Era uma vez uma República Federativa Burocrata dos Animais Latinos do Oeste. Uma terra sem lei, apesar das inúmeras existentes, onde na selvageria lutava-se constantemente pela sobrevivência dos bichos.
Uma terra habitada por inóspitos quadrúpedes, jumentos facínoras, animais furtivos, que sempre rondavam à espreita. Não só na calada fria da noite, como as corujas, mas durante o dia perambulavam sempre na busca do locupletamento ilícito, para vencer seus ruídos famintos.
Constantemente se viam pelas lentes das câmeras dos discoverys e dos big brothers da vida, os animalescos apetites por ovos alheios, por carnes de corpos dilacerados dos mais frágeis, dos menores, dos mais velhos e dos menos ágeis.
Armadilhas eram diuturnamente feitas quando a natureza lhes oferecia um remanso de águas para lhes saciarem suas sedes. A morte, a miséria e o perigo sempre lhes rondavam com olhos voluptuosos de querências.
Antes de um barbudo leão ter a fama do rei dos animais, quem governava o mundo era uma presidANTA, que chefiava macacos e conversava aos micos o tempo todo. Rodeada por papagaios de pirata e outros sicários para posar com dentes em sorrisos pré-mordida, todos gladiavam-se entre si por microfones e holofotes, ruminando seus pastos mais verdes. Os mais belos de outrora. A grande maioria tinha territórios em nomes de outros micos-laranjas.
Ali, não se podia ir embora para Pasárgada. Pois os amigos do rei eram também investigados por crimes terríveis de corrupção nos seus ministérios. Pelas verbas indenizatórias descomunais sem necessidade. Pelo arrocho fiscal das pequenas formigas e demais insetos, que acabavam sempre pagando os patos e as galinhas. Eles eram esmagados com facilidade pela mais alta taxa de impostos e juros do mundo. Ficavam sempre no terreno de recursos minguados, abandonados como desertos arenosos, a ver as vacas todas irem para os brejos.
Quando a cúpula riquíssima resolvia perambular castelos com seus cartões corporativos, e despesas altíssimas de hospedagem internacional, os seus eleitores passavam a barro e água, capim seco e pedra, desviando das pisaduras da vida.
Aves de rapina também encontravam dificuldades pois as carnes dos seres rastejantes andavam às mínguas das ossadas. Voluptuosos ministérios e carros oficiais guardavam honrarias da prataria e do ouro oficial da dinastia populista ditatorial. Havia jornais, repórteres e outros animais comprados para estimular o “deboísmo” (só de boa!) do mundo animal.
Ali, do outro lado do planeta, onde o sol avermelhado do leste, se vai ao norte, as crises eram amenizadas em planejamento mútuo. Mas, salve lá, os herdeiros do novo mundo animal estão fugindo das guerras civis, das dentadas e explosivos de um mundo que quer ver-se reduzido a pó e poeira.
Os remansos de cá são ainda paraísos fiscais da boa lábia e jogatina. Mas bilhardários choram a gasolina, ou melhor, o leite derramado das tetas frouxas governamentais. Tem animais otimistas, e outros pássaros vermelhos engaiolados, a pão com mortadela desfilam suas sagueiras penas e rabos, para levantar cartazes com palmas correligionárias, lembrando de seus vales trigos e capins para abastecer mal uma família animalesca.
Foi um poeta pássaro Bandeira, quem disse: quando eu estiver mais triste de não ter jeito, quando de noite me der vontade de me matar, vou-me embora... Por isso são vistos animais da República Federativa Burocrata dos Animais Latinos do Oeste, vivendo e trabalhando em outras bandas do planeta. Agora comprando carrões e vivendo em casas belas com um único mês de trabalho. Aqui se gasta uma vida para obter seu quinhão de terra...
Olhando lá fora, inúmeros animais em revoada, em disparada, num estouro apressado de boiada, fugindo das agulhas dos currais... São mugidos desconexos, em alvoroço do sapo que quer entrar no violão para ir na festa do céu. Esborracho e seu coacho... Cheiros estranhos, estrume e terra, releituras bizarras da sandice desatada. Canta triste a araponga.
A corrupção no poder é um emaranhado de novelos de lã entrelaçados, sem ponta. Ninguém sabe onde começa e onde termina. Estou cansado, minha vista dói. Não suporto mais essa confusão. O animal aqui ao lado do teclado está cansado, rumina palavras e ideias em papel fino de jornal. Tira o olho de fora e olha no espelho do rio. Sobrevive as armadilhas e vê esse espelho de águas ao fundo, que revela uma das facetas do animal. Descobre-se, então, que ele – animal inóspito, cruel e dócil –, estava o tempo todo dentro de si. Não há como fugir das trilhas perigosas da vida.
O atual presidente dinossauro quer acabar com a aposentadoria, estampando uma cruel contribuição sem fim. Isso ele poderia resolver cortando gastos com os ministérios, mas não se pode cortar na carne. E ele já é aposentado... A vontade de matar? Pasárgada? Impossível fugir de si, pois aonde você for, cada um de vocês se encontrarão com os seus eus! Até a próxima página!
(Leonardo Teixeira, esritor)