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OPINIÃO

Chegou, de novo, o Natal

Estamos, de novo, às vésperas do Natal.

E, de novo, se repetem  atitudes e preocupações materiais...

Que presente  vou dar à minha esposa, aos meus filhos, netos?

E o caseiro lá do sítio, o que vou levar pra ele? Tão zeloso, tão trabalhador... E a nossa cabeça vai se enchendo de interrogações e o coração de angústia, muitas vezes...

Tempos difíceis estes de agora, em que para o comum das pessoas tudo está regrado, medido e contado.

É preciso não desinteirar as contas da casa, pois a energia elétrica, com ou sem bandeira vermelha está em alturas inalcançáveis, a gasolina ( em que se prometia, há anos, seríamos autossuficientes ) e o etanol ( que é produção nossa ) sobem a todo momento, sem nenhum controle, os remédios, nem se fala, os alimentos de um modo geral e o salário...ó!!!!

Ver pessoas famintas nas ruas e maltrapilhos por todo lado se tornou cena comum, que não causa mais nem espanto, nem misericórdia, nem nada.

E não é que me refugiei, entrando às esguelhas, num daqueles grupos de pessoas que recolhem mantimentos para um Natal sem fome?

Apresentei meu pacote de um quilo de arroz e me senti aliviado: missão cumprida! Peguei também aquelas roupas velhas que não ia usar mais e doei para uma instituição que cuida de pessoas necessitadas. E fui me sentindo cada vez mais realizado, como se meu compromisso com o bem estivesse sendo rigorosa e zelosamente cumprido.

A gente arranja todo tipo de jeito de ficar bem na foto em tempos natalinos...Fala-se, até, num certo “espírito natalino” que toma conta de nós. E com base nele, lá vou eu, em jornadas contra a fome no Natal, contra o frio, contra a ausência de carinho...Pensei até em trazer uma pessoa de rua para jantar comigo na passagem do Natal.

Pensei em comprar umas coisas e sair distribuindo, pelas ruas, para os necessitados.

Realmente, minha cabeça ficou povoada de ideias mirabolantes. Coisas que eu poderia fazer para passar bem a noite de 24 para 25 de dezembro.

Mas quando tudo estava quase perfeito, veio-me à recordação, a passagem de Paulo, quando escreveu sua primeira Carta aos Coríntios.

Aquele refrão duro, embora totalmente verdadeiro, me batia nos ombros da alma e refletia no rosto do espírito: “ Se não tiver amor...”

Minha erudição se afogou naquela linguagem de Paulo: Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos... Ausente o amor, seria como o bronze  que ressoa ou o címbalo que retine ...

Conhecendo toda a ciência e tendo uma fé enorme...mesmo assim a ausência do amor torna sem qualquer valor todo este tesouro.

Até mesmo o sacrifício, a entrega do próprio corpo para ser queimado, ausente o amor de nada aproveitaria...

Caí em mim.

Comecei a meditar nos outros trezentos e sessenta e quatro dias do ano, nos quais  meu olhar de desconfiança supera em muito minha ajuda desinteressada, minha língua de fogo vai devastando vidas ante minha incontinência verbal, meu embrutecimento dentro de meu próprio mundo me impede de ver os que me rodeiam, suas qualidades e seus defeitos e me inviabiliza dar a mão a quem dela necessite.

E a coisa não ficou por aí. Flagrei-me numa demonstração constante, a todo ano, nesta época, de insinceridade, de maquiagem barata e passageira de minha imagem desgastada pela erosão de tropeços e erros.

Já estava a me julgar um nada, quando não sei como nem de onde me veio um sussurro:

Aproveite o momento do Natal. Não se preocupe tanto com presépios, árvores e presentes...

Deixe que eu nasça na manjedoura de seu coração...Dê-me abrigo. Deixe que eu cresça no ambiente de sua vida porque se isto acontecer você será amável para com todos, em qualquer circunstância. Você aprenderá a ouvir a história do outro e a contar a sua, trocando experiências e confiança. Você não deixará passar em branco o drama que se lhe apresente, e, dentro de suas forças e possibilidades, buscará amenizá-lo. Você será mais deus, embora humano, assim como Eu fui mais humano, embora Deus.

E nunca mais você terá esta angústia do dia 25 de dezembro, mas a tranquilidade do amor distribuído, em todos os dias do ano.

Porque em todos eles você estará comemorando o meu nascimento em sua casa, em seu coração, em sua vida.

(Getulio Targino Lima, advogado, professor emérito ( UFG ), jornalista, escritor, membro da Academia Goiana de Letras - Email: [email protected])

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