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OPINIÃO

Os livros que li em 2015

Apesar de 2015 ter sido um ano perdido, com incríveis retrocessos e marcado por uma degradação inconteste na vida política, afinal, para salvar o mandato da presidenta Dilma arrasaram com tudo, lançando mão da desfaçatez e da mentira, arrastando o executivo, o legislativo, o STF e o PT na ladeira abaixo da degeneração moral e ética, contudo, em termos pessoais, não foi, enfim, de todo perdido: mergulhei fundo em uma leitura extremamente proveitosa.

Iniciei o rol de leituras lendo a biografia de Prestes escrita por Daniel Araão. A biografia em si não traz muita novidade, a não ser a narrativa que faz  dos embates políticos que, sobretudo Prestes trava com a ala dissidente depois que foi para o exílio já na década de 70 em diante ate o seu rompimento com o PC. As suas posições erráticas  que iam da conciliação ao radicalismo (o apoio a Getúlio e o  manifesto de agosto as vésperas do suicídio de Vargas que  propunha a luta armada) denotam um despreparo intelectual e uma formação política eivada de desvios militarista próprio de quem se forjou no caldo de cultura do tenentismo e da doutrina positivista. Depois de ler o livro de Daniel, o que fica registrado na memória é a determinação de luta e a integridade pessoal de Prestes (muito diferente do comportamento dos políticos que se dizem de esquerda de hoje).

Logo de enfiada comecei a ler o livro do cubano Leonardo Padura: O homem que amava os cachorros. Impressionou-me pela acurada e primorosa escrita do cubano aliada a sua postura crítica em relação ao stalinismo e práticas burocráticas do regime cubano. Tinha acabado de reler a trilogia de Isaac Deutscher sobre Trotsky (li pela primeira vez há mais de quarenta anos atrás) e coincidentemente Padura se baseia sua historia nessa trilogia. Uma grata surpresa. Um livro que vale a pena ler.

Li “O Retrato”, de Oswaldo Peralva, um dissidente do Partido Comunista na década de 60 que descreve as mazelas de sua militância quando trabalhou no extinto Comintern, secção de divulgação das teses e informações sobre o movimento comunista internacional. É revelador a narrativa que faz Peralva sobre o controle e manipulação que exercia a União Soviética sobre os PC’s a nível mundial. O rompimento de Peralva com o Partidão no inicio da década de 60 abalou toda a esquerda na época. Somente agora depois de digerida as atrocidades de Stalin e a condução autoritária e subordinada dos PC’s é que se pode dar razão a Peralva e valorizar suas críticas.

Na outra ponta do novelo da história mergulhei fundo na trilogia de Lira Neto na sua trabalhada pesquisa sobre Getúlio Vargas. São três volumes que surpreendem pela riqueza de informações e descrição meticulosa da personalidade de Getúlio. Seus arroubos e motivações autoritárias e ditatoriais tem um fundamento filosófico e doutrinário: a sua formação positivista. Afinal, Getúlio faz parte da escola de Júlio de Castilho e Borges Medeiros, ambos os caudilhos de forte influencia positivista, como a elite militar também o era. Muito do que hoje acontece no país tem sua explicação lá atrás respaldada no que deixou pela sua trajetória a era getulista. Para quem quer entender o que é o Brasil de hoje não pode deixar de ler os três volumes sobre Getúlio.

Por fim, acabei de ler a biografia de Karl Marx, escrita por um professor americano Jonathan Sperber, que traz um enfoque bem pessoal sobre a vida do biografado como suas influências que recebeu no campo filosófico de Hegel e dos economistas clássicos Adams Smith e, especialmente, de David Ricardo. Não deixa de ser interessante a sua leitura. O último livro que acabei de ler no ano que findou foi o do economista francês Thomas Pikket: “O capital no século XXI”. Um livro que demonstra com uma riqueza de dados o processo inerente ao capitalismo de concentração de renda e desigualdades entre pessoas e países. Não pode ser considerado, como alguns queiram um seguidor das pegadas de Marx, pois nem marxista ele é e, muito menos trabalha com os conceitos marxistas como a teoria do valor para explicar as crises cíclicas do capitalismo. Mas, mesmo assim, uma leitura obrigatória.

(Fernando Safatle, economista- [email protected])

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