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OPINIÃO

O papel do Brasil no conflito na Síria

De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados – Acnur, o número de pessoas deslocadas em razão da gravidade do conflito instaurado na Síria já ultrapassou os 4 milhões. Esse dado atesta que estamos vivendo a maior crise de refugiados que o mundo testemunhou em um quarto de século. Além dos refugiados, ou seja, sírios que foram obrigados a cruzar as fronteiras do seu país para salvar suas vidas, pelo menos outras 7,6 milhões de pessoas estão deslocadas dentro da própria Síria – muitas delas em circunstâncias difíceis e em locais de difícil acesso. Tragicamente, e sem a perspectiva de resolução da guerra – que já entrou no seu quinto ano –, a crise vem se intensificando e o número de refugiados está aumentando em todo o globo. O marco de 4 milhões de refugiados foi alcançado depois de apenas 10 meses do registro de 3 milhões e, desde então, os números só crescem. Pelo fluxo das taxas atuais, o Acnur prevê que o total de sírios refugiados até o fim de 2015 seja de 4,27 milhões, além de exceder em 1/3 a população que, hoje, já vive no Líbano – país fronteiriço.
Esse conflito vem sendo chamado de a “Guerra da nossa Geração” e já afetou um número incontável de famílias nos últimos cinco anos. Esse cenário é claro para a maioria das pessoas que conhecem, minimamente, o contexto histórico internacional e as origens políticas e religiosas dessa tragédia de proporções internacionais. Desde então, o grupo extremista Estado Islâmico, também conhecido como ISIS, e a filial da al-Qaeda na Síria, Jabhat al-Nusra, vêm assumindo a responsabilidade por violações de direitos humanos sistemáticas e generalizadas. As forças de segurança sírias, por sua vez, continuam a deter pessoas arbitrariamente, regularmente submetendo-as a maus-tratos e tortura, muitas vezes sequestrando-as e mantendo-as em uma extensa rede de instalações de detenção em toda a Síria. Essa afirmação mostra a fragilidade do Estado e a impossibilidade do mesmo, de exercer seu dever de proteção para com seus cidadãos.
A busca de refúgio no Brasil por parte dos sírios vem crescendo regularmente desde 2011. Em setembro de 2013, o Brasil, sensibilizado com o trágico impacto desse conflito, editou a Resolução Normativa n° 17, de competência do Comitê Nacional para Refugiados – Conare, do Ministério da Justiça. Considerando os laços históricos que unem a República Árabe Síria à República Federativa do Brasil, o país se comprometeu a conceder, por razões humanitárias, o visto de viagem apropriado para aqueles que foram atingidos pelas consequências da guerra. A própria Resolução esclarece e informa que consideram-se razões humanitárias (...) aquelas resultantes do agravamento das condições de vida da população em território sírio, ou nas regiões de fronteira com este, como decorrência do conflito armado na República Árabe Síria.
Durante os últimos dois anos, o Brasil contribuiu de maneira pró ativa para que esses cidadãos conseguissem chegar com vida até nossa fronteira. Hoje, mais de 1.700 sírios tentam recomeçar sua vida longe da cultura de guerra e da violência generalizada, representando, assim, o maior grupo entre os 7.800 refugiados, de 80 diferentes nacionalidades, que vivem no país. Esse número, apesar de irrisório quando comparado à acolhida dada por países europeus, coloca o Brasil em uma posição de liderança na recepção dessas famílias na América Latina. Porém, essa posição traz consigo uma importante responsabilidade que precisa ser levada em consideração. Vivemos um período onde já não basta apenas acolher e receber essas famílias em nosso território. É preciso ir além. Precisamos refletir e construir políticas públicas integradas que possam, de fato, garantir a dignidade dos refugiados e a integração dos mesmos, através da saúde, da educação, do trabalho legal e da garantia dos princípios de direitos humanos.
Considerando que a guerra está, infelizmente, longe de ter um fim e considerando que a Resolução Normativa n° 17 expirará no próximo dia 22 de setembro, esperamos, com ansiedade, que a mesma seja automaticamente renovada pelo Estado Brasileiro para que este continue fazendo diferença no cenário internacional e na vida daqueles que conseguem cruzar o oceano no intuito de começar uma nova vida.

“(...) o grupo extremista Estado Islâmico, também conhecido como Isis, e a filial da al-Qaeda na Síria, Jabhat al-Nusra vêm assumindo a responsabilidade por violações de direitos humanos sistemáticas e generalizadas.”

(Gabriela Cunha Ferraz, advogada, militante, mestra em Direitos Humanos pela Estrasburgo e coordenadora nacional do Cladem/Brasil - Texto originalmente publicado no blog: http://justificando.com/2015/08/27/o-papel-do-brasil-no-conflito-na-siria/)

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