Com a humildade que hoje lhe é peculiar, atestando inclusive o quanto já caminhou pelas estradas do aperfeiçoamento e do Amor, conta-me um amigo que há algum tempo atrás ele tinha a mania perigosa de examinar doentes e prescrever-lhes remédios, baseado na sua longa experiência de farmacêutico e na vaidade patente de parecer entendido no assunto. Com o passar do tempo e obtendo profundos conhecimentos espirituais, já medicava os enfermos inspirado somente na boa vontade de servir. Não o fazia agora por tola vaidade. Queria ser útil e não media esforços para tanto.
Mas o conhecimento científico e filosófico da Doutrina Espírita a que ele abraçou ardorosamente com sincera ânsia de progredir integralmente, levou-o a reconhecer o erro a que estava incorrendo e deixou de avançar nos campos misteriosos e desconhecidos da medicina, passando apenas a aviar gratuitamente receitas para os pobres que o buscavam na esperança de receberem dele o remédio para os seus males.
E se então um mendigo doente lhe pedia medicamentos, ele o encaminhava primeiramente ao médico e, após, lhe dava o remédio oficialmente prescrito.
E ele, se reportando àquele tempo afoito de vaidade, quando pretendia ser, quiçá, o melhor farmacêutico da redondeza, declarou que certa vez um pobre homem lhe pediu uma consulta, e ele deu-lhe os remédios depois de examiná-lo detidamente.
Mas à noite quando dormiu, sonhou que entrava num hospital muito importante, atendendo a convite de dois médicos sóbrios e veneráveis. Eles o recebiam como se estivessem a receber um eminente colega. Queriam dele uma informação abalizada em torno de uma dúvida científica. E lhe fizeram algumas perguntas inicialmente simples, mas que ele de forma alguma deu conta de responder, caindo numa situação embaraçosa demais, pois devido ao respeito e acatamento com que fora recebido pelos eminentes médicos, e inibido pela vaidade que não o deixava revelar a sua condição de humilde farmacêutico provinciano, permaneceu mudo, envergonhado e profundamente aflito. Diante do seu grande constrangimento, um dos médicos sorriu compreensivelmente, revelando amor, sabedoria e prudência, enquanto lhe falava, com respeito e carinho:
– Não fique aturdido, meu filho, pelo fato de não poder nos elucidar alguns pontos obscuros da ciência médica. Nós também, antigos médicos na terra, trabalhando agora na Espiritualidade, com a séria missão de inspirar e colaborar com os médicos encarnados, às vezes, também, nos embaraçamos diante de dúvidas que aparecem no setor a que fomos convocados a servir, e nesses momentos difíceis tão imensurável parece a nossa responsabilidade, que nos sentiríamos fartamente recompensados se estivéssemos na posição de simples farmacêuticos.
E pela sua boa vontade em servir aos semelhantes, os médicos em questão lhe deram na oportunidade um belo e substancioso ensinamento:
– Instale razão no cérebro e Amor no coração, pois só assim você servirá completamente a seu irmão.
Com a luz da razão, você ilumina o caminho do sofredor; com o Amor, você o ensina a caminhar;
Com o cérebro, você urde a providencia salvadora para um doente, conduzindo-o a um médico que não sofre a febre da ambição, mas a sede abençoada de amparar e socorrer; e com o Amor, você caminhará, “não mil passos, mas dois mil” com esse sofredor, até que Deus o recompense pela sua boa vontade em servir, dando paz e saúde a seu irmão.
Se a Razão é luz, o coração é força.
Instalando no espírito Luz e Força, quem poderá estacar o passo na estrada, ou caminhar em trevas?
Lembre-se mais: seja qual for a sua condição entre os homens, disporá sempre de recursos para servir, pois tudo e todos na vida têm o seu alto significado e a sua portentosa serventia.
...Em seu derredor, o charco pestilento fertiliza a terra; a folhinha seca no chão é sombreiro à formiguinha cansada;
Um sorriso para alguém é alegria revitalizante.
Tudo e todos servem.
Para servir, basta querer.
E você quer servir.
...Deus também o quer assim.
(Iron Junqueira é escritor)