O assunto pode parecer inoportuno ou no mínimo dispensável! Não se trata de uma reflexão antropológica, filosófica ou sociológica em torno da questão, só não se pode negar, que “está na cara e bem debaixo do nariz”. Segundo o Aurélio é “parte da barba que cresce sobre o lábio superior”, substantivo masculino, vulgo, bigode. Em alguns lugares como Portugal, Cuba, por exemplo, não é muito difícil encontrar mulheres, que levemente ostentam um – buço.
Historicamente, desde os primórdios os pelos sempre tiveram um papel importantíssimo no nosso corpo. Uns mais, outros menos. Cultiva-los ou não, vaidade para uns, estética ou higiene para outros. Estudos apontam que há aproximadamente 30 mil anos, nossos ancestrais já sabiam que era possível retirarem os pelos do rosto. Questão hormonal ou de gênero, também são determinantes para se ter ou não os “amados” e “temidos” bigodon. Na verdade, a tradição cultural em algumas sociedades de se ostentar ou não um bigode, está intimamente ligado aos aspectos de virilidade, masculinidade e respeito.
Na antiguidade oriental, os egípcios já usavam os pelos do corpo como um elemento de diferenciação social. A barba representava status e era muito comum na aristocracia. A exceção estava na classe sacerdotal, que a depilação total representava “o distanciamento do mundo e dos animais”.
Entre os gregos na antiguidade clássica, a barba era muito comum, como podemos observar nas figuras dos grandes pensadores. A proibição do seu uso veio com a dominação macedônica, sob o comando de Alexandre Magno, O Grande.
Os romanos tinham a tradição de não retirarem a barba, num importantíssimo ritual de passagem. Os senadores cultivavam a barba, como símbolo de poder e status. Foi na Civilização Romana que surgiram os primeiros cremes de barbear, a partir do óleo de oliva.
Durante a Idade Média (V - XV), com o episódio histórico do Cisma do Oriente (XI), a divisão da Igreja cristã, também fracionou os barbudos. Buscando diferenciar os clérigos da Igreja Católica Apostólica Romana (Oc.), dos ortodoxos gregos (Or.), além de judeus e muçulmanos, que também eram comuns o hábito da barba, os clérigos ocidentais, retirou as suas. Dentro do contexto medieval, outra polêmica entre os cristãos, foram os pomposos bigodes dos invasores germânicos, que seria outra justificativa para não cultivá-los.
Nos séculos XIX, XX a criatividade do vendedor ambulante King Camp Gillette e com a ajuda do engenheiro do – Instituto de Tecnologia de Massachusetts - William Nickerson, revolucionaram o barbear e a depilação de homens e mulheres pelo mundo, ao desenvolverem os famosos e hoje populares, barbeadores com duas lâminas Gillette.
Agora, um rosto sempre barbeado dentro dos “novos padrões” dos séculos XX e XXI, numa lógica capitalista da venda de barbeadores cada vez mais eficientes e modernos, virou sinônimo de “civilidade e higiene”. Até algumas empresas passaram rejeitar barbudos nos seus quadros.
Nas décadas de 70 e 80, teve início um movimento que se tornou febre nos Estados Unidos, como uma espécie de resistência e “provocação”, o uso de cavanhaques e bigodes entre os homoafetivos. Na música o grupo musical Village People, do inesquecível hit “Macho Man”, o Queen e seu grande vocalista Freddie Mercury, com seus imponentes bigodes que se tornaram uma espécie de marca pessoal, tornaram-se legítimos representantes da cultura gay do final do século XX.
Na Índia – Estado de Madhya Pradesh - por exemplo, alguns policiais ganham extra nos seus soldos se deixarem o bendito bigode crescer. “Impõem mais respeito”, afirmou o chefe de polícia Mayank Jain. Acreditam que os bigodes “melhoram a personalidade” dos agentes policiais. Diante de experiências vivenciadas no combate a criminalidade, observaram que os bigodudos eram mais respeitados e bem vistos pela comunidade local.
Falando de Índia, “estranho” seria, um indiano sem seus poderosos bigodes. Portanto, é de lá, que vem o maior bigode do mundo, cultivado por Ram Singh Chauhan há 36 anos, medindo 4,2 metros de ponta a ponta. Em alguns períodos e sociedades, umas mais em outras menos, até os automóveis – Estados Unidos -, simbolizaram poder e ostentação, como na década de 20 do século passado, o modelo Ford T, por seu designer, ficou conhecido como “Ford Bigode”. Veículo confiável, robusto, seguro, simples de dirigir, produzido em série por 19 anos entre 1908 e 1927.
“El bigodon” charmosos, elegantes, grandes ou pequenos, acabaram por se tornarem uma espécie de marca de cada um. É incrível como que o mundo teve personalidades gloriosas e patéticas que tiveram no seu bigode semelhanças e diferenças. Homens que contribuíram para construir um mundo mais alegre, humano e inteligente, ao passo que outros, marcaram pelo terror, loucura e delírio.
Como não falar de bigodes como o de Karl Marx, Otto von Bismarck, Friedrich Nietzsche, Charlie Chaplin, Adolf Hitler, Josef Stálin, Luther King Jr., Salvador Dalí, Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Oswaldo Cruz. De uma forma ou de outra, vaidade, masculinidade, poder ou autoafirmação, sempre foi e será uma marca na personalidade dos adeptos, que destacadamente, ostentaram poderosos bigodes, que aos olhos de todos, orgulharam ou envergonharam o mundo, ameaçando, pacificando ou revolucionando.
Portanto, alguns bigodes históricos, parecem terem ganhado vida própria. E se a beleza está aos olhos de quem vê, eles podem ser para uns inspiração ou decepção; vaidade ou desleixo; sedutores ou charmosos; sexy ou brochantes! Como afirma Adélia Prado, “me dão mingaus, caldos quentes, me dão prudentes conselhos, eu quero é a ponta sedosa do teu bigode atrevido, a tua boca de brasa”.
(Marcos Manoel Ferreira, professor, pedagogo, historiador e escritor. [email protected] e www.vozesdasenzala.blogspot.com.br)