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OPINIÃO

“Chama o síndico!” (W/Brasil, Jorge Ben Jor)

Domingo de Carnaval, sol forte, calor, saudades do futuro, caso isso seja possível. Os pássaros cantam, o cachorro do vizinho uiva muitas vezes. A tristeza dele é de emocionar ao mais indiferente. Cair na casa errada, na vida errada, na música errada, que azar! O lixo está na porta desde ontem, e nada. A Taxa do Lixo foi paga em dia. Agora espero pela próxima conta. A coleta ficou restrita e os detritos se acumulam. Falta água, numa crise hídrica de racionamento que já dura quase dois anos. Aqui não chove normal há seis anos, mas choveu forte numa tarde dessas e inundou tudo. Não sei para quem enviar a conta do conserto do carro. Paguei IPVA no começo de janeiro e a quantidade de buracos nas ruas é recorde em relação a todas as administrações municipais anteriores, inclusive as mais omissas. O IPTU chegou. Será de quase mil reais. Abril já apontando com seu IR de arrebentar. Somos trabalhadores otários e pagantes de tudo quanto há, sem receber nada em troca. Recuso-me a acreditar que alguém almeje um cargo apenas por vaidade. A abulia do executivo assusta.

Ouço Moolight Sonata (Full), de Beethoven. Dela vem uma calma inspiradora. Ontem estive no Carnaval do Bairro Morada do Parque, neste ano não organizado pela Associação dos Moradores devido a problemas pessoais da Diretoria. Policiamento ostensivo e necessário, gente demais, muito além do previsto, e som insuficiente. Nota-se demanda represada do montes-clarense ávido por diversão carnavalesca. Uma semana antes a quantidade de público no ensaio do Bloco Raparigas do Bonfim foi tão grande que gerou insegurança, assombrando a todos, especialmente pelo número de ocorrências policiais.  A sensatez dos organizadores suspendeu a apresentação do grupo. A intenção era brincar o Carnaval de maneira solta, descompromissada, porém mantendo suas bandeiras de ocupação dos espaços públicos e contrárias a homofobia, machismo, racismo e outros atrasos. Então, foi preciso parar tudo, ir para o estaleiro, ainda que alguns componentes do Bloco estivessem no Carnaval do Bairro Morada do Parque.

Hoje às 11 horas tem eclipse parcial do sol. Os astrônomos ensinam como assistir ao fenômeno sem prejudicar os olhos. Indiferentes a ciência, os passarinhos estão alegres, e a cidade mais silenciosa nesta manhã. Os foliões ainda não acordaram. Como é habitual nos feriados, a internet está parada. Quase ninguém lê nada, as postagens e curtidas se reduzem escandalosamente. Alguns fugiram para clubes e fazendas, outros viajaram para a praia mais próxima (Ilhéus, Bahia, 750 km). Belo Horizonte, surpreendentemente, tem um Carnaval de rua animado, com grande número de blocos. Nos quatro anos que morei por lá, a cidade parava, ia toda para Sabará e Ouro preto e dizia-se que era possível sair nu às ruas sem ser visto por ninguém. Isso mudou. A TV mostra ruas cheias de gente precavida, com algum dinheiro no sapato, e celular em casa, levando apenas um aparelho antigo para todo o grupo registrar fotos. Milhares de selfies, não!

Na letra da música W/Brasil, de 1990, cujo nome é referência à agência de publicidade de Washington Olivetto, profeticamente Jorge Ben Jor fala: “Dizem que Cabral 1 descobriu a filial/ Dizem que Cabral 2 tentou e se deu mal/ Amor, dor, dor/ Lá da rampa mandaram avisar/ Que todo dinheiro será devolvido/ Quando setembro chegar/ Num envelope azul índigo/ Num envelope azul índigo/ Chama o síndico/ Tim Maia/ Tim Maia/ Tim Maia/ Tim Maia/”. Uma música pop bem em clima de Carnaval e dá uma sugestão sobre a quem pedir ajuda.

(Mara Narciso é médica e jornlista)

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