Tenho recebido, pelas redes sociais e e-mails, vídeos e mensagens sobre muitos assuntos: as requentadas malhações a Lula, o pedido de prisão de Aécio Neves e de outros pilantras que trafegam impunemente nos corredores do nosso Parlamento, com a cara mais limpa do mundo, como se eles fossem os certos, e nós, os errados. E, inevitavelmente, chegam alguns que fazem um paralelo entre nossos dias atuais e os chamado “anos de chumbo”, que os ditos prejudicados classificam de ditadura militar.
A cada hora, assistimos na mídia falada, escrita e televisada a comentários sobre atrocidades e desmandos que teriam sido cometidos pelo governo militar, principalmente aludindo ao combate às guerrilhas, sem mostrar que tais guerrilhas existiram de ambos os lados: enquanto os militares combatiam com rigor, e até mesmo com excesso, a corrupção e a impunidade, elementos que hoje pontificam na política foram expoentes da bandidagem nos assaltos a bancos, nos sequestros e em outras atividades que poriam no chinelo atentados que pululam em outros países. E até constituíram uma chamada “Comissão da Verdade”, formada por pessoas comprometidas, todas declaradamente de esquerda, para apurar tudo o que elas próprias fizeram em tempos de antanho, única e exclusivamente para, num explícito revanchismo, semear o ódio.
Para que o cidadão de bem se inteire da situação passada, para compará-la à presente, não deve ler livros e reportagens que falam na Revolução, ou escutar comentários de pessoas já com opinião formada, nem contra nem a favor, pois vai ter uma ideia distorcida e naturalmente parcial. Tampouco devem ler o que se escreveu sobre os militares, pois, como diz o ditado: “O papel aceita tudo, e um exemplo típico é o papel higiênico”.
Para que se faça uma comparação, basta apenas conversar os que conviveram com aquela época, pessoas que hoje estão na faixa etária de sessenta/setenta anos, dentre os quais me incluo, pois vivi a época do AI-5, em que José Dirceu iniciava a vida de agitador, como líder estudantil e presidente da UNE, quando se dizia que as liberdades eram escassas, que o DOPS e o SNI andavam à caça de subversivos, e outras coisas. Convivi, como estudante, com o decreto-lei 477/69, imposto por Costa e Silva, que era o terror dos estudantes, uma espécie de AI-5, mas apenas disciplinava as punições no âmbito das instituições de ensino para conter os desmandos, e que foi revogado pela Lei nº 6.680, de 1979, na abertura promovida por Figueiredo. E como trabalhava e estudava, jamais fui incomodado.
Qualquer pessoa de bem que viveu naquela época dispensava seguranças, podia passear nas praças de dia ou de noite sem ser molestada; não havia o medo mórbido de assaltos à mão armada, que hoje confinam as pessoas em condomínios fechados, reféns dos bandidos; ninguém que fosse correto e trabalhador foi preso pelos chamados “órgãos de repressão”, e as pessoas de bem nada tinham a recear; não havia, como hoje, bandidos famosos nas ruas ou nos presídios, de onde comandam quadrilhas, depois que o Governo desarmou o povo e armou os malfeitores; não se falava em bandidos alojados nos gabinetes do Congresso e das estatais, porque a Revolução, logo no seu início, tratou de varrê-los do cenário político, fechando o Congresso e cassando os corruptos.
Procure saber se naquela época presidiários com tornozeleiras andavam pelas ruas matando e assaltando os cidadãos de bem, pois tornozeleira é invenção recente; informe-se se algum dos cinco presidentes militares ou seus parentes, amigos e auxiliares enriqueceu-se rápida e surpreendentemente como hoje; se as obras públicas não eram precedidas de justas e corretas licitações; se existiam fora do dicionário as palavras “superfaturamento”, “propina” e “caixa dois”, tão em voga hoje em dia, lembrando, ainda, que naquela época nem havia o temor dos “grampos” para apavorá-los; veja que a esquerda daquele tempo, sempre ávida em descobrir mazelas da direita, não descobriu um só ato de corrupção, de roubalheira ou coisa que o valha em qualquer dos membros do governo que ela tinha como repressivo; confesso que a turma dos coturnos e ternos verde-oliva reprimiu, a ferro e fogo, sem dó nem piedade, mas somente a corrupção, a impunidade e a senvergonhice institucionalizada dos dias de hoje.
É evidente que deve ter havido excessos, como é natural, porque não havia naquele tempo meios tecnológicos para detectar com precisão as partes podres sem sacrificar alguma parte boa, como o roceiro, que, ao capinar sua roça, leva sempre alguma planta boa no meio da erva daninha carpida.
Procure saber, com seus pais e avós (e não lendo livros e ouvindo gente de hoje), se o governo militar desviava dinheiro da saúde, da educação, da segurança pública e do saneamento básico para financiar campanhas espúrias de cidadãos que hoje se dizem nossos representantes; como eram as escolas de então, quando o ensino público era disputado pela excelência do ensino, com oportunidades para todos, ressalvando-se apenas o malogro dos convênios “MEC-USAID”, que foram a única guinada errada na nossa educação, único ponto negativo que se registrou em todo o período.
Nossos pais e avós darão notícias de que no chamado “tempo da ditadura”, não havia esses movimentos de rua, que, a pretexto de protestar, desencadeiam atos de vandalismo sem precedentes, tanto quanto os movimentos que reivindicam terras, moradias e outras coisas inexistentes na época, pois a política social bem incrementada não dava ensejo a tais movimentos, e a inexistência deste sistema de cotas não tirava do brasileiro a oportunidade de emprego e vagas nas faculdades; isto sem se falar na escandalosa proliferação de sindicatos, cujo obrigatório imposto sindical serve apenas para custear as mordomias de pelegos e desocupados. O povo vivia sem programas de cunho apenas eleitoreiro, como o “Bolsa Família” e as benesses da Lei Rouanet, que desestimulam o trabalho, pois a fome não campeava, e havia oportunidades de emprego.
Não se viam menores assaltando e matando abrigados pela legislação atual que os protege, até ameaçando-nos a não mexer com um “de menor”, enquanto, geralmente drogado, descarrega a arma em inocentes assaltados, ficando por isso mesmo.
Aqueles que hoje criticam aquele período são os que, coincidentemente, lutavam pelo fim do regime militar, muitos dos quais, depois de ficarem por mais de uma década empoleirados no poder, tentam voltar a comandar a política brasileira, implantando situações para antagonizar o povo com a ordem e a paz.
Em artigo anterior, falei sobre a tragédia da política carcerária, mas ressalvei que os presídios do regime militar, no que se refere à ressocialização, deram exemplo até em países de primeiríssimo mundo. Falem o que quiserem, mas as prisões da época dos chamados “anos de chumbo” deram exemplares resultados.
Há comprovações irrefutáveis de recuperação de presos, que podem servir de exemplo para o mundo inteiro, pois nenhum país e nenhum modelo prisional conseguiu reabilitar tanta gente. Entraram nos presídios assassinos, sequestradores, guerrilheiros, torturadores, fraudadores, assaltantes de banco e ladrões, e saíram empresários bem sucedidos, fazendeiros, pecuaristas, governadores, ministros, prefeitos, senadores, deputados e até dois ex-presidentes da República.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, membro da Associação Goiana de Imprensa (AGI), escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])