A Internet não deixa nada escondido, pois as redes sociais se encarregam de nos trazer, a cada minuto, as mazelas daqueles que deveriam dar o exemplo.
Recentemente, chegou a todos a notícia de que a nossa amada Câmara Federal decidiu gastar R$ 400 milhões pra construir um prédio novo (obra total estimada em R$ 1 bilhão) a partir de agosto de 2016, com gabinetes para deputados. Foi uma decisão da mesa diretora, comandada pelo decadente deputado Eduardo Cunha, que de herói virou bandido.
Ninguém ignora que no Brasil não há dinheiro para a compra de remédios, de material básico para atendimento, instalações decentes, pagamento de médicos. Ora, os deputados em Brasília já possuem dezenas de mordomias e espaços maravilhosos de trabalho, enquanto áreas essenciais da saúde pública estão sofrendo de necessidades básicas.
A população está morrendo em filas de hospitais, enquanto em Brasília se aprova uma Medida Provisória que autoriza um gasto exorbitante para construção de novos prédios, um verdadeiro “shopping center”, para acomodar mais luxuosamente os deputados - como se estes já não tivessem regalias suficientes, pagos com nosso dinheiro?
Quando dei uma espiada no meu minguado contracheque, depois de mais de trinta e cinco anos de um trabalho honesto, e aposentado a duras penas, por tempo de contribuição, com as mais absurdas exigências para tentar viver com a merreca da inatividade, confesso que me deu um terrível desalento.
É muita safadeza! É molecagem demais! Fiquei abismado, para não dizer embasbacado, em ver que ex-ministros, ex-secretários de Estado e outros ocupantes de altos cargos na política são os únicos cidadãos deste País que podem legalmente acumular recebimentos do Erário.
Molecagem é um cidadão ter que contribuir com a Previdência, ao longo de trinta e cinco anos, para ter direito a receber uma pensão-esmola, enquanto deputados necessitam somente de um ou dois mandatos, e alguns membros do Governo, conforme o caso, que, para terem o direito de cobrar pensão máxima precisam unicamente do juramento de posse.
Safadeza é comparar a pensão de um deputado com a de uma viúva ou um aposentado, sendo estranho que os deputados sejam os únicos “trabalhadores” deste país que têm isenção de imposto de renda sobre um terço de seu salário.
Molecagem é ver na Administração Pública milhares de assessores (leia-se aspones), ascensoristas, entregadores de correspondências e bate-paus de parlamentares com salários sonhados pelos mais qualificados técnicos, ganhando mais do que oficiais generais e cientistas que engrandecem o Brasil.
Safadeza é ver que de um político não se exija a mínima comprovação de capacidade para exercer o cargo (e nem estamos nos referindo à capacidade
intelectual ou cultural). E o fato de dois terços estarem respondendo a processos criminais mostra que não se exige uma folha corrida de quem, através de leis que eles mesmos fazem para cumprirmos, são regiamente remunerados pelos nossos impostos, cobrados com o rigor de verdadeira derrama.
Molecagem é constatar o valor gasto por essa tropa de safados com alimentação, veículos oficiais, motoristas, viagens (sempre em primeira classe), cartões de crédito e outras vergonhosas mordomias, “turistando” no exterior com amantes a tiracolo, travestidos em “assessores parlamentares”, às nossas custas.
Safadeza é essa mesma corja ter direito a quase cinco meses de férias por ano (quase cinquenta dias no Natal, mais de quinze na Semana Santa, mesmo que muitos se declarem não religiosos, e mais de oitenta dias no verão), tudo remunerado, com cotas de passagens aéreas e diárias astronômicas.
Molecagem é essa corja, quando acaba um mandato, manter 80% dos polpudos salários por mais um ano e meio.
Safadeza é se permitir que usem os meios de comunicação social para mentir à sociedade sobre seus feitos e seguirem assaltando os bolsos dos contribuintes e a enorme quantidade de dinheiro destinado a apoiar os partidos, situação aprovada pelos mesmos políticos que deles vivem.
E no Senado a coisa é menor apenas porque o número de senadores é pouco mais de um sexto dos deputados.
E o pior é que não se vislumbra uma solução para este nosso Brasil sem líderes, onde os pretensos “salvadores da pátria” ensaiam reações apenas até o momento em que os conchavos por baixo do pano mostram que, na verdade, nossos representantes, com microscópicas exceções, não passam de refinados vigaristas.
Vale citar Joaquim Barbosa, ao deixar o Supremo: “Somos o único caso de democracia em que condenados por corrupção legislam contra juízes que os condenaram”.Estamos redondamente perdidos!
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado. Publicado no “Diário da Manhã”, de Goiânia, em 25/11/2015 – liberatopo[email protected])