Em exatamente um mês, o cantor Roberto Carlos vai se apresentar em Goiânia. Ele ganhou o título de rei numa república por ter carreira superior ao excelente repertório, cuidados para evitar escândalos pessoais e o afago constante aos fãs. É sua atuação fora dos palcos e dos estúdios que lhe garante o trono. Quando estiver encantando seu público no próximo 19 de maio, Roberto Carlos ao mesmo tempo agradará a pessoas carentes de alguma instituição tanto quanto agradar às carentes de sua voz. Quando vem a Goiás, o Rei aprendeu a confiar seus cachês a um filantropo, o promotor de Justiça Joel de Sant'Anna Braga. Doutor Joel, como é conhecido, se aposentou do Ministério Público, mas em sua arte é igual a Roberto Carlos na música: nunca sai de cena. A arte de Doutor Joel é a de servir ao próximo. E esse talento foi herdado pelos filhos, inclusive o mais famoso deles, Alexandre Baldy, que se tornou o Roberto Carlos das obras para as unidades da federação, o Rei das Obras para os municípios e os Estados.
Desde jovem, doutor Joel cuida de crianças e adolescentes vulneráveis às drogas e a outros indutores de violência. E nessa seara de bondade acostumou os filhos desde crianças. Então, quando o ministro Alexandre Baldy diz ao Jornal Opção que sua única expectativa para 2019 é "que tenhamos um Brasil melhor para os brasileiros, que consigamos efetivamente ter um Brasil melhor", não é uma frase de efeito lida numa obra de autoajuda, é o resumo de uma vida, uma vida marcada por servir, uma vida validada pela vocação de servir. Foi para isso que o doutor Joel criou seus meninos e os filhos honram a tradição da família.
Portanto, foi sem surpresa que nós, colegas de doutor Joel no Ministério Público e amigos da família toda, recebemos a notícia de que Baldy continuaria no Ministério das Cidades, em vez de se desincompatibilizar e ser consagrado novamente para um mandato na Câmara dos Deputados. Seria reeleito com a facilidade proporcionada pelo atendimento ininterrupto a seus eleitores. Alexandre não é de começar as coisas e deixá-las pela metade. Não aprendeu com o pai a descontinuar projetos, para usar termos do mundo corporativo, ao qual Baldy pertence e que compartilha com outros mundos, como o mundo das crianças necessitadas de proteção. Ao preferir manter o que aprendeu com doutor Joel, Baldy livrou da dificuldade muito mais que brasileirinhos em situação de rua: salvou cidades e mais cidades. Para resumir: salvou os Estados. E, em última medida, o País. Salvou-nos de 8 milhões de quilômetros quadrados de esqueletos de obras, praticamente todas herdadas de ministros anteriores.
Com este artigo, estou dando publicidade aos atos caridosos de duas pessoas bondosas que, apesar de célebres, se mantêm no anonimato quanto a suas ações em favor dos mais fracos: Roberto Carlos e Joel Braga. O dinheiro apurado com as apresentações do Rei em Goiás, durante anos, ia direto para o sustento de uma chácara e seus internos mantidos por Joel. Nos arredores de Goiânia, o imóvel abriga dezenas de crianças e jovens que ao longo das décadas a generosidade bancou. Erasmo Carlos era o parceiro nas composições de Roberto, porque o parceiro na promoção social era o promotor de Justiça pai do agora ministro das Cidades. Mas o Rei ajudava não porque o súdito integrava o Ministério Público, mas porque é íntegro até nos propósitos.
Ao ficar no Ministério das Cidades, Alexandre Baldy confrontou a máxima de que em Brasília só tem prestígio quem tem mandato. Não. Em Brasília, como em qualquer outra concentração de máquinas públicas, manda quem tem projetos; projetos com começo, meio e fim; projetos exequíveis; projetos que beneficiem gente, não as grandes corporações. Aliás, nada contra as grandes corporações que produzem mercadorias, empregos e renda, pois elas também são vítimas dos projetos governamentais deixados pela metade, são vítimas dos juros absurdamente altos cobrados pelos agiotas institucionalizados ou não, vítimas dos assaltos oficialmente batizados de tributos. Baldy tem um prestígio muito maior que o de mandatos. É respeitado pelo empreendedorismo, por ser um negociante hábil e produtivo, num mandato que tem a duração de uma existência. É na geração após geração de filantropia que Baldy se escuda para tomar decisões corajosas como a de peitar a filosofia brasiliense de que quem não tem mandato não manda em ato nenhum.
Goiás comemorou a ideia de Baldy, porque nosso Estado certamente vai continuar se beneficiando da gestão ministerial aplaudida pelo País. Lideranças de diversos Estado rogaram a Baldy que permanecesse na Pasta, mas não foi nelas que ele pensou, mas na filosofia maior que a da Capital federal, a filosofia do Doutor Joel: começou, termina. No reino das obras inacabadas, Baldy tomou o rumo contrário, o de investir nas construções que estavam esquecidas, pois na verdade quem ficava esquecida era a população que depende desses equipamentos públicos. O que o filho do Doutor Joel começa, ele termina, seja entoar um sucesso do Roberto, seja uma creche para evitar que as crianças por ela atendidas se tornem, daí a uns dias, internas em chácaras como a fundada pelo pai de Baldy e mantida por doações como as do Rei da MPB.
Serão 70 os bilhões de reais investidos por Baldy até o fim deste ano e Goiás é protagonista na divisão dos recursos. Aí se mostra o gestor, mas o filantropo brilha em um gesto monetariamente menor e humanamente sem limite: Baldy lutou até conseguir trazer para Goiás a imunização do H1N1, salvando pessoas, e não há bilhões que substituam vidas. Uma vacina vale mais que um BRT. Eis a filosofia de Doutor Joel aplicada na prática. Assim é o pai, assim é a esposa. Como gentileza atrai gentileza, Alexandre conheceu Luana e o casal se uniu nas obras sociais. Luana também tem na família exemplo de filantropia, que Marcelo Limírio não autorizaria nem a filha nem ninguém a divulgar. Foi nessa escola que Luana aprendeu a dividir com as famílias carentes sem que estas soubessem que aquela é casada com um político (até porque ele não era) e filha de um grande empresário (também pelos méritos pessoais). Ela própria é política e empresária. Política na melhor acepção do termo: a de estender a mão à polis. Empresária na mais moderna concepção do termo: a de gerar oportunidades para quem se especializa em todas as conjugações do verbo, não das verbas, trabalhar, crescer, subir.
Os empregos que Baldy e Luana criam em Goiás não cabem num show de Roberto Carlos no Maracanã, nem de Julio Iglesias numa praia do Caribe. Como a música é a minha praia, e a variedade de estilo é serventia da coleção com dezenas de milhares de discos, raramente ouço Iglesias, porém, lhe devemos uma fineza. Num tempo em que as informações circulavam na lentidão de telex, Doutor Joel ficou sabendo que Iglesias faria show em Buenos Aires. Para confirmar que Baldy herdou de alguém o faro por oportunidades de negócios, o promotor de Justiça voou para a Argentina. Foi ao hotel em que o cantor estava hospedado. Naquela época, Iglesias era para os latinos o que Anitta é atualmente para os apreciadores de funk. Imagina-se a dificuldade de conversar com um ídolo desse vulto... Quem disse que Doutor Joel desanimou? Começou, termina. Não viajaria de Goiânia até ali pra ficar num hall com a pasta cheia de fotos da chácara. Arranhou o portunhol do porteiro e das recepcionistas, explicando que era um projeto social. Algum filho de Deus prestou atenção e levou ao espanhol o pedido do brasileiro. Iglesias topou: seu próximo show no Brasil teria renda dedicada à chácara dos meninos do Doutor Joel.
E foi assim que Alexandre Baldy se doutorou em ajudar às pessoas: ajudando, indo atrás para chegar na frente. Nunca foi para aparecer: nem político a família tinha. Não se buscavam manchetes: pelo contrário, só lhes importavam que uma pessoa soubesse, a beneficiada. Nem precisavam saber quem estavam beneficiando, bastava o beneficiado saber que alguém no mundo se importa com quem precisa. É muito bom integrar uma instituição da qual saiu um Joel Braga. É excelente morar num Estado do qual Alexandre Baldy saiu para melhorar o mundo.
(Demóstenes Torres, procurador de Justiça em Goiás, foi senador de 2003 até 2012)