar alternativas que mexessem com a paixão do torcedor. "Normalmente quem se interessa em ser sócio é alguém que vê seu clube como uma parte muito importante de sua própria identidade. As ações que funcionam melhor são aquelas que tocam este sentimento do torcedor, que mexem com símbolos importantes de sua paixão, que o fazem se sentir em uma ligação realmente especial com o clube e como parte de algo maior", acrescentou Monnerat.