O Grande Hotel de Águas de São Pedro, no interior paulista, tem sua história relacionada com a crença no poder curativo das estações termais, durante a primeira metade do século XX. Localizadas em regiões próximas de centros urbanos desenvolvidos, hotéis aprazíveis foram edificados para receber clientes que associavam o interesse terapêutico de fontes medicinais à paixão pelo jogo, então legalmente permitido. Tempo em que, nos grandes casinos, o carteado, a roleta e o bacará faziam girar milhões em noites de luxo magnificente.
Construído em 1935/1936, o edifício principal do Grande Hotel Águas de São Pedro foi projetado em estilo art déco e guarda semelhanças com o Palácio das Esmeraldas e a Estação Ferroviária de Goiânia. Externamente, nas linhas retas, na fachada despojada, no acesso por uma pequena escadaria; internamente, no pé direito alto, nos pisos em mármore e granito, no verde dos jardins contíguos.
Belas fotografias de época – em preto e branco, ampliadas – documentam o pioneirismo do Dr. Otávio Moura Andrade, que comprou a antiga (e primitiva) fazenda ali existente e fez construir o Grande Hotel. Igualmente, planejou e fundou a cidade de Águas de São Pedro que, hoje, abriga dezenas de estabelecimentos hoteleiros e turísticos, convertendo-se no segundo município em Índice de Desenvolvimento Humano do estado de São Paulo, ou seja: IDH de primeiro mundo.
Inicialmente adquirido pelo governo paulista, o Grande Hotel Águas de São Pedro, desde o final da década de 1960 pertence ao Senac – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial, passando a funcionar como hotel-escola. Os funcionários são estagiários de diferentes cursos e dão o melhor de si; de onde a excelência do serviço, em todas as áreas.
Durante a semana em que ali estivemos, a maior parte dos hóspedes eram famílias que usufruíam os últimos dias de férias escolares: avós, pais, mães, filhos, netos e netas, sendo algumas crianças bem pequenas. Havia muita gente, mas os espaços generosos ao lado do parque aquático, quadras de tênis e atividades terapêuticas não permitiam aglomerações, nem desconforto.
Ao redor, a bela mata atlântica preservada, cortada por caminhos sombreados – como o que leva à secular figueira a cuja sombra (mais) um restaurante nos convida a degustar iguarias.
Porque aqui é o reino da gastronomia. Cada refeição tem a feição de um sofisticado banquete, o sabor rivalizando com o capricho da apresentação. São vários bufês – ou seriam ilhas? – a competirem entre si: saladas, molhos, queijos, massas, carnes de tipos e cortes diversos. Além de um balcão onde a cada dia se prepara um prato diferente, da feijoada aos risotos, aos espaguetes, aos beijus de tapioca. E as sobremesas... Oh! As sobremesas!
No café da manhã, não resisto aos waff1les e aos croissants, isso sem falar nos pães variados, mais os embutidos de toda a sorte e sabores mil. Os garçons e chefs vestem-se impecavelmente, guardam postura adequada, atendem com sorrisos e palavras gentis. De vez em quando me pergunto a mim mesma: estarei no Brasil ou em outro país?
Em um charmoso carrinho elétrico, sempre à disposição dos hóspedes, vamos visitar a Faculdade de Gastronomia que funciona anexo ao Grande Hotel. Logo na portaria, dispensam-nos tratamento vip; uma simpática funcionária é designada para nos acompanhar. Percorremos os alojamentos dos alunos, que vêm de todo o Brasil, sendo que muitos são bolsistas; quando concluem o curso, a quase totalidade já está (bem) empregada.
Há inúmeros laboratórios – vale dizer, cozinhas equipadíssimas, com bancadas de inox, fileiras de panelas e caçarolas que reluzem, gorros engomados e aventais impecáveis pendurados em cabides. Cada laboratório tem destinação específica – culminando com o de confeitaria. Ao final das aulas/sessões, cabe aos estudantes cuidar de que tudo seja limpo e deixado em ordem, a cada dia.
Explica nossa cicerone que os alunos trabalham em equipes de seis, sob a supervisão e professores, cujos curricula vitae foram examinados pelo Ministério da Educação, no processo de reconhecimento do curso, aprovado com nota máxima. E que, além de gastronomia, são também oferecidos cursos de gestão hoteleira, de eventos, de informática e outros – sempre com elevada demanda e resultados positivos.
É impressionante – no bom sentido - como todos se vestem com simplicidade, mas sempre impecáveis. Mais impressionante ainda é a biblioteca: localizada em espaço adequado e amplamente iluminado, dispõe de livros e revistas especializadas e atualizadas, com acesso fácil atendentes prestimosos. Não se vê um grão de poeira, um exemplar estragado, um móvel quebrado.
Dos mais simples aos mais graduados os funcionários cumprimentam os visitantes com gentileza – e aqui o expediente é longo, o trabalho exigente, sendo igualmente rigoroso o controle das atividades.
Profissionalismo? Disciplina? Esprit de corps? Sem dúvida. O que resulta em permanente satisfação de hóspedes e visitantes. Até porque nada há melhor do que mergulhar na piscina coberta, a 37 graus de temperatura – e nadar na água encachoeirada, sob uma belíssima cúpula de vidros translúcidos.
Recomendo. E que o exemplo frutifique, país afora.
(Lena Castello Branco, lenacaste[email protected])