O poeta, a poeta. Há algumas décadas, os praticantes de poesia, mulheres e homens, acataram o conceito de Cecília Meireles que rompeu o rigor dos gêneros em “poeta, poetisa”. Ela escreveu essa pérola, que o cantor e compositor cearense Fagner vestiu de belíssima melodia: “Não sou alegre nem sou triste, sou poeta”.
De posse dessa senha, as poetisas brasileiras adotaram, em sua expressiva maioria, o masculino como comum de dois gêneros e temos “as poetas” em profusão, coma legitimidade de o termo masculino, com a terminação em “a”, permitir a posse do termo. Muitas são as poetas que preferem dizer-se poetisas, alegando sua força feminina. E as que adotam a forma que antes era restrita aos machos, alegam o mesmo direito. A poeta Leila Miccolis justifica: “Poeta. / Que em poetisa / todo mundo pisa”.
Esse preâmbulo é só para dizer que eu, poeta caldas-novense (como o adventício José Teófilo de Godoy, o saudoso Celso de Godoy, a franciscana Yashira e o premiadíssimo confrade Delernando Vieira), orgulho-me de contar que também é de Caldas Novas – nascida semanas antes do golpe que nos privou do Império – Leodegária de Jesus, a primeira mulher de Goiás a produzir poesia e publicar seus livros.
Sustentando meus argumentos nos trabalhos da professora e poetisa Darcy França Denófrio e do professor Basileu Tolero França, incomodei autoridades e acadêmicos de Caldas Novas para que nos manifestássemos com o mesmo orgulho para contar de nossa ilustre conterrânea. Assim, a presidente da Academia de Letras e Artes de Caldas Novas, a musicista Stella Fleury, e a secretária de Cultura do município, professora Gabriela Azeredo Santos, apoiaram-me e pudemos contar com a simpatia dos vereadores Léo Pereira, Geraldo Pimenta e Saulo Inácio.
Resumindo, a Câmara Municipal aprovou por unanimidade e o prefeito sancionou a Lei, que institui o Dia Municipal do Poeta em Caldas Novas – poeta para os dois gêneros – e a Comenda Leodegária de Jesus, a ser concedida por ocasião da data de 8 de agosto de cada ano, a partir deste 2018. O evento inaugural se dará, portanto, na próxima quarta-feira, 8 de agosto, às 19 horas, em sessão solene da Câmara.
A “memória curta” é algo que nos trai, sempre: não fossem os professores acima citados, Darcy e Basileu, a poeta Leodegária teria caído em esquecimento. A mídia contemporânea, despertada em 1965, quando Cora Coralina estreou com um livro de poemas, era a quarta poetisa goiana a fazê-lo. Ela foi antecedida, respectivamente, por sua amiga desde a adolescência Leodegária (com dois livros, em 1906 e 1928), a vila-boense Regina Lacera (1954) e a impecável Yeda Schmaltz (1964). Por isso enfatizo os autores que a biografaram, por suas obras de profunda pesquisa.
Dos arquivos da professora Darcy, destacam-se as cartas trocadas com Doralice, filha adotiva da nossa primeira poetisa, esclarecendo pontos que, por algum tempo, significavam dúvidas na vida de Leodegária, como um intenso e frustrado amor que motivou sua primeira obra, peça essa que recebeu críticas de vários pontos do país. Até mesmo Osório Duque Estrada expressou-se sobre Coroa de Lírios.
Nos bastidores, evoco a lembrança de quem primeiro me falou sobre a poeta: o intelectual (músico, poeta, contista e ensaísta) José Pinto Neto; a jovem poetisa e assessora parlamentar Naftaly Gomes; a bibliotecária Helena Carvalho, diretora da Biblioteca Municipal Professor Josino Bretas, ao lado dos membros da Academia local, em especial o escritor e jornalista Cristiano de Jesus.
Tanta informação – ou divagação – para tornar público esse evento, ao mesmo tempo em que provoco o público de Caldas Novas para comparecer e saber um pouco da nossa História e dos vultos que contribuem na construção da base cultural de nossa amada terrinha.
(Luiz de Aquino, jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras)