À oportunidade do Título supra, não podemos nos prescindir do valioso magistério de J. Herculano Pires (1914 – 1979), fecundo pensador, escritor primoroso e jornalista, que em seu livro, “Agonia das Religiões” , adota a mesma sistemática adotada por Allan Kardec nas obras básicas do Espiritismo, particularmente em “O Livro dos Espíritos”, inspirando-se na questão de número 27, com desdobramento noutras questões, anteriores e posteriores a esta questão. É também por essa mesma razão, e em sua homenagem, hoje na Esfera Espiritual, que conservamos o mesmo Título, acima.
De início, toca ele, no que se pode dizer de essencial no mundo do pensamento de competência da Filosofia e da Ciência – Deus, Espírito e Matéria, assunto inesgotável em planos tão destituídos ainda de vetores intelectuais, morais e espirituais qual o planeta Terra.
Vejamos, sucintamente, o que Herculano Pires tem a nos dizer:
“Para melhor entender-se a expressão Deus em espírito e matéria, que usei no capítulo anterior – e melhor entender-se também o problema da experiência de Deus no tempo – julgo necessário tratar dos princípios da cosmogonia espírita, na qual se integra a teoria da gênese e formação do espírito. O contra-senso da afirmação bíblica de que Deus criou o mundo do nada, que tanto trabalho deu aos teólogos, é explicado na revelação espírita pela teoria da Trindade Universal. Deus, o Ser Absoluto, é a fonte de toda a Criação. Existindo essa fonte solitária, é logicamente necessário admitir-se um meio em que ela existia. Esse meio, que seria o espaço vazio, foi considerado o nada. Para tratar do Absoluto num plano relativo, como o nosso, é preciso usar expressões relativas...”
2 – Em sequência, o autor demonstrando que o Espiritismo e também as ciências naturais de nossos dias, salvo exceções, admitem uma nova concepção de vida e de mundo – um novo paradigma para a Humanidade terrestre, acrescenta:
“...A concepção espírita do mundo não admite a existência do nada. O Universo é pleno – é uma plenitude – não havendo nele nenhuma possibilidade de vácuo. Essa teoria espírita da plenitude está hoje sendo confirmada pela pesquisa científica do Cosmos. As regiões siderais que poderíamos julgar vazias mostram-se como campos de força, carregadas de energias que escapam aos nossos sentidos. Esse pré-universo energético seria o que Buda definiu como o mundo sempre existente, que nunca foi criado. Pitágoras, em sua filosofia matemática, considerou Deus como o número 1 que desencadeou a década. O UM, número primeiro, existia imóvel e solitário no Inefável (naquilo que para nós seria o nada). E nesse caso o nada seria a imobilidade absoluta. Houve em certo momento cósmico, não se pode saber como nem porquê, um estremecimento do número 1, que assim produziu o 2 e a seguir os demais números até o 10. Completando-se a década, tivemos o Todo, a Criação se fizera por si mesma, o Universo surgira e com ele o tempo. É claro que não dispomos de recursos para investigar as origens primeiras, e essas teorias não passam de tentativas de explicações lógicas, destinadas a nos proporcionar uma base alegórica ou hipotética para uma possível concepção do mistério da Criação...”
3 – Alegando que as induções científicas, empíricas (a posteriori), em geral, por mais respeitáveis que sejam, não resolvem a questão da Inteligência Suprema e de sua Criação com a plenitude desejada, dando a entender que tão-somente o raciocínio dedutivo, filosófico e científico, de plena lógica e racionalidade (a priori) será o único capaz de aprofundar tais questões.
Como já assinalamos anteriormente, com provas irrefutáveis, não é apenas à Filosofia que se aplica o raciocínio dedutivo (a priori), mas também às ciências naturais, com prevalência da Física, que se aproxima, dia a dia, dos cardeais princípios cósmicos (leis universais, físicas e extrafísicas) defendidos pelo Espiritismo.
Em assim se manifestando, continua:
“...O Espiritismo sustenta a possibilidade de conhecermos a verdade a respeito, quando houvermos desenvolvido as potencialidades espirituais que nos elevarão acima da condição humana. Enquanto não chegarmos lá, essas hipóteses devem servir para mostrar-nos que dispomos de capacidade para ir além dos limites do pensamento dialético, além do conhecimento indutivo baseado no jogo dos contrastes.
Assim sendo, não podemos aceitar a alegoria bíblica da Criação ao pé da letra, como verdade revelada, nem contestá-la orgulhosamente com a arrogância do materialismo. Na posição do crente, temos a ingenuidade e na posição do materialista, temos a arrogância do homem, esse pedacinho de fermento pensante, como dizia o Lobo do Mar de Jack London. O espiritualismo simplório e o materialismo atrevido são os dois pólos da estupidez humana. O bom-senso, que é a regra de ouro do Espiritismo, nos livra da estupidez e nos oferece a possibilidade de chegarmos à sabedoria sem muito barulho e disputa inúteis...”
4 – E, referindo-se às leis naturais sobreditas, que nos regem, nos dois planos da vida, em todo o Universo, em consonância com a orientação doutrinária, que não destoa, no presente e no passado, dos filósofos e dos cientistas de nomeada, preceitua:
“...Partindo do pressuposto que o mundo deve ter uma origem e aceitando a ideia de que foi criado por Deus – pois assim o afirmam todos os Espíritos Superiores que se referem ao assunto e que revela uma sabedoria superior à nossa – o Espiritismo admite que a fonte inicial é uma inteligência cósmica. Mas porque uma inteligência e não apenas um centro de forças casualmente aglutinadas no caos primitivo? Porque o Universo se mostra organizado e inteligentemente em todas as suas dimensões, até onde podemos observá-lo. Seria ilógico, absurdo, supormos que essa inteligência da estrutura universal, que se manifesta em minúcias ainda inacessíveis à pesquisa científica, desde as partículas atômicas até aos genes biológicos e seus códigos admiráveis, seja o resultado de um simples acaso. Nenhuma cabeça bem-pensante poderia admitir isso. A teoria espírita – teoria e não hipótese, pois esta já provou a sua validade através de todas as pesquisas possíveis – pode ser resumida neste axioma doutrinário: Não há efeito inteligente sem causa inteligente, e a grandeza do efeito corresponde à grandeza da causa.
Colocando assim o problema, sua equação se torna clara. O Espiritismo a elabora em termos dialéticos: a fonte inicial, Deus, existindo num meio ao inefável, constituído de matéria dispersa no espaço, emite o seu pensamento criador que aglutina e estrutura a matéria. Temos assim a Trindade Universal que as religiões apresentam de maneira antropomórfica. Essa trindade não é formada de pessoas, mas de substâncias regidas por uma possível Inteligência, constituindo-se assim: Deus, Espírito e Matéria...”
5 – Clamando pela presença da Filosofia (ciência stricto sensu) e da Ciência (ciência lato sensu), através de seus cultores mais representativos, mundialmente, encerra sua preleção:
“... Gustave Geley, em seu livro Do Inconsciente ao Consciente, propõe-nos uma visão dialética do mundo em que as coisas se transformam em seres e estes avançam em direção à consciência. É a mesma visão da teoria dialética de Hegel. Oliver Lodge considera o homem atual como um processo em desenvolvimento. O Existencialismo, em suas várias escolas, encara o homem como um pro-jeto, um vetor que se lança na existência em busca da transcendência. Para Sartre, o homem se frustra nessa busca e se nadifica na morte, se reduz a nada. Para Heidegger, o homem se realiza no trajeto existencial e se completa na morte. Para Jaspers, o homem consegue transcender-se em dois sentidos: o horizontal, na relação social, e o vertical, na busca de Deus. Para Léon Denis, todo o processo de transformação se explica por esta frase genial: A alma dorme na pedra, sonha no vegetal, agita-se no animal e acorda no homem. Para Kardec, a transcendência humana nos leva ao plano da angelitude, pois os anjos nada mais são do que espíritos que superam as condições inferiores da humanidade...”
Nota: De meu livro, inédito: “Deduções Filosóficas e Induções Científicas da Existência de Deus”.
(Weimar Muniz de Oliveira,wei[email protected])