Nada mais prazeroso do que uma comemoração, não interessando qual seja a razão, o local ou a situação, pois tal momento pressupõe, em sua grande maioria, alegria e motivos mais que suficientes.
Sei que as linhas abaixo poderão ser entendidas por muitos como retrógadas, bem como a avaliação que faço dos minutos que presenciei e vivenciei, a partir da meia noite do dia 31 de dezembro, quando adentramos em mais um ano, denominado cronologicamente de 2018 pelo calendário Gregoriano.
Vi da janela do meu apartamento num horizonte que se perdia na noite, fogos de artifícios espocarem aos quatro cantos. Ouvi gritos de alegria e tilintar de taças nas residências mais próximas da minha.
Pela telinha constatei a aglomerações de milhões de pessoas pelos mais diversos locais do Brasil em comemorações frenéticas.
Vendo o Rio de Janeiro fiquei na dúvida se eram fogos de artifício ou tiros da Rocinha; Em São Paulo, carro chefe da economia nacional, não sabia se brindavam, na Avenida Paulista, o alarmante número de desempregados ou cada um procurava iludir a si mesmo; em Brasília, Capital de todos nós, vi pela primeira vez nos últimos meses uma aglomeração que não pedia a saída dos corruptos do poder, ou será que estariam agradecendo, em forma de festa, os dezessete reais de aumento para o salário mínimo?
E assim por diante... Em cada Capital e lugares outros mostrados, cada um com suas características regionais, comemoravam como podiam e colocavam os sonhos acima da realidade em que vivemos.
Foi, quando, então, juntamente com meu sobrinho Sormane, em reflexão conjunta, concluímos que o ano novo que se inicia, sob o colorido dos fogos de artifício, infelizmente nos mostra uma nação cada vez mais alienada em suas práticas e propósitos.
Temos as mais caras instituições do mundo, sustentadas por tributos de toda espécie, que em muito superam, em muito, a época de O Quinto, que nada mais era do que a retenção de 20% do ouro levados às casas de fundição, que pertenciam à Coroa Portuguesa. O nome do imposto (taxa cambial) ficou como “quinto” e a fundação de “Casas de Intendência” fiscalizava e controlava tudo o que saía e tudo o que entrava. Portugal, também requeria a derrama, um novo imposto cobrado para complementar os débitos que os mineradores acumulavam junto à Coroa Portuguesa.
Considerado abusivo, era uma prática opressora e injusta, quando em data específica soldados enviados pelas autoridades portuguesas prendiam quem era contra, que protestava ou se negava a “colaborar”. Sendo assim, a elite intelectual e econômica da época juntou forças para se opor a Portugal. No ano de 1789, um grupo de poetas, profissionais liberais, mineradores e fazendeiros tramavam controlar Minas Gerais e se declararam contra a coroa. Bem menos do que pagamos de impostos atualmente que segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, chega à casa dos quarenta e um por cento.
Observe-se que temos as piores universidades e um povo com pouco grau de civilidade em todos os aspectos. Contamos com os mais alienantes meios de comunicação de massa e um sem-número de questões mal concebidas, mal compreendidas e de soluções duvidosas e ineficazes, haja vista tantas que constatamos no ano que se encerrou e mais acentuadamente nos seus últimos dias.
O que esperar de um país destroçado pela quase totalidade dos governantes do passado e atuais, apoiados na leniência de alguns poderes constituídos e por um tecido social aos frangalhos?
Como construir um legado de modernidade para as próximas gerações, sendo que a atual é pouco afeita a críticas e à participação nas mudanças que o Brasil necessita?
Como reconstruir nossa história sob a égide da moralidade e ética e estabelecer novos parâmetros para definir o que é preciso fazer para crescermos como seres humanos integrados às demais nações que formam o contexto mundial?
São reflexões necessárias, em especial no início de um ano tão importante para as mudanças improrrogáveis em todas as estruturas que supostamente dominam nossa Pátria.
Como reconstruir nossa história? Temos, cada um, a responsabilidade de despertar a nação brasileira que dorme em berço esplêndido, grande parte imbuída dessa índole corrupta que nos persegue desde a chegada de D. João VI em 1808.
É urgente a necessidade de construção de um paradigma social integrador, igualitário e justo.
É importante olharmos adiante, muito além da transparência das taças de champanhe, de vinho branco, do copo de cachaça ou da turbidez da cerveja, do vinho tinto ou do uísque que levantamos para brindar a chegada do ano de 2018.
Faz-se necessário, cada vez com mais urgência, que acordemos desse pseudo sonho e enfrentemos a realidade que aí está.
Não deve ser por acaso que recente pesquisa constata que o povo brasileiro é o segundo do mundo a ignorar a realidade em que vive, ficando atrás somente dos sul-africanos.
Eis o desafio: Quem tem ouvidos que ouça, quem tem olhos que veja!
(José Cândido Póvoa, poeta, escritor e advogado. Membro fundador da Academia de Letras de Dianópolis (GO/TO), sua terra natal)