O Brasil já recebeu diversos apodos, ao longo dos tempos, tais como “ o país do futuro”, “ o país do futebol” ou “ o país do carnaval”.
Estes qualificativos identificadores de atividades ou situações tradicionalmente reconhecidas foram aos poucos caindo em desuso por diversos motivos.
O país do futuro foi severamente rejeitado porque já não aguentamos mais esperar este futuro, mencionado aos nossos tetra avós...O país do futebol ficou meio inválido, depois dos famosos 7 a 1 impostos pela Alemanha ao decadente futebol brasileiro, durante a última Copa do Mundo, realizada em casa e que, segundo os dirigentes políticos do país, seria a copa das copas. E, realmente, foi: A maior humilhação do Brasil em matéria de copas, desde a de 1950, perdida para o Uruguai em pleno Maracanã.
Foi preciso muita prece a São Tite e muito esforço deste milagreiro para tirar do subsolo e ao menos trazer à superfície o nosso futebol, longe de estar nas alturas, de modo que a denominação ficou imprópria.
Aquela que tem, se mantido ao longo dos tempos com certa firmeza e permanência é a de “ país do carnaval”.
Não dá pra negar que esta festa popular tem atravessado os tempos e sempre e cada vez mais atraindo turistas internos e externos para sua comemoração.
Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia lideram, sem dúvida são os maiores chamarizes desta festa popular mundialmente conhecida.
E não dá para esconder a expressão popular, a criatividade das escolas de samba, as excepcionais fantasias, a imensa habilidade dos foliões no desfile das avenidas a singularidade dos sambas enredos, o colorido dos carros alegóricos, a inventividade das marchinhas carnavalescas, a suntuosidade dos bailes de salão.
A coisa é tão forte que até São Paulo, com toda sua sisudez de cidade mais rica, populosa e poderosa do país, cedeu aos encantos e à magia do carnaval e já faz algum tempo que a festa na capital encanta paulistanos e desperta fortes paixões entre os torcedores das diversa escolas da capital paulista.
É certo, reconheço, que o carnaval não é só alegria. É também palco de excessos, de tragédias, de inúmeras mortes registradas ou não pela mídia, de desastres, de fortes decepções familiares, quando se chega na quarta-feira de cinzas.
Mas, reconhecidamente, tal é a força do evento, que é comum se dizer que o país só se movimenta de verdade, “ depois do carnaval”...
Eis a razão do título desta crônica: Depois do carnaval...
Com ela o cronista quer reconhecer a força do carnaval, a sua representatividade no quadro dos eventos nacionais. Apenas com uma corrigenda: aqui estou me referindo não mais à festa popular tão famosa e tão esperada por muitos.
Falo de um outro carnaval, que do primeiro só herdou o sentido de irresponsabilidade, cravado na frase: “ carnaval se pode tudo”, com a qual os foliões procuram justificar seus desmandos e maluquices.
Estou falando do carnaval do carnaval de irresponsabilidades e desmandos a que está submetida a nação brasileira, sob o comando de seus governantes na última década ou pouco mais.
Foi tanta lama que diante dela, que enodoou toda a nação a tragédia de Mariana se tornou brinquedo de criança. Tão grande o roubo em nível nacional que os assaltos a bancos e a carros fortes se tornaram coisa de trombadinhas.
Desrespeito à vida, desrespeito à propriedade, desrespeito à saúde e à educação e assim de modo tão escancarado que não dá para acreditar que estamos ainda sobrevivendo a isto.
Instituições corroídas, desacreditadas.
Os três poderes do governo motivo de indignação e desconfiança do povo em geral.
Desigualdades incríveis, mantidas intactas, como se fossem tabus intocáveis.
Invenções e invencionices do governo a título de resolver os problemas mediante reformas. Reforma tributária ( que nunca sai do papel ), reforma política ( que se traduz em recortes de papel como se fossem picadinhos pra se soltar no carnaval ), reforma da previdência, que já nasceu obsoleta, pois antes de ser votada já recebeu tantas emendas que virou uma colcha de retalhos, totalmente desfigurada e irreconhecível, tal o seu grau de injustiça e de rejeição popular, reforma do governo para enxugá-lo, adequá-lo ao tamanho e às verdadeiras necessidades do país ( por que esta multidão de senadores e deputados federais e estaduais, este injustificável número de vereadores, esta sempre questionável do ponto de vista moral quantidade de penduricalhos , em sua maioria inexplicáveis e inaceitáveis, nos altos vencimentos de autoridades do judiciário e de outras instituições, burlando a regra do teto que é o ganho dos Ministros do STF? ).
É deste carnaval que falo.
É com este que o país está conhecido lá fora, de forma vergonhosa.
É deste que espero o fim, pedindo a Deus que não tarde tanto com a quarta-feira de cinzas que indique o fim de tanto desvario, tanta irresponsabilidade e nenhuma punição.
Depois o horizonte será outro.
Depois do carnaval...
(Getulio Targino Lima: Advogado, professor emérito ( UFG ), jornalista, escritor, membro da Associação Nacional de Escritores e da Academia Goiana de Letras. E-mail: gtargino@hotmail.com)