
Nos últimos anos, a frase “o clube fechou o maior patrocínio de sua história” tornou-se um motivo de orgulho para os dirigentes brasileiros. Por trás desse fenômeno, as casas de apostas esportivas passaram a dominar o mercado, especialmente nas posições de destaque das camisas, inflacionando os contratos e criando uma relação de dependência financeira entre clubes e esses patrocinadores.
Atualmente, 16 dos 20 clubes que disputarão a Série A do Campeonato Brasileiro de 2025 possuem uma casa de apostas como seu principal patrocinador. Esse número deve crescer, alcançando 90% das equipes, uma vez que Grêmio e Internacional estão em processo de negociação com empresas do setor. Até dezembro de 2024, a dupla gaúcha mantinha parceria com o banco Banrisul. Apenas o Bragantino (Red Bull) e o Mirassol (Guaraná Poty) continuarão com outras empresas como patrocinadoras principais. Esse dado reforça uma tendência crescente no Brasil: de 2023 para 2024, o número de clubes com casas de apostas estampadas no centro de seus uniformes saltou de 11 para 14.
Neste ano, o Palmeiras, que até então era uma das exceções no futebol brasileiro, também se rendeu às apostas. Após dez temporadas de parceria com a Crefisa, o clube paulista fechou um contrato com a Sportingbet. O acordo, com duração de três anos, garantirá R$ 100 milhões fixos por temporada, corrigidos pela inflação, podendo atingir até R$ 170 milhões com bônus por metas alcançadas. O valor fixo representa um aumento de 23% em relação aos R$ 81 milhões pagos pela Crefisa, empresa da qual a presidente do clube, Leila Pereira, é dona.
No discurso em que apresentou o novo parceiro, a presidente do Palmeiras destacou a “credibilidade e capacidade econômica” da Sportingbet. Esse segundo aspecto mencionado é o que torna as casas de apostas esportivas os patrocinadores mais cobiçados pelos clubes. “Quanto mais disputado é um segmento, mais concorrência pelos principais clubes e, por consequência, maiores os preços”, afirmou Ivan Martinho, professor de marketing esportivo da ESPM. Para ele, é impossível prever se outro segmento poderá, no futuro, ocupar o lugar das apostas. “A história nos mostra que outras eras podem surgir.”
Nos últimos anos, nenhum outro setor entrou no futebol com o mesmo apetite das casas de apostas. Elas dominam amplamente o ranking dos maiores patrocínios no futebol brasileiro. Entre os dez primeiros acordos, todos os valores são superiores a R$ 42 milhões anuais, montante recebido por Cruzeiro e Fluminense de seus patrocinadores, Betfair e Superbet, respectivamente. No pódio, estão Flamengo (R$ 105 milhões com a Pixbet), Corinthians (R$ 103 milhões com a Esportes da Sorte) e Palmeiras (R$ 100 milhões com a Sportingbet). O Corinthians, no entanto, é o único clube que recentemente fechou um contrato com valor fixo inferior ao anterior.
Isso ocorreu após o clube romper o contrato de R$ 120 milhões com a VaideBet, em meio a uma investigação da Polícia Civil e do Conselho do clube sobre o pagamento de R$ 25 milhões para uma empresa intermediar o acordo. A suspeita é de que o intermediário tenha sido um “laranja” — uma acusação que o clube refuta, alegando ser vítima.
Por outro lado, o dinheiro que o Corinthians passou a receber representa um avanço em relação ao contrato anterior. Em 2023, a Hypera Pharma pagava R$ 22 milhões por ano para estampar seu produto, as Vitaminas Neo Química, na camisa do clube. Ainda entre os dez maiores patrocínios, nove times registraram aumentos significativos nos valores de seus contratos, com destaque para o Santos, que passou a receber R$ 55 milhões fixos por ano da Blaze, o que representa um aumento de 358,33% em comparação ao contrato anterior.
“Nos últimos anos, vimos o desinteresse de setores da indústria, do comércio e dos serviços em patrocinar o esporte. Tanto que havia uma dependência de bancos e empresas públicas”, explicou o sócio do escritório CSMV Advogados, José Francisco Manssur, que participou da elaboração das regras para o setor de apostas como assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda. Embora o cenário atual revele uma dependência dos clubes das apostas, Manssur vê aspectos positivos. “Quando encontramos um setor privado com alto poder de investimento, disposto a entender que o esporte é uma excelente ferramenta para atingir seu público, isso deve ser considerado uma externalidade positiva.”
A oferta de sites de apostas esportivas no Brasil foi liberada em 2018, mas a regulamentação da atividade no país ocorreu apenas no ano passado. A partir da regulamentação, iniciou-se uma corrida entre as casas de apostas para obter a licença para operar regularmente no Brasil. As empresas autorizadas precisam se adequar às normas aprovadas pelo Congresso, detalhadas em uma portaria da Secretaria de Prêmios e Apostas, ligada ao Ministério da Fazenda. Para atuar no Brasil, cada empresa teve que pagar R$ 30 milhões pela licença.