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OPINIÃO PÚBLICA

Racismo no Ambiente Universitário (Parte 3)

Em síntese, é tratado como tema ou objeto de estudo, onde não é gente sentimento, língua, expressão de vida, cultura

Imagem ilustrativa da imagem Racismo no Ambiente Universitário (Parte 3)

Pregam a preservação dessas culturas e se sentem audazes quando assim procedem. E quando, no papel, condenam a discriminação da gente de cor, não se contem na admiração da própria audácia; pedem o reconhecimento público pela sua temeridade generosa em prol dos humilhados e ofendidos...”

Embora muitos dos que assim veem o negro se digam acérrimos inimigos do preconceito racial, por bem intencionados que sejam, só valorizam os aspectos pitorescos dessa comunidade, o que, como esclarece o autor citado, só contribui de certa maneira para retardar o processo de integração do negro ao seio da sociedade atual. Como ilustra Clovis Moura, atualmente essa curiosidade transformou-se em simples interesse acadêmico, especialmente no plano de teses para obtenção de títulos de professores ou a conquista de cátedras: deixou de ser visto como problema e passou a ser encarado como tema universitário. Ficou, assim, desvinculado daquelas razões iniciais que imprimiam aos primeiros trabalhos sobre o negro em ethos interessado, operacional e participante. Quer dizer: até quando o povo negro é o escolhido como tema de tese universitária, de um modo geral não é visto como um problema sócio-político a ter solução. É muito mais objeto de estudo sociológico ou antropológico, para enriquecimento de conhecimentos de estudos acadêmicos, o que revela existência do racismo em sua conotação omissiva, que pode chamar-se também de “o preconceito de não ter preconceito”, conforme a correta expressão de Florestan Fernandes.

Ainda como vitima de um massificante processo de aculturação, o universitário negro é levado a uma verdadeira “lavagem cerebral”, assim mais das vezes desistindo do que é fundamental, que é o combate ao crônico problema da discriminação racial. Para desarticular e mesmo obnubilar ainda mais a carência de consciência crítica dos universitários negros, existem também os já manjados argumentos dos que admitem a hipótese segundo a qual o baixo índice de participação desse segmento nas universidades teria por causa somente os fatores de ordem econômica e não a interferência fundada em ângulos e traços raciais. É como se pudéssemos jogar sobre o negro e outras classes oprimidas todas a culpa por sua baixa condição econômica na pirâmide social. De fato, vem sendo cômodo vê-lo à deriva, como malandro, desocupado, a dissipar o seu tempo “no samba, na maconha e no álcool”, ao certo, é preciso ver essa hipótese sem a intervenção de cediços pruridos acadêmicos, sem vínculos com a panaceia evocativa e nostálgica da “democracia racial”. Quando o negro ainda é o “ponto de referência” no próprio ambiente universitário e vira o único e mais cortejado guru e qualquer delegação esportiva, fica fácil a dedução a quem se deseja atingir fazendo uso (reificado) do visual epidérmico ou o pretexto de carência econômica. O uso do fenótipo, a velha artimanha de recusa à cor, ao mais real e concreto argumento, não passa de mais uma estratégia com que uma ideologia racista atinge um ser total: o povo negro. Conforme exposto inicialmente, discriminamos o fenótipo negro ou indígena não porque o preconceito nos leve gratuitamente a isso, mas porque ele simboliza todo um ser cultural, espiritual, ontológico, que consideramos inferior (sic), quanto ao segundo aspecto – “carência econômica” – é de ser visto como um dado indispensável ao sistema, cuja existência privilegiada depende fundamentalmente das classes sociais chamadas desclassificadas, já denominadas de “exercito de reserva”, mantidas e manipuladas – e exploradas – pelo próprio sistema onde o segmento negro ainda figura como quem tem o dobro de possibilidades de ser analfabeto no Brasil.

Escritor, advogado, integrante da Academia Goiana de Letras (AGL) e mestre em História pela UFG

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