Os pastores de Belém
Diário da Manhã
Publicado em 31 de dezembro de 2017 às 03:57 | Atualizado há 7 anosNaquela mesma região, havia uns pastores que passavam as noites nos campos, tomando conta do rebanho. Um anjo do Senhor apareceu-lhes e a glória do Senhor os envolveu de luz, deixando-os tomados de grande temor. Mas o anjo disse-lhes:
“Não temais! Eu vos anuncio uma boa nova, de grande alegria para todo o povo: Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador, que é o Cristo Senhor. Isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido enrolado em panos e deitado numa manjedoura”.
De repente, juntou-se ao anjo uma multidão de milícia celeste, louvando a Deus, e dizendo:
“Gloria a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens de boa vontade”. Logo que os anjos se retiraram em direção ao céu, os pastores comentaram entre si:
“Vamos já a Belém e vejamos esse acontecimento, que o anjo nos deu a conhecer!”
Eles foram, apressadamente, para lá e encontraram Maria, José e o recém-nascido deitado numa manjedoura, como lhes dissera o anjo. Depois que o viram, contaram o que lhes tinha sido falado a respeito do menino. Todos os que ouviram ficaram admirados com as palavras dos pastores. Maria, porém procurava conservar com carinho todos esses acontecimentos e os meditar em seu coração. Logo após os pastores voltaram a seus rebanhos, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, conforme lhes fora anunciado. (Evangelho de Lucas, cap. 2, vv. 8 a 20).
As colinas calcárias em torno de Belém estavam repletas de cavernas. Quando o tempo estava ruim os pastores abrigavam, alimentavam e davam água para seus animais. Jesus nasceu, alguns minutos após a meia-noite. Alguns pastores estavam nos campos e nos arredores de Belém, guardando o rebanho, tanto contra animais predadores quanto contra as pessoas, pois o grande fluxo de transeuntes a Belém provocara a alta dos preços dos alimentos e das ovelhas. Os pastores, certamente, esperavam vender seus animais a um preço satisfatório. Eram homens rudes, mas, como todos os camponeses, de todos os lugares, eram também habilidosos e inteligentes.
Os pastores tinham uma vida difícil e solitária. Durante nove ou dez meses os pastores ficavam ao relento com os seus rebanhos. Eles usavam uma linguagem com sons e palavras especiais, conduzindo as ovelhas para comer e beber água, elas eram o ganha-pão e eles as protegiam com toda a habilidade. Os pastores salvavam as ovelhas que caíam nas fendas das rochas, carregavam as mais fracas nos ombros e chegavam a lutar com outros pastores, se forem obrigados para protegerem o recurso mais precioso: a água. À noite, eles conduziam seus animais para um piquete com paredes de pedra, um covil encimado por espinheiros. Os pastores dormiam atravessados na estrada. Um portão humano com as armas bem perto das mãos. Estando armados com uma funda, tal qual a que Davi usou para derrotar Golias e um bordão, com pregos, os pastores estavam preparados para qualquer emergência.
Naquela noite memorável seria possível que os pastores tivessem dormindo e, posteriormente, despertados devido a luz emitida pelos anjos, por meio do fenômeno da aparição luminosa. Não foi um sonho ou uma visão, mas uma aparição, decorrente de um efeito mediúnico, porquanto por meio do ectoplasma dos pastores, que eram médiuns de efeito físico, foi possível para os anjos transmitir-lhes as mensagens de paz e do nascimento do Cristo. Os pastores de animais foram os primeiros visitante do menino Jesus.
Conforme o anúncio do anjo, o menino encontrava-se enfaixado com ataduras e colocado numa manjedoura. O recém-nascido teria sido banhado e depois esfregado com sal para evitar infecção na região abdominal, então enfaixado em ataduras, tiras longas de tecido para manter o seu corpo rijo, o que se pensava que o deixaria mais forte. Uma vez por dia, nos seis meses seguintes, o bebê teria sido desenfaixado, banhado suavemente e massageado com óleo de oliva ou povilhado com folhas de murta e depois enfaixado outra vez.
Os pastores de Belém representaram para os anjos, os homens de boa-vontade na Terra. Os mensageiros da Luz louvaram a Deus e desejaram paz aos homens de boa-vontade.
“Gloria a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens de boa vontade” Essa máxima informa que o Espírito em sua evolução intelecto-moral, para alcançar adiantados níveis evolutivos subseqüentes àquele no qual se encontra, deverá dispor de boa vontade ou de boa disposição intelecto-moral. A boa vontade, resultado de disciplina, coragem e humildade espiritual, promove a paz consciencial, que é o resultado da conquista de um nível evolutivo para outro nível superior.
As leis morais, gravadas na consciência moral do Espírito, promovem a evolução, avaliam todas as ações e garantem o patrimônio da paz espiritual àqueles que se esforçam e conseguem superar suas más tendências, todas vinculadas ao egoísmo. A verdadeira paz não é um sentimento mórbido, mas uma condição espiritual dinâmica, própria de quem cumpre seus deveres morais com dedicação, ordem e equilíbrio. As virtudes espirituais são reflexos da Paz, em seus diversos níveis de manifestações. O Amor é a paz dos sentimentos, a Esperança é a paz do desejo, a Fé é a paz das paixões, a Felicidade é a paz das emoções, a Caridade é a paz da convivência e a Paz é o efeito da boa-vontade em ação.
O nascimento de Jesus não ocorreu no inverno, quando se celebra o Natal. No frio e na umidade de Dezembro, no pico da estação chuvosa na região, os pastores e seus rebanhos não estariam nos campos, mas recolhidos nas cavernas. Por isto, Jesus poderia ter nascido entre os meses de maio e agosto, primavera ou verão na Palestina.
A celebração do nascimento de Jesus no dia vinte e cinco de Dezembro está relacionada com as solenidades da festa de Mitra, celebrada pelos romanos entre vinte e um e vinte e cinco de Dezembro, data esta que passou a ser considerada o dia do nascimento de Jesus a partir do ano de trezentos e cinqüenta e quatro da Era Cristã. No entanto, somente a partir do século VII, a data de vinte e cinco de Dezembro passou a ser considerada a data oficial do nascimento de Jesus. Não se sabe, ao certo a data do nascimento de Jesus, segundo Clemente de Alexandria (200 d.C.) há várias especulações: 19 ou 20 de Abril, 20 de Maio, 28 de Agosto e 17 de Novembro.
Segundo a tradição lendária, os pastores deveriam ter visto o menino Jesus colocado entre um boi e um jumento. Isto devido aos textos de Isaías, no capítulo um e versículo três, e de Habacuc, capítulo três, versículo dois, de acordo com a Bíblia de Jerusalém: “serás conhecido no meio de dois animais”.
Depois da desmaterialização dos anjos, os pastores foram até o local indicado por um dos anjos, onde havia nascido o Messias tão esperado. Foram até Belém e confirmaram as predições do profeta Miquéia, no capítulo cinco e versículo um: “Mas tu, ó Belém de Efrata, pequenina embora entre as cidades principais de Judá, de ti sairá aquele que será o rei de Israel, cuja origem remonta aos dias da eternidade.”
O nascimento de Jesus teve repercussão em Belém. Os pastores de Belém foram os primeiros “evangelistas” de Jesus. Divulgaram, inicialmente, aos pais de Jesus a mensagem recebida dos anjos, o que lhes causou profunda paz, alegria interior e lágrimas de gratidão ao Senhor da Vida. Depois de reverenciarem a nobre família, possivelmente ofertando-lhes algumas ovelhas, as quais lhes asseguraram uma permanência mais duradoura e confortável em Belém, divulgaram o ocorrido a todos os habitantes da cidade, gerando admiração e interesse pela família de Nazaré, descendente da Casa de Davi. É possível que inúmeras famílias belenitas tenham visitado e acolhido a singela e nobre família nazarena.
As primeiras testemunhas humanas do nascimento de Jesus eram humildes e marginalizados por uma elite social que os considerava, erroneamente, desonestos e salteadores. Os pastores de Belém, no entanto, retornaram aos seus rebanhos, e, certamente, prepararam aquela geração para o grande advento da mensagem do Cristo. Foram os primeiros mensageiros da Boa Nova. Eram Espíritos superiores que davam sustentação vibratória, no plano terreno, para o ambiente e para o planeta, repassando para as almas tristes, enfermas e oprimidas a luz da consolação, a bênção da caridade e a força do amor que emanavam do menino Jesus, do Cristo de Deus.
Não se sabe os nomes dos anjos que integravam a grande comitiva celeste nem dos pastores que integravam a nobre comitiva terrestre, destinada a anunciar por toda parte o nascimento de Jesus. No entanto, o contraste entre magnificência, glória e anonimato, modéstia, pautam a vida dos missionários e profetas, dos santos e mártires, e de toda a vida e ensinos de Jesus. Belém significa a ‘casa do pão’, mas também de pomares, porquanto seu sobrenome Efrata, significa ‘rica em frutos’. Os frutos e o pão são os alimentos mais comuns e saudáveis para a vida orgânica, o anonimato e a humildade também são as bases sólidas da glória e das virtudes espirituais, bases estabelecidas para a consecução da confiança perante os desígnios supremos de Deus.
(Emídio Silva Falcão Brasileiro, educador, autor e jurista. Membro da Academia Espírita de Letras do Estado de Goiás, da Academia Goianiense de Letras e da Academia Aparecidense de Letras)