Na noite de 22 de maio, mais uma vez o mundo se viu impotente e perplexo diante do ataque terrorista em Manchester, Inglaterra. O atentado, reivindicado pelo Estado Islâmico, também conhecido como ISIS e Daesh, é o segundo ataque à Inglaterra em 2017: o primeiro aconteceu em março, em Westminster, o Parlamento Inglês.
Somente com esses dois ataques perpetrados à terra da Rainha, 28 vidas foram ceifadas e mais de cem pessoas ficaram feridas. Mas esses não foram os únicos ataques do grupo extremista este ano: em abril, atacaram a França, fazendo dois mortos e dois feridos e o Egito, com 47 mortos e mais de cem feridos; em março, foram mais de 40 mortos e mais de 50 feridos no Afeganistão; em fevereiro, mais seis mortos no Afeganistão. A lista de ataques parece não ter fim.
De acordo com o FBI, terrorismo é “o uso ilegal da forc¸a ou violência contra pessoas ou propriedades para intimidar ou coagir um governo, a populacao civil, ou qualquer segmento da populacao, em prol de objetivos poli´ticos ou sociais. E o objetivo do Estado Islâmico é a expansão pela África e Europa do califado hoje instalado do Iraque até a Síria, na tentativa de criar o primeiro estado jihadista do mundo.
Em um levantamento superficial, encontramos dados de que desde os anos 1970, mais de 20 mil pessoas foram mortas e mais de 50 mil ficaram feridas em ataques terroristas. E, se os números chocam, a escalada da violência choca ainda mais: durante as décadas de 1970 a 2000, foram 1988 mortos e cerca de 8,3 mil feridos. Somente em 2001, foram 4687 mortos e mais de 13,5 mil feridos. Ou seja, em um único ano, o número de vítimas dobrou em relação às quatro décadas anteriores, um dado estarrecedor.
Ataques como o de Manchester, em um show com crianças e adolescentes causa revolta e a primeira reação que se pode ver nas redes sociais é o ódio respondendo ao ódio, nada mais natural. Assim também aconteceu com o ataque ao metrô de Madrid em 2004; ao de Londres, em 2005; à maratona de Boston, em 2013, apenas para ficar no mundo ocidental. O marco inicial de todo esse movimento talvez tenha sido o ataque terrorista de 11 de setembro de 2001, em Nova York.
Entretanto, essa reação é muitas vezes destinada à uma denominação ou grupo cultural, tomando-se a parte pelo todo. Foi o que aconteceu nos Estados Unidos logo após o 11 de setembro, com ataques a mesquitas e pichações como “Fora Árabes”. Há, porém, de se observar que desde o primeiro momento, quando o ódio fala mais alto, em todos esses exemplos acima, existem as contracorrentes, que partem em socorro àqueles que são aviltados por sua raça ou religião. Isso é o que se vê no mundo real.
Mas não é o que se vê nas redes sociais. O mundo virtual se tornou campo para todo tipo de discussão e propagação das mais variadas ideias, além da propagação do ódio e da desinformação. Para todo e qualquer acontecimento, a impressão que se tem ao acompanhar a timeline, é estarmos vivendo uma disputa, como uma final de campeonato, um Fla x Flu em que todos perdem e, em casos de terrorismo, com a propagação do medo, somente os terroristas ganham. Sim. Dentre as questões que merecem reflexão, está justamente o desejo do terrorista em fazer com que aquele episódio se propague, rapidamente, pelos quatro cantos do mundo. O filósofo Zygmunt Bauman, em sua obra “Medo Líquido” (2008), explica essa questão com bastante clareza: “Se o proposito dos terroristas e´ espalhar o terror entre a população inimiga, o exercito e a policia dos inimigos certamente vao assegurar que esse objetivo seja atingido num grau muito maior que o nivel ao qual os terroristas seriam capazes de alcançar”. (p. 26).
Para nós, enquanto sociedade, de nada irá adiantar execrar o povo árabe ou os muçulmanos em razão dos atentados realizados por grupos extremistas; ou os refugiados sírios na Europa. Basta pensarmos que na história da Humanidade, as Cruzadas foram cristãs e o Ku Klux Klan foi fundado por homens brancos que buscavam a supremacia branca. O horror pode estar onde menos se espera.
(João Paulo Vani é presidente da Academia Brasileira de Escritores. Aluno de doutorado do Programa de Pós-graduação em Letras da Unesp/SJRio Preto, é atualmente pesquisador visitante na University of Louisville, nos Estados Unidos)