Home / Opinião

OPINIÃO

Inesquecível Liceu de Goiás, Vila Boa II

O Liceu da cidade de Goiás foi, conforme os arquivos, o segundo estabelecimento de ensino secundário fundado, ainda, na era imperial por D. Pedro II. Rememorei em outro artigo, os tempos inesquecíveis vividos estudando para o exame de admissão, no curso preparatório da Professora Colombina. Faltavam apenas 45 dias para o vestibular. Era um estranho, estranho mesmo! No grupo, uma varanda enorme, banco e mesa compridos, eu vinha direto da roça, onde morava, a fazenda Mumbuca. Meu pai contratou uma professora, a mestra Sílvia, para instruir tantos os filhos e filhas, nove no total, como a meninada da redondeza. Eu e outros que já tinham algum preparo, frequentávamos aula à tardezinha, às vezes, avançando noite afora. De forma que, cheguei afoitado naquele curso, mas, já com algum preparo para o exame de admissão.

Assim, os que me olhavam de soslaio, pensando que não passava de um paraquedista, estavam por fora, não sabiam do preparo anterior e minha garra, vontade de vencer. Tanto é que, ao final das aulas, passaram a me assediar, querendo estudar em grupo comigo, no hotel Carrascosa, antigo quartel do exército, onde estava hospedado. Embora todo o drama criado, seja pela recapitulação da matéria, em curto espaço de tempo, noite adentro estudando, com os pés na bacia de água, para não cochilar, seja pela quantidade de concorrentes, oriundos de cursos feitos durante o ano, pela professora Colombina, outros, vindos de municípios vizinhos.

Plagiando o cantor Martinho da Vila – Felicidade! Passei no vestibular - A faculdade da música de Martinho era particular, a minha não, era o Liceu de Vila Boa, pública. Os exames foram em dia de domingo, e supervisionados por figuras inesquecíveis como o professor e diretor, Alcides Ramos Jubé, o Inspetor, Agenor Alves de Castro, chefe de disciplina, Hugo Agentha, e algumas professoras convidadas para auxiliar. Voltei para casa no dia seguinte, pois, havia como dito, a lide da roça. Um mês depois fui me matricular, era o último dia. Instruído pela secretaria de matrícula, peguei um atestado médico, com Dr. Brasil, matriculei-me. Em meu veículo, o cavalo, no mesmo dia, voltei ao convívio da fazenda.

Minha mãe, Maria José, era sem igual, embora não tenha frequentado escola alguma, cutucava meu pai, Pedro Agenor, com vara curta. Foi ela que fez ele contratar a professora Sílvia, para instruir tanto filhos e filhas como meninos que moravam na redondeza. Matriculado embrenhei-me no trabalho, tinha juntamente com os trabalhadores na fazenda, que cuidar da lavoura. Meu pai comprava e vendia gado, para complementar o orçamento da propriedade, de modo que, peregrinava pelas redondezas negociando, eu ficava encarregado da lide agrícola, outro irmão, Jonas, do gado. Por isto, atrasei mais de mês, para voltar às aulas, regressando depois da semana santa. Os professores não me conheciam, portanto, a ausência foi pouco percebida, todavia, os colegas que fizeram o admissão comigo, curiosos indagavam sobre o que havia acontecido? Outros, que havia perdido o ano, com tanta falta. Entretanto, não avaliaram a minha vontade de vencer, romper toda sorte de obstáculos. Em pouco tempo, recuperei o atraso, estudando intensamente, ia anotando a matéria ensinada, com colegas, mormente, aqueles que estudamos juntos, antes das provas.

No primeiro ano eram duas turmas, no segundo, apenas, uma. Embora a metade tenha sido reprovada, havia, também na segunda série, muitos repetentes, o que assegurava turma grande. Entre os repetentes, havia os que não se preocupavam em passar de ano, usando a sala de aulas para fazer baixarias, como espiar as pernas de professoras, ou mesmo, alunas no período da tarde. Naquele tempo, os alunos estudavam de manhã, as alunas, à tarde. Entre os repetentes encontravam-se os mais marotos. Havia também, os que gostavam de imitar professoras, no intervalo das aulas, e, não raro, ela entrava na sala surpreendendo aluno a imitando. Quando a imitação era zombeteira e a professora impertinente havia tensão, seguida de suspensão do aluno. Ela, suspensão, variava de um dia, semana, ou mesmo mês, conforme a gravidade. A cola, era rigorosamente fiscalizada, a punição certeira. Era frequente aluno portando óculos, com uma lente quebrada, imitando o Inspetor, de dedo em riste, vociferando: o senhor aí, não cole não, não cole não!

A temperança do saudoso e inesquecível diretor Alcides Jubé, a sobriedade e vigilância do inspetor Agenor de Castro, acrescidas da ação do chefe de disciplina, Hugo Argentha, somavam-se, harmoniosamente, para manter elevada a moral, respeito, disciplina, no interior daquele inesquecível Liceu, colégio estadual da cidade de Goiás, antiga capital, acrescidas da altivez, civilidade, do corpo docente. Na matemática, a maestria da Professora Edla, nos primeiros anos, era seguida nos últimos anos pela professora Dorci de Castro, filha da professora Colombina. Inestimável professor João Augusto Perillo nas ciências Naturais, outros (as) como Domingos Leite, Artur, Afonso Gomes, Carlota Jubé, Aires do Couto, I. Bastos, Laila e Diná Amorim. Ah! Que bom seria à volta daqueles dias inesquecíveis, mas eles passaram, de repente (música), deixando a saudade morando junto, juntinha, com a gente.

Hurra! E os colegas do grandioso, inesquecível Liceu! Muitos, como Jadirê (Lelê, ainda estudante) José Antônio, Antônio Cupertino, Albion, Benito Camargo, Hélio Craveiro, musas inspiradoras, como Eunice Lobo, Eneida Camargo, Terezinha, Olga, se foram para o outro mundo, amargurando a saudade, ainda mais, daquela época, tenra mocidade, perdida nas brumas do tempo. Onde andarão tantas outras! Os alunos elegiam todo ano, a Rainha dos Estudantes. Assim, indago, onde estará a majestade Céli Lobo, que elegemos e coroamos, Rainha, com toda pompa, festividade, no salão nobre de nosso legendário ginásio? Iony Rizzo, Madalena Mollinari, as irmãs Veiga, a coqueta Irani, em que mundo, estrelas vós escondeis? E o Galeno, orador da turma, nunca mais visto. O José Rocha Lima, Ernani, Longino Caetano, os irmãos Jubé, Valdir, José Lobo, João Costa Campos, O. Nascimento, de Veloso, João Regis e tantos outros, ofuscados pela memória, donde estarão? Quem sabe, perdidos na imensidão do Cosmos, ou absortos nos aplicativos, da era da transitoriedade?

Tudo passou, tão de repente, deixando imensa saudade morando com a gente. Em tempo das frutíferas: Caju, pequi, mangaba, a gente em pequenos grupos, caminhava pelas encostas, outeiros, escarpas, em busca de seus frutos! Ah, a mangustã de sabor sem igual, sombreando imenso quintal! Só mesmo na quimérica Vila Boa, de encantos mil, incrustada no coração deste imenso Brasil! O rio vermelho caudaloso, cortando a cidade ao meio. O Bagagem, com sua água, areia, concitando ao banho mavioso, reconstituinte! “Saudades dos companheiros, companheiras das noites de luar, e, das mocinhas bonitas, enfeites do lugar! Saudades das serenatas, madrugada afora a desabrochar, a natureza da cor de prata, inspirando a gente, à, à, à, cantar!”

Pensando, revejo leitor, nossa vida, na época, embora primaveril, bastante responsável, em busca do conhecimento, maior fonte redistribuidora de renda, em país como o nosso, contudo, a falta de instrução política embota tudo, tornando a sociedade ainda mais tolerante.  No passado, escassez de escolas, agora com quantidade, mas, sem qualidade, a corrupção, renitente, tirando verbas de nossa gente, por isto, educação saúde, segurança, claudicantes, no município, estado e país.

(Josias Luiz Guimarães, veterinário pela UFMG, pós-graduado em filosofia política pela PUC-GO, produtor rural)

Leia também:

edição
do dia

Capa do dia

últimas
notícias

+ notícias