Lentamente, cristalizou-se a ideia de que os efeitos da política monetária dependem: 1. Da possibilidade de manipulação das expectativas inflacionárias do setor privado. 2. Da clareza e firmeza da resposta do Banco Central (a sua função de reação). 3. Da convergência entre as expectativas da autoridade monetária e as do setor privado para evitar “surpresas” disruptivas que surpreendam o mercado financeiro. 4. Da capacidade de comunicação do Banco Central, que reforça a sua “credibilidade”.
O problema é que a resposta do Banco Central aos frequentes choques conjunturais (a sua função de reação) depende, além de um parâmetro fixado politicamente, a “meta de inflação”, de dois outros (variáveis no tempo), que, intuitivamente, devem existir, mas são de difícil estimação: o PIB potencial e a taxa de juro real de “equilíbrio”, aquela que estabilizaria a taxa de inflação no pleno emprego.
Como é evidente, a convergência entre as “crenças” do setor privado e do Banco Central só não produzirá “surpresas” quando elas coincidirem na estimação desses parâmetros. Isso produz uma poderosa âncora para as expectativas inflacionárias, condição necessária, mas não suficiente, para a estabilização da taxa de inflação em torno da “meta” politicamente estabelecida.
Em poucas palavras, o sucesso da política monetária (que depende, necessariamente, de políticas fiscal e trabalhista adequadas) exige um Banco Central capaz de responder com rapidez aos “choques”, de acordo com regras estabelecidas. Isso reduz a probabilidade de “choques de segunda ordem” produzidos por “surpresas” nos mercados em resposta a eventuais “novidades” inesperadas.
Com todas as incertezas que cercam as estimativas do PIB “potencial” e da taxa de juro real de equilíbrio, a política monetária é, na melhor hipótese, 50% de conhecimento objetivo e 50% de arte e intuição.
É uma atividade na qual o “sucesso” deve ser buscado por tentativa e erro, numa aproximação assintótica a dois resultados mensuráveis: a estabilização da taxa de inflação e a economia próxima ao nível de pleno emprego. É por isso que exige competência e paciência.
A política monetária, por si só, não tem a capacidade de aumentar a produtividade do trabalho, isto é, o crescimento do Produto Interno Bruto, mas experiências malsucedidas têm enorme capacidade de inibi-lo. Um exemplo frequente é quando ela não é acompanhada por uma política cambial inadequada.
O Banco Central, sob o comando do competente economista Ilan Goldfajn, tem sabido utilizar a plena autonomia operacional que lhe conferiu o governo Temer. Soube esperar: 1. A absorção dos efeitos dos controles de preços anteriores. 2. A resposta dos preços acumulados dos serviços que respondem devagar àquela dos juros. 3. Aproveitou o “vento de cauda” da passagem de uma safra agrícola pobre para uma abundante. Aproveitou, sem alarde, a rapidíssima queda da taxa de inflação acumulada em 12 meses, de 9% em maio de 2016 para cerca de 4,5% em março de 2017, para reduzir sem precipitação a taxa de juros. Isso depõe a favor da credibilidade do portador da mensagem transmitida pelo Banco Central.
Não sabemos se a taxa de juro real neutra é, neste momento, de 3%, 4% ou 5%. Mesmo não sabendo qual ela é, se acreditarmos na sua existência, podemos intuir que ela depende do estado da “conjuntura”.
No nosso caso particular, do sucesso das reformas que estão sendo propostas pelo governo, especialmente a da Previdência (para devolver a possibilidade da volta do equilíbrio fiscal num horizonte aceitável) e a trabalhista, que, somadas a outras medidas microeconômicas, criarão as condições para um aumento da produtividade do trabalho com ajustes de preços e não de quantidade do emprego, o que acelerará o crescimento econômico.
A taxa de juro nominal fixada pelo Banco Central é a soma da taxa de juro real de equilíbrio com a expectativa inflacionária. Esta parece bem ancorada em 4,5%. Na minha opinião, seria uma afoiteza reduzi-la para fazer concessão ao marketing. Isso nos deixa com uma só conclusão: se queremos reduzir a taxa de juro real, fundamental para a volta do crescimento, apressemo-nos a aprovar as reformas propostas por Temer.
(Delfim Netto, formado pela USP, professor de Economia, foi ministro e deputado federal)