A velha raposa Siqueira Campos sempre teve um ministro no STJ para defendê-lo e aos seus protegidos.
Antes, tinha Nilson Naves, que, inexplicavelmente, arquivou, a seu pedido, o Inquérito 524-TO, que apurava uma petição falsa arquitetada em 2004 por um desembargador, muito ligado ao governador, seu padrinho de casamento. Antes, já mandara para o arquivo, em apertadíssima votação (8 X 7), a Notícia-Crime nº 280-TO, contra o conselheiro José Wagner Praxedes, e quem foi levar-lhe a “encomenda” pelo serviço prestado, foi o então secretário todo-poderoso Brito Miranda, segundo ele próprio me confessou.
Em 23/06/1994, quando era eu presidente do TRE/TO e ainda não havia rompido com ele, respondia à Ação Penal nº 59-TO no STJ, que era de grande interesse do governador, pois o desembargador João Alves e eu assináramos, em confiança, a pedido dele, uma ata, que, no entender do Ministério Público, configurava falsidade ideológica; uma semana antes do julgamento, ele mandou avisar-me que eu ficasse tranquilo, pois ele “já tinha conversado com o relator”. Não deu outra: no dia 26/06/1994, meu amigo Helio Miranda, na época advogado de Siqueira, foi dar-me a notícia de minha absolvição durante uma sessão no TRE.
Saiu Nilson Naves, entrou João Otávio de Noronha, como novo “anjo da guarda” do ex-governador. Ao que tudo indica, teve a orientação de Siqueira e Kátia Abreu para correr com o Inquérito 569-TO, derivado da malfadada “Operação Maet” (que me incluiu, no meio de 17 outros que estavam sendo investigados). Para encurtar a história, o ministro relator não deferiu um só pedido nosso. E, para impossibilitar-nos qualquer recurso, não publicou, criminosamente, nenhuma das quatro prorrogações de afastamento, como já contei aqui.
Depois que a denúncia foi oferecida, em 02/12/2011, o processo parou; a ordem de Siqueira deve ter sido esta: segurar até sermos aposentados compulsoriamente ou atingirmos a compulsória normal dos setenta anos. Como os colegas Willamara Leila, Carlos Souza e Bernardino Luz ainda tinham uns anos para a idade septuagenária, foram aposentados como penalidade pelo CNJ. E como eu estava prestes a aposentar-me (em abril de 2014), e o CNJ não conseguiu fazer o mesmo comigo (não havia razão, não daria tempo, mas bem que tentou), decidiu-se que eu ficaria afastado até abril.
Voltemos a Siqueira. Foi protocolada no STJ a Sindicância nº 293-TO contra o velho cacique, que chegou às mãos do ministro João Otávio de Noronha. Enquanto o Inquérito 569-TO teve mais de 520 movimentações durante 4 anos, 4 meses e 13 dias, para apurar pretenso comércio de decisões, a sindicância contra Siqueira tramitou só 16 dias, e houve apenas três movimentações. E, o que é mais gritante: apesar de trazer 3 volumes de documentos comprobatórios da corrupção denunciada, João Otávio, em 16/08/2011, sem ouvir o Ministério Público, mandou arquivá-la sumariamente, numa criminosa rejeição “de ofício”.
Por que o relator não mandou investigar a veracidade dos fatos de que tratavam os documentos? Por que não encaminhou ao Ministério Público ou à Polícia Federal para apurar? No nosso caso, ele investigou por mais de cinco anos, partindo de um telefonema entre dois advogados.
Mas o diligente Ministério Público interpôs agravo regimental contra o simplório despacho que mandou arquivar o processo contra Siqueira Campos. O Regimento Interno do STJ estabelece que o relator “levará em mesa para julgamento” o agravo, significando que deve ser imediatamente, na sessão seguinte.
Isto, pelo Regimento, mas transcorreram nada menos que 14 (quatorze) sessões (02 e 16 de março, 06 e 28 de abril, 04, 12 e 18 de maio, 1º, 09 e 15 de junho, 03, 15 e 17 de agosto, sendo que nas três primeiras de agosto o relator não compareceu), sendo finalmente julgados (após provocação formal nos autos) na sessão extraordinária de 31 de agosto, 6 meses e 14 dias depois, com o resultado mais que previsível: o voto do ministro João Otávio de Noronha foi pela rejeição dos embargos. Mas em 29/05/2012 o diligente Ministério Público interpôs embargos de declaração, que, em 18/09/2012, foram conclusos ao gabinete do relator, que não os julgou. Nesse ínterim, como um dos sindicados, João Costa Ribeiro Filho, assumiu, como suplente, a vaga do senador Vicentinho, os autos foram remetidos em 17/12/2012 ao STF, devido à prerrogativa de foro. Voltando do STF, foi redistribuída à ministra Nancy Andrighi, encontrando-se na sua mesa desde 21/10/2016.
Corria paralelamente a Sindicância 292-TO, com o mesmo pedido, distribuída à ministra Laurita Vaz, que, em decisão monocrática de 07/04/2014, antes de remeter os autos ao TJ-TO para distribuição ao juiz competente, disse: “Esse ´sobe e desce não é incomum, considerando o fato de que, em se tratando de cargos eletivos, os mandatos são transitórios, o que é inerente ao sistema democrático. E esses percalços só militam em favor da impunidade, porque, sem dar tempo de ninguém apurar coisa alguma, eventuais infratores acabam sendo beneficiados”.
É muito cômodo ter um padrinho lá em cima, entre os julgadores, tanto que era perfeitamente previsível que João Otávio, como ministro do TSE, votasse contra a cassação de Siqueira em fevereiro de 2014, quando os fatos superavam em gravidade aos que cassaram o mandato de Marcelo Miranda em 26/06/2009. Mais fiel do que esse ministro, só Nilson Naves, que hoje advoga.
Enquanto isto, quando os magistrados do “baixo clero” retardam qual¬quer julgamento, chega logo do CNJ uma Representação por Excesso de Prazo (REP). Os juízes ficam tão apavorados com o CNJ, que temem escrever até um “junte-se” num processo, porque qualquer despacho pode ser interpretado como favorecimento a advogado, e às vezes querem decidir com rapidez para não ser denunciados e acabam errando as decisões.
Mas escrevo isto só para mostrar ao tocantinense que sujeira não é só no Legislativo e Executivo. Ministro do STJ também é magistrado, e não são só juízes e desembargadores que estão sujeitos ao Conselho.
Mas o atual Corregedor Nacional de Justiça, João Otávio de Noronha, não vai jamais investigar ninguém de seu nível, preocupando-se tão somente juízes e desembargadores no CNJ.
Mas lá também, como se vê, existe bandido de toga.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, membro da Associação Goiana de Imprensa (AGI), escritor, jurista, historiador e advogado, liberatopo[email protected])