As Ciências Sociais são um conjunto de disciplinas científicas que estudam os aspectos sociais das diversas realidades humanas e, nesse contexto, insere-se o Direito, com sua riqueza de opiniões e posicionamentos acerca do mesmo fato.
Na dialética constante do dia-a-dia, no seio da sociedade, são gestadas as normas (conjunto de princípios e regras), as quais, em geral, são utilizadas para regulamentar o comportamento humano.
A promulgação da Constituição Federal de 1988 representou uma grande quebra de paradigma para o ordenamento jurídico brasileiro, visto que entre tantos outros importantes aspectos, trouxe como vetor principal a proteção das liberdades individuais e a segurança jurídica, em especial no que diz respeito às normas processuais e sua aplicabilidade, evitando assim excessos por parte da atuação estatal face ao cidadão, o qual foi fortemente reprimido pela ditadura militar que perdurou no Brasil até 1985.
O atual Código de Processo Civil, em vigor desde 1973, apesar de ter passado por inúmeras alterações pontuais e reformas mais amplas, não conseguiu se adequar a nova realidade constitucional imposta pela Carta Magna de 1988, assim como atender aos anseios da sociedade e dos juristas e operadores do direito, primordialmente no que diz respeito à duração razoável do processo, princípio constitucional expresso, inserido na constituição através da emenda 45 de 2004, o qual reclama celeridade e dinamicidade na tramitação dos feitos.
Diante desse quadro jurídico e social, em 2009 o presidente do Senado Federal nomeou uma comissão de juristas responsável pela elaboração do novo Código de Processo Civil.
Tal grupo de trabalho realizou inúmeras audiências públicas, em vários Estados da federação, promovendo ampla discussão sobre o tema.
Em junho de 2010 apresentou à casa legislativa que o constituiu, anteprojeto da lei, o qual em dezembro do mesmo ano foi aprovado pelo Senado Federal e remetido à Câmara dos Deputados.
Nessa casa legislativa o projeto foi submetido à apreciação de uma Comissão Especial, passando também por nova discussão com diversos setores da sociedade, sendo modificado por mais de novecentas emendas, bem como recebeu aprovação da casa em março de 2014.
Ao retornar para o Senado Federal, sua casa de origem, o projeto recebeu nova apreciação de outra comissão constituída exclusivamente para esse fim, sendo aprovado em dezembro de 2014 e sancionado com vetos parciais pela Presidência da República em 17 de março de 2015.
O novo Código de Processo Civil, Lei nº 13.015 de 2015, ao contrário de seu antecessor, foi dividido em parte geral, que possui seis livros e, em parte especial, constituída por três livros, contando ainda com um livro complementar, que trata das disposições finais e transitórias.
O Código em vigor é dividido apenas em cinco livros, não existindo uma parte geral, a qual, no novo Código, contém normas de aplicação a todos os demais livros da parte especial; desse modo, é perceptível a diferença organizacional e estrutural das duas leis.
Mesmo antes de entrar em vigor, o novo Código de Processo Civil já foi alterado pela Lei nº 13.256 de 04 de fevereiro do corrente ano, modificando o regramento para apreciação e tramitação do recurso especial e extraordinário, para que os mesmos continuem com os contornos delineados no atual código, evitando assim o aumento do quantitativo desses recursos junto ao Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. Tal norma surgiu, basicamente, da insatisfação do Judiciário em relação a esse tema.
A lei modificadora entrará em vigor junto com o novo Código de Processo Civil e, além do regramento acerca dos recursos citados, alterou também, atendendo aos anseios do Poder Judiciário, uma das principais disposições que colaborariam para demonstrar transparência e equidade na tramitação e apreciação das demandas, a qual determinava que “os juízes e os tribunais deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão”.
Desse modo, não haveria discricionariedade por parte do Poder Judiciário sobre qual processo deveria ser julgado primeiro, evitando que os autos que tenham conteúdo complexo ficassem esquecidos eternamente em estantes. Entretanto, por determinação da lei em comento, a qual modifica o novo Código de Processo Civil, o dispositivo entrará em vigor com a seguinte redação “os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão”.
Ou seja, nada foi modificado. O novo código continua perpetuando a forma de julgar definida pelo magistrado, sem qualquer alteração nesse ponto, o que colabora para que as demandas complexas, a exemplo das lides que envolvem domínio e posse de grandes propriedades rurais, tramitem por várias décadas, esquecidas nos gabinetes e secretarias por onde passam.
A entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, por disposição expressa, revoga seu antecessor, aplicando-se como regra a todos os processos pendentes, o que representa enorme alteração no rito das ações que seguem tal norma, tendo reflexos profundos no meio social e jurídico. Mas fica uma pergunta, quando isso ocorrerá? A resposta ainda não é exata, dependendo de uma análise complexa de um conjunto de normas.
Segundo o previsto no novo Código, sua vigência e eficácia se iniciarão em um ano contado da data de sua publicação, que ocorreu na no Diário Oficial da União em 17 de março de 2015, assim nos termos do previsto na Lei 810 de 1949, em 17 de março de 2016, o prazo chegaria a seu fim e o Novo Código de Processo Civil seria aplicado, sendo esse um dos posicionamentos possíveis, atualmente preponderante.
Vale destacar que alguns juristas questionam que o novo Código de Processo Civil já nasceu com graves defeitos técnicos, visto que o período de vacatio legis, sendo esse o prazo que uma lei aguarda para entrar em vigor, ter sido firmado em ano, e não em dias como determina a Lei Complementar 95 de 1998 e, desse modo, aplicando-se tal norma, convertendo-se o lapso temporal para contagem em dias, bem como levando-se em conta que o ano de 2016 é um ano bissexto, o momento para entrada em vigor irá variar, dependendo a conclusão de uma série de interpretações e variáveis.
Independentemente de quando o novo código entrará em vigor, fica a certeza de que apesar de priorizar a celeridade na tramitação dos processos, ele já nasce alijado pelos interesses do Poder Judiciário em detrimento dos anseios da população e da comunidade jurídica em sua maioria.
(Tiago Magalhães é advogado, sócio da banca Santos, Magalhães e Estrela Advocacia e Consultoria, secretário da Comissão de Direito Constitucional e Legislação da Ordem dos Advoga¬dos do Brasil – Seção de Goiás e especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil. E-mails: [email protected] ou [email protected])