A desistência oficial da votação da reforma da Previdência em 2018, pela equipe econômica do Governo Michel Temer, é uma vitória do povo, dos trabalhadores. Nem o vale tudo, com a promessa de bilhões para comprar o voto de deputados e senadores, e nem o pânico que o Governo Federal instalou no país, com propagandas sistemáticas sobre o mito do déficit da Previdência Social no país, foram capazes de garantir a aprovação do texto da proposta que representaria um grande retrocesso social para os segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Uma vitória que deve ser comemorada, mas com uma certa cautela. Isso porque a reforma da Previdência não será votada momentaneamente no Congresso Nacional por três fatores: o ano de eleição presidencial, a falta de força política para aprovação da reforma em ano eleitoral e o impedimento constitucional, por conta da intervenção federal no Rio de Janeiro, que atravessa um caos, principalmente na segurança pública. Isso indica que a votação está suspensa, mas não arquivada. Logicamente, o Governo Federal entregou os pontos e “jogou a toalha” no último round desta batalha. Mas a revanche pode ser anunciada em breve.
Assim, precisamos continuar em alerta contra os possíveis passos e ataques da equipe econômica do Governo Federal na área previdenciária.
E a vitória também teve um sabor amargo. Na caminhada pela aprovação da reforma da Previdência, a equipe de Temer conseguiu ampliar o prejuízo nos cofres da Previdência Social em várias frentes. A pior de todas foi com a corrida dos trabalhadores para se aposentar. O alarde com a possibilidade da aprovação de uma nova idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, além de 40 anos de contribuição mínima para garantir o benefício integral de aposentadoria, fez com que milhares de segurados do INSS se aposentassem de forma precipitada.
O reflexo direto desse efeito negativo teve dois lados trágicos. O primeiro é que muitos brasileiros se aposentaram com um valor de benefício inferior do que poderia conquistar se seguisse um planejamento para atingir regras mais favoráveis. A maioria das pessoas certamente não atingiram a Fórmula 85/95, que garante o benefício integral para as mulheres que somassem 85 pontos e homens que chegassem aos 95 anos, na soma da idade e do tempo de contribuição à Previdência. E, assim, tiveram seu benefício reduzido pelo fator previdenciário, que em muitos casos chega a reduzir cerca de 30% no valor da aposentadoria.
E o segundo, de acordo com dados recentes, por conta dessa corrida provocada pelo pânica da reforma, a Previdência Social teve um gasto imediato de mais R$ 1,8 bilhão com as novas aposentadorias. O crescimento em 2017 foi de 47% nos pedidos de aposentadoria, em relação aos períodos passados. Entre 2015 e 2017, as concessões passaram de 318,5 mil para 468,5 mil aposentadorias. Antes da discussão da reforma, esse crescimento era de cera de 2% ao ano.
Além disso, o Governo Federal gastou cerca de R$ 93 milhões em propagandas para tentar explicar e tentar convencer a população sobre a necessidade da reforma. Outro tiro no pé que custou muito caro. Sem contar o desgaste político, social e de imagem do presidente que peregrinou pelos principais meios de comunicação brasileiros para defender as mudanças previdenciárias, que atingiam apenas os trabalhadores e manteriam os privilégios da classe política e dos militares. Dinheiro e tempo que poderiam ser gastos em áreas bem mais necessitadas, como a saúde, a segurança e a educação.
E, apesar da vitória na questão previdenciária, não podemos esquecer o duro golpe sofrido pela população com a aprovação da reforma trabalhista, que precarizou direitos, incentivando a informalidade e a pejotização. E, assim, refletindo na queda de contribuições ao INSS.
O Palácio do Planalto sustenta o discurso de que a reforma só não será votada porque há segurança jurídica para revogar o decreto de intervenção federal no Rio de Janeiro, que impede a votação de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição). Porém, a verdade é que a força do povo garantiu com que, nem as benesses bilionárias oferecidas pelo presidente e nem o discurso vazio do suposto déficit, fossem suficientes para garantir que reforma fosse aprovada.
(João Badari, advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório AIth, Badari e Luchin Advogados)