Entre os muitos problemas na área da Saúde, o Brasil tem enfrentado sucessivos casos de mortes de pacientes e denúncias sobre a atuação de falsos médicos.
As formas de exercício ilegal da profissão envolvem também médicos em situação irregular, a exemplo de estrangeiros ou brasileiros formados em medicina no exterior que exercem a profissão sem ter cumprido as exigências legais de revalidação e reconhecimento de diploma estrangeiro pelo Ministério da Educação. Outros profissionais, não-médicos, sem graduação em Medicina, que são denunciados por executar atos que são privativos dos médicos, procedimentos diagnósticos e terapêuticos restritos ao exercício da Medicina ou que atuam no campo de especialidades médicas reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina.
Há também casos de médicos devidamente registrados no Conselho Regional de Medicina (CRM) que acobertam alguma situação de exercício ilegal da medicina. Por exemplo, quando são coniventes com a atuação de falso médico, ou fornecem seus dados e/ou documentos pessoais para a atuação de um profissional irregular.
Quanto ao modus operandi, muitos dos falsos médicos “clonam” os dados pessoais, utilizam nome e número de CRM e até falsificam documentos de médicos legalmente registrados no CRM e se fazem passar pelo médico verdadeiro. Alguns chegam a ser contratados por serviços de saúde e por outros empregadores. Há aqueles que atuam em "consultórios" particulares ou na venda de atestados médicos (para justificar dispensa em trabalho) e na venda de receitas médicas (geralmente de medicamentos de uso controlado).
Os pacientes correm sérios riscos ao serem atendidos pelos não médicos. Um exemplo: um falso oftalmologista que, em verdade, é um optometrista (profissional responsável pela realização de medições de amplitude visual) poderia, por desconhecimento, não diagnosticar determinadas doenças dos pacientes, agravando-as.
Um caso que chamou atenção da mídia recentemente envolveu uma mulher que faleceu após um procedimento estético em um apartamento de alto padrão no Rio de Janeiro, conhecido como o caso do Dr. Bumbum. Este foi o estopim para acender a discussão sobre os riscos que os pacientes brasileiros correm com a atuação “pirata” de alguns profissionais. O profissional em questão era médico, mas apresentava irregularidade em sua inscrição perante o CRM, além de ter assumido risco desnecessário ao realizar procedimento invasivo em local não habilitado, quer seja, seu próprio apartamento.
Tem-se conhecimento de algumas universidades que falsificam diplomas de Medicina, colocando em risco a população de países como Brasil e Argentina. Falsos diplomas, por exemplo, expedidos na Bolívia têm facilitado golpes. Há promessa de funcionários de certas instituições para estudantes que não querem terminar o curso e vêem facilidades na obtenção do título de médico. Muitos conseguem inclusive a aprovação no Revalida do CRM e trabalham no sistema público de saúde.
Vale frisar que a pessoa que exerce a Medicina sem estar qualificado e autorizado para a profissão poderá responder criminalmente e civilmente pelos atos ilegais cometidos. Pelo atual Código Penal brasileiro, é crime o exercício ilegal da medicina, previsto no artigo 282 e a pena é de seis meses a dois anos de detenção.
Ademais, esses profissionais que causarem danos poderão responder por homicídio e lesão corporal. Será que o crime realmente compensa?
(Sandra Franco, consultora jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde, presidente da Comissão de Direito da Saúde e Responsabilidade Médico-Hospitalar da OAB de São José dos Campos (SP), presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde, membro do Comitê de Ética da Unesp para pesquisa em seres humanos e doutoranda em Saúde Pública)