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OPINIÃO

Mentira na infância

A mentira é o ato de alterar a verdade. As crianças aprendem a mentir a partir das relações estabelecidas e, muitas vezes, os adultos mentem para a criança. Mesmo que “mintam para o bem”, a mentira pode se tornar um modo de comunicação. A mentira da criança é diferente da mentira do adulto. Não significa falta de caráter! Ao mentir, a criança tem a intenção de fazer o que quer fazer sem desagradar o adulto ou cuidador. Ou seja, ela realiza seu desejo e não chateia os pais ao mentir que escovou os dentes e não escovou, por exemplo.

Encarar a mentira da criança como a mentira do adulto faz com que nossas reações pesem e na maioria das vezes as soluções que encontramos não são adequadas. Broncas grandes, com autoritarismo e agressividade são atitudes que passam a evidenciar e estimular as mentiras, pois confirmam para a criança que se a verdade aparecer “papai e mamãe ficarão chateados” e/ou ela será penalizada. Assim sendo, ela mente por medo com o objetivo de evitar o confronto e os pais perdem a oportunidade de entender o porquê da mentira e de explicar as possíveis consequências dela.

Nossa responsabilidade como adulto é escutar nossas crianças, escutar as necessidades delas. Não significa que ela terá tudo o que quer, mas que ela tem segurança para poder falar. Com coerência e constância em nossas atitudes, oferecemos para as crianças a garantia de como vamos reagir às notícias, por mais desafiadoras que sejam. Essa segurança permite que a criança se acalme e, por mais difícil que seja, se abra e se mostre como realmente é. Ela aprende que não precisa mais da mentira, que pode ser ela de verdade. É importante não focar na mentira pura e simplesmente, mas sim avaliar o contexto, o antes o durante e o depois.

Antes dos 6-7 anos a criança não diferencia entre mentira, atividade lúdica e fabulação. Aos poucos a mentira vai evoluindo e somente após 7-8 anos, a mentira adquire uma dimensão intencional. Entre 6 e 8 anos há distinção entre verdadeiro e falso, mas se confunde mentira com erro. Ou seja, a criança mente para não desagradar. Existem três tipos de mentiras: a utilitária, a compensatória e a mitomania.

A primeira delas serve para obter vantagem ou para evitar um aborrecimento. A atitude da criança diante da mentira depende em parte do comportamento dos responsáveis: se são desatentos ou crédulos demais, favorecem seu desdobramento; se são rigorosos e moralizantes ao extremo, podem provocar aprofundamento em uma conduta cada vez mais mentirosa; por fim, se relevam a mentira e não insistem demais no assunto permitem à criança salvaguardar sua dignidade e compreender a inutilidade dela.

A mentira compensatória traduz a busca de uma imagem que a criança acha ser inacessível ou perdida. Inventar uma família mais rica, mais inteligente, façanhas escolares ou esportivas são mentiras compensatórias banais até os seis anos. Após essa idade, essa atitude entra no período transacional, permitindo a elaboração de uma identidade e conduta e a persistência pode indicar um transtorno psicopatológico.

A mitomania é o extremo grau de devaneio fabulatório. É pretensiosa, maligna, perversa e fisiológica. É um falso suporte onde a criança se apega para disfarçar o vazio. A criança mitômana enfrenta carências bastante graves. Por isso, quando se trata de mentiras contadas pelas crianças, precisamos investigar dois componentes: a frequência da mentira e sua função vital.

(Andréa Stefani é psicóloga especialista em crianças e adolescentes e membro da diretoria PAXkids)

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