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O sequestro da amarelinha: a extrema-direita e a captura dos símbolos nacionais

Grupos buscam não somente reivindicar símbolos, mas afirmar uma posição de que estes seriam os verdadeiros patriotas

Imagem ilustrativa da imagem O sequestro da amarelinha: a extrema-direita e a captura dos símbolos nacionais

Pensar nesse “sequestro” dos símbolos nacionais por parte da extrema-direita coloca a necessidade de considerar como esse mesmo pólo político atuou em outros países. Nos países europeus, como é o caso da Itália, da Alemanha, da Sérvia, Suíça, entre outros, a extrema-direita buscou resgatar e reivindicar os símbolos nacionais como uma forma de contraposição aos grupos políticos da esquerda, centro-esquerda e centro-direita.

Tais grupos buscavam não somente reivindicar esses símbolos, mas afirmar uma posição de que estes seriam os verdadeiros patriotas, que lutavam pelo “bem”, pela família, pelos valores inerentes da nação e de Deus. Ocorreu um processo de super-mistificação dest

es símbolos, que tornaram-se rapidamente elementos de identificação.

Nas terras tupiniquins, esse processo parece que assumiu maior intensidade, não somente pelo vácuo deixado nas ruas em 2013, mas também porque a direita conseguiu capturar a insatisfação social e remodelá-la para um discurso mais conservador, de luta - em certa medida vaga - contra a corrupção e em contraposição a uma perspectiva de que a esquerda possuiria certo desprezo pelos símbolos nacionais.

Esses grupos foram às ruas e como forma de se identificarem e se distinguirem da esquerda, dos black blocs, entre outros grupos, a camisa seleção tornou-se este elemento de diferenciação. De um lado, os vermelhos, que supostamente seriam responsáveis pela destruição do país. De outro, os patriotas, que lutavam pelo bem do Brasil.

Esse processo de identificação e de usurpação foi constituído no pós Jornadas de Junho. Os grupos e movimentos sociais que emergiram nesse processo intensificaram o uso da camisa da seleção como uma forma de diferenciação. Vejamos o movimento Vem Pra Rua, o MBL, entre outros. Entretanto, na minha avaliação, esse processo ainda estava em fase de construção.

A operação Lava-Jato e, posteriormente, o impeachment estabeleceram nesse imaginário social uma dinâmica na qual era necessário expurgar o vermelho e a esquerda, resgatar não somente os símbolos nacionais, mas também os supostos valores inerentes da sociedade brasileira. A camisa verde-amarela passa, então, a representar esse grupo de cidadãos de bem, de patriotas. Mas ela também serviria como uma forma de diferenciação entre o “Nós” e “Eles”.

A vitória de Bolsonaro em 2018 cristalizou esse processo, uma vez que o presidente trouxe para si a perspectiva de que a esquerda teria desprezado e vilipendiado os símbolos nacionais. Esse processo torna-se nítido quando verifica-se as cores de sua campanha, seus discursos e como ele “politizou” os símbolos nacionais. Logo, a camisa da seleção deixou de representar o povo brasileiro como uma totalidade e passou a representar um grupo político, uma ideologia, valores e sentimentos.

O futebol deixou de ser o elemento representante da camisa da seleção para se transformar em um símbolo desse espectro político. É disso que emerge a necessidade de resgatar a camisa da seleção, não para a esquerda, mas para a sociedade brasileira.

Matheus Dias, bacharel em Ciências Sociais pela UFG

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