As palavras de um artigo pertencem metade a quem as escreve e metade a quem as lê. Prossiga quem quiser dividir tesouros que chegam de graça, como acontece em artigos escritos neste jornal.
Agora mesmo, temos o exemplo de um tempo que nos inspira a escrever quanto mais dele não conseguimos apreender. Seus significados escorrem-nos fugindo de mãos e palavras vãs.
São momentos de mudanças rápidas querendo-se radicais, ao mesmo tempo que momentos de esfinges. Daqueles em que esperando o imprevisível o imponderável é que pode vir acontecer, como lembrou certa vez o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Por isso torna-se ainda mais imperiosa a leitura, buscar dividir tesouros que possam ser encontrados. E como trazer ao leitor algo que valha a partilha? Simples. Nos abstraindo, distanciando do tamanho das letras escritas na poeira para que assim possamos ser os primeiros a conseguir lê-las.
A estrada que devemos percorrer não é a mesma se caminhamos por ela ou a sobrevoamos. O passageiro de um voo vê apenas como a estrada abre caminho pela paisagem e rasga o horizonte apontando lá na frente, muitas vezes numa direção ainda sem chegada à vista – ou mesmo com a ponte caída. Este passageiro saberá dizer o rumo, mas não o que acontece lá embaixo.
Já aquele que percorre a estrada a pé se dá conta dos efeitos que ela produz ao virar de um lado para o ouro, subir e descer, ofertando movimentos que aos olhos de quem a sobrevoa não passam de um terreno indiferenciado, induzindo a muitos erros de observação -e dedução.
Seja por terra ou pelo ar, a alma da estrada de um tempo como o nosso não pertence aos viajantes comuns. Seu eu profundo – sim, estradas são feitas de vida – está aberto somente a ela mesma, que segue talhada na caminhada interior, abrindo-se e fechando atrás de si mesma. Ninguém a tem sob seu comando. Seu enigma permanece.
“Instituições são como autoestradas, resumiu semana passada o ministro do STF, Luís Roberto Barroso; se fotografamos apenas o acidente de percurso, teremos uma imagem distorcida”. Pois mais distorcida ainda será se a retemos sem acidentes.
Frente às estradas os homens se dividem em ao menos duas espécimes. Poucos alçam o sobrevoo ainda que por alguns segundos e conseguem ver ao longe. Menos ainda são aqueles que, vendo ao longe, não perdem a dimensão palmilhada que lhes permite a exata sensação da caminhada.
Por mais compridas, as estradas cedem aos anjos, aqueles que são sábios sem exigir qualquer distinção, pois do contrário lhe cairiam as asas. Ah, como precisamos deles agora. São os verdadeiros eleitos. Pena que não sejam nenhum destes políticos que estão aí nos apontando rumos interesseiros aos seus mundos particulares. É gente como Batista Custódio, de quem mais que nunca precisamos de seus artigos. Ele sabe que o jornalista professado na experiência e na fé, talhado pelas cicatrizes de quem nunca se calou, tem a responsabilidade de se manifestar em momentos assim. O leitor quer avidamente a sua parte.
(Px Silveira, Instituto ArteCidadania, presidente)