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– Quem entra as 8h não sente fome. Ela disse com um tom zombeteiro.
– E por que não? Perguntei curioso, ainda sem entender.
– Por quê? Eu não sei, mas me disseram que quem é da limpeza e entra as 8hrs não pode receber café da manhã.
– Ué, mas o administrativo pode!
– Pra você ver como são as coisas. Resmungou, deu de ombros e saiu.
O descontentamento era claro, estava entalhado a golpes diários na expressão dela, e com razão. Uma realidade, infelizmente, comum. Nem sempre esse tipo de descaso se apresenta da mesma forma, mas ele existe. O que poucos notam é a indiferença que o “chão de fábrica” é tratado. O termo – no qual considero no mínimo a legitimação de estereótipos e preconceitos – é usado para classificar o trabalhador comum, pouco qualificado, onde o labor é mecânico e de baixa autonomia, localizado na base da pirâmide do sistema capitalista.
E por falar em capitalismo, com o regime capitalista a desigualdade social se tornou cada vez mais evidente, esta, por sua vez, se manifesta nas mais variadas situações. O simples fato de um trabalhador, considerado chão de fabrica, ser desfavorecido por sua posição profissional na empresa gera um sentimento de humilhação e constrangimento.
A humilhação social é “normal”, o chão de fábrica é pisado diariamente como se fosse apenas o chão da fábrica. Somos iguais enquanto seres humanos, e totalmente diferentes ante a sociedade. O empregador detém o poder, isso é fato. Por outro lado, o empregado depende do seu ofício e se sujeita a exploração, principalmente em um tempo que a crise assombra nosso país.
Hasteada com pompa a bandeira tremula ao vento, exibimos ordem e progresso. O hino ecoa: de amor eterno seja símbolo. Enquanto isso o povo heroico do braço forte sonha com o tratamento justo. Deitados eternamente no expendido berço do capitalismo, esperam.
As pessoas sob essas condições se tornam excluídas, invisíveis dentro da empresa e dentro da sociedade. Mas como resolver o problema de alguém que não vemos? Quem acordará o gigante? Se quisermos resolver qualquer tipo de problema, antes de tudo, precisamos ter consciência dele. Trazer a tona, fazer o invisível ser visto e dar lugar ao excluído.
Seja como for, o axioma fundamental é que todos nós temos um lugar na pirâmide do capitalismo, mas até onde eu sei as pirâmides foram construídas para servir como túmulos.
(Eder Carneiro, escritor)
