O ex-deputado estadual Lissauer Vieira fez uma composição como Ministério Público em Rio Verde para arquivar uma ação civil pública por ato de improbidade administrativa e se livrar de possível condenação. Pelo acordo de “não persecução cível” Lissauer se comprometeu a doar um caminhão e uma caçamba basculante para a Coop-Recicla, uma cooperativa de material reciclável de Rio Verde.
A promotora de Justiça de Rio Verde, Renata Dantas de Morais e Macedo, que subscreveu a transação com o ex-deputado foi a mesma que instaurou o inquérito civil público e propôs a Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa. Ela relatou que em agosto de 2015 recebeu uma gravação em que a dupla sertaneja João Neto e Frederico convidavam “as pessoas de Rio Verde para a festa de comemoração de 167 anos da cidade, dia 5 de agosto, às 19h, oportunidade em que fariam um show, dizendo que se tratava de um presente do deputado Lissauer Vieira”. A gravação foi amplamente divulgada na cidade e embasou a investigação do Ministério Público.
Segundo a promotora narrou na ação esse gasto de dinheiro público para promoção do nome de Lissauer Vieira feriu os princípios “que regem a administração pública, sobretudo o da moralidade, o da impessoalidade e o da legalidade”. A acusação da promotora sobre o uso de recursos públicos foi que o ex-deputado “usou de cargo público para promoção pessoal” e que isso caracteriza ato de improbidade administrativa. Na época a promotora pediu o bloqueio de bens de Lissauer Vieira até o valor de R$ 2,532 milhões para garantir o ressarcimento dos cofres públicos e multa civil. Lissauer chegou a ter os bens bloqueados por decisão do desembargador Alan Sebastião, do Tribunal de Justiça de Goiás, atendendo pedido do Ministério Público.
Durante as investigações a promotora requisitou da Prefeitura de Rio Verde cópia integral do procedimento de pagamento de despesas com alimentação e hospedagem da dupla João Neto e Frederico e do Governo de Goiás informações concretas sobre procedimento que culminou na contratação da dupla João Neto e Frederico para realização de show em Rio Verde, além do processo de licitação ou sua dispensa bem como contrato, empenhos, liquidação e pagamentos. Com tudo documentado e provado no inquérito a Ação Civil Pública contra Lissauer Vieira foi devidamente instruída.
Acordo
Para encerrar a ação que estava repleta de provas Lissauer Vieira aceitou a possibilidade de promover uma negociação com o Ministério Público e arquivar a demanda. Assistido pelo advogado Dyogo Crosara o então deputado, que era presidente da Assembleia Legislativa de Goiás, reconheceu que a “solução consensual proposta” atendia aos interesses públicos para firmar o acordo de não persecução cível.
Uma lei de 2019 chamada de “Pacote Anticrime” estabeleceu a possibilidade de celebração desse acordo, aliado à Política Nacional de Incentivo à Autocomposição no Âmbito do Ministério Público, inclusive com relação a casos de improbidade administrativa.
No termo do acordo de não persecução cível “por meio do qual se negocia o processo, mediante o reconhecimento do fato” a promotora frisou com a concordância de Lissauer Vieira e seu advogado que ele ficaria obrigado a cumprir uma determinação. Para se ver livre do processo a primeira e principal condição foi reconhecer o fato como verdadeiro para ter o benefício do arquivamento da ação civil pública. A Cláusula Terceira do acordo é incisiva quanto a isso: “concordância do réu” e que ele “aquiesceu”, concordou, com todos os termos do acordo.
“O fato se amolda, em tese, à descrição legal de ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública”, descreveu a promotora. Asseverando que o ex-deputado poderia ser condenado a penalidades como “perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos”, narrou a promotora Renata Dantas.
O acordo teve também a participação de um representante do Estado de Goiás. Assinou o acordo o procurador do Estado Fernando Iunes Machado.
Caminhão
O então deputado Lissauer Vieira concordou em dar um basta na ação e possíveis “sanções cominadas em tese ao ilícito imputado” com a doação de um caminhão marca Volvo ano de fabricação 2011/2011 avaliado em R$ 100 mil na época e uma caçamba basculante para a Coop-Recicla (Cooperativa de Trabalho de Catadores de Material Reciclável em Geral do Sudoeste Goiano). O veículo se destinou a servir para a coleta seletiva de material reciclável para a cooperativa.
Mácula
Para o professor Luiz Signates a medida proposta pelo Ministério Público e aceita pelo ex-deputado Lissauer Vieira encerrou um problema jurídico, mas igualmente representa um problema político. “Uma acusação de improbidade administrativa que foi aceita pelo agente público como verdadeira poderá ser sempre como uma mancha em sua biografia. De um lado ele reconhece que errou e buscou reparar seu erro. Todavia, será lembrado em embates eleitorais como alguém que usou indevidamente de seu cargo ou de recursos públicos para obter algum benefício e isso poderá pesar como suspeito para futuros cargos que ele busque”, afirma o cientista político.