Dia 17, quarta-feira. Saímos de Corrente às 7:30h. Boa parte da estrada está péssima; e outras, razoáveis.
- Passamos por Gilbués, que, nos anos quarenta, foi a Meca dos diamantes e de cristal. Fazemos uma pausa na Fazenda “Paus”, onde tomamos água e refrigerante.
A seguir, “Redenção”. Deixâmo-la à direita.
Depois, “Barra Verde, prenúncio de cidade.
Logo adiante, divisamos minha cidade natal, - Bom Jesus. São 12:30h.
Almoçamos no “Sabor da Terra”, restaurante de uma morena simpática, Nizete.
E seguimos viagem.
Chegamos a Cristino Castro, antiga Nova Lapa, às 15h.
A ‘Ponte dos Sonhos’, de vergalhões de metal, a 5-Km de Cristino Castro, onde abastecemos os veículos, - o meu e o do Walter, ambos a meu serviço, e de minha propriedade. . Chegamos a Palmeira do Piauí às 16h. Na praça, encontramos Valdeci e Olga, sua esposa, ambos meus primos, marido e mulher. Ele, filho de Tio Chicozinho, irmão de Mamãe. Ela, filha de Tio Alfredo
- Logo após, vamos visitar o túmulo de Mamãe, no Cemitério da Família, pouco adiante de Palmeira. Fica num terreno semi-baldio, com alguns túmulos sob um loureiro, um jatobá, um jacarandá, um pau-d’óleo. Afixo a placa que trouxe, fundida em alumínio, com os seguintes dizeres:
“Á mais pura, mais santa, mais amorosa das mães, Luzia Borges Leal, - dos filhos diletos Licínio, Celso, Ozires, Raimunda (Didi), Maria Lêda, Maria de Lourdes, Raimundo, Evegista (Vivi). Palmeira do Piauí, julho de 1996”. Faço uma prece silenciosa. E, após, um Pai Nosso, uma Ave Maria, e uma Salve Raínha, de mãos dadas com todos os parentes presentes. Depois que todos se retiram, ajoelho-me e agradeço a minha mãe pelo que sou; peço a Deus que a conserve no seu seio generoso.
- Com a visita de agora, realizo um sonho de 51 anos: Minha mãe faleceu em 1945. E eu não pude comparecer a seu velório, nem assistir a seu sepultamento. Ninguém teve a iniciativa de me levar a ela para o último adeus. E só hoje pude cumprir com este sagrado dever filial. Por tudo isso, é o dia mais importante de minha vida. Combino com o Valdeci a roçagem, a carpina e a cerca no Cemitério de Mamãe. E recomendo que esteja tudo concluído, todo o serviço, até a próxima semana. E lhe dou autonomia para estabelecer preço. Quando vier receber o serviço, acerto tudo
- Visitamos Tio Chicozinho, irmão de Mamãe, que, a 14 do mês corrente, completou 94 anos.
O senhor está bem novo! - Digo-lhe, com firmeza. Ao que ele retruca, com tranqüilidade: O corpo está vivo, mas o corpo está morto, - responde o tio nonagenário. Dou-lhe uma camisa de presente, pelo aniversário que, hoje, celebramos.
Visitamos o túmulo de Tia Judite, esposa de Tio Chicozinho, em frente a sua fazenda.
Tomamos um cafezinho, e nos despedimos. Tio Chicozinho é irmão de Mamãe. Deixamos Valdeci e Olga em Palmeira, e retornamos a Bom Jesus, aonde chegamos às 19:45h. Tomamos banho, e vamos jantar no “Sabor da Terra”. Vemos o capítulo de “O Rei do Gado”, e o “Você Decide”, dedicado ao caso “PCFarias, - a tragédia de Guaxuma. Pelo crime passional, 30 mil telefonemas; pela ‘queima de arquivo’: 330 mil.
Dia 18, quinta-feira. Tomamos café às 8-h. Após, começo a fazer os telefonemas. Falo com a Zilda, minha amiga de infância. Também falo com a Nailda, irmã mais nova de Madrinha Anita, minha ex-professora do Primário.
- Ao meio-dia, vamos almoçar no restaurante “Sabor da Terra”.
Às 14:30h, começamos as visitas: Almerinda, Zilda, Prof ª Marimília e Nailda.
Levo, para cada uma delas, uma lembrança de bom gosto: uma bandeja de metal prateado.
Impressões: a – Zilda – Está irreconhecível. Do primitivos traços de beleza, só remanescem os olhos, sempre belos e vivos. Ela é a bondade transbordante de sempre. Envelheceu muito, a pele toda enrugada, braços, colo, e rosto. Quando lhe telefonei, ela me disse: - Graças a Deus, vou abraçá-lo, de novo. E era sincera. Dela disse, certa feita, o Padre Solon, ex-Vigário da Paróquia:
- Se alguém merece ir para o Céu, essa pessoa é a Zilda!
Padre Solon foi Vigário da Paróquia de Bom Jesus durante vários anos.
Após visitá-los, ela nos acompanha às casas da Prof ª Maria Emília e de Nailda
Prof ª Maria Emília - Engordou um pouco, mantendo, porém, a elegância de sempre. Cortou o cabelo, que, antes, caíam-lhe nos ombros, e, hoje, não lhe chegam à nuca. Todavia, não perdeu o porte de soberana. Aqui, reinava, altiva, do alto de mulher rica, esposa do único médico da cidade, e, ainda, Diretora do Grupo Escolar Franklin Dória. Sempre teve para comigo especial carinho: Me convidava para almoçar em sua residência, aos domingos, e para passar férias na Fazenda do “Pinga”, de sua propriedade, à margem do Riacho do “Pinga”, deferência concedida unicamente a mim, seu afilhado de fogueira.
Hoje, viúva, mora com a cunhada Nonata,mas não esqueceu o falecido marido, Dr.Raimundo, o único médico da cidade, - médico da Saúde Pública, de grande prestígio da cidade e de toda a Região.
Nailda – Era a mais faceira das três filhas do velho Nezinho, que nós chamávamos de ‘padrinho’ Nezinho. Era viúvo, mas nunca mais se casou. Nailda estudou em Teresina, onde fez o Curso Normal, instrumento para o ‘magistério’. Tinha um ‘quê’ de ironia no seu semblante, na sua voz, no seu porte de mulher bonita, no seu sorriso. Casou-se com o Zé Vitor, filho do velho Tintin (ou Zevitor). Hoje, caiu em depressão, com a morte do Valdo, o filho amado, Engenheiro que perdeu a vida num acidente de automóvel.
À noite, visita de Joaquim Borges, filho de Tio Miguel. Funcionário aposentado do Fisco, é hoje fazendeiro. A esposa foi a Teresina, deve chegar ainda hoje. Demorou-se menos de meia hora.
Dia 19, sexta-feira. Vamos, cedo, à Fazenda de Francisca Maria, para um almoço que dura quase todo o dia. Antônio José comparece ao hotel, e vai conosco. Francisca Maria vem, com Madrinha Anita, ao hotel, lá pelas 10h, e vai à frente. Na fazenda, presenteio Francisca Maria com uma bandeja de prata, igual à que presenteei a Zilda e a Prof ª Maria Emília. E a Madrinha Anita com um terço que Gracinha trouxe do Vaticano, - um terço perfumado. Na fazenda que Cantídio deixou para Francisca Maria, saboreamos delicioso churrasco, desde que chegamos, sob as imensas frondosas mangueiras. E lá para uma da tarde, almoço: Maionese, strogonoff, arroz, regado a cajuína, arrematado com um cafezinho. E, uma hora após, a sobremesa: Delicioso pudim, fan de maracujá e um arremedo de siricaia. A Prof ª Maria Emília e Nonata, sua cunhada, comparecem para o lauto almoço, um autêntico banquete. Várias pessoas comparecem ao almoço: A filha do Ponunça, irmã do Dalton, esposo de Francisca Maria; professoras, e alunas. A fazenda fica a dois ou três quilômetros do Centro da cidade. Tem mangueiras, cajueiros e coqueiros da Bahia, em profusão. A casa-sede tem a parte velha construída por Cantídio dos Santos, marido de Zilda; e a parte nova, construída por Dalton, marido de Francisca Maria.
- Às 17h, repouso um pouco, e me levanto às l8h, chamado por Abadia: Almerinda e Bibi vieram visitar-nos. Ela é filha de Tio Chicozinho. É fazendeiro próspero da região.
- Walter contrata, a meu pedido, uma camioneta para irmos, amanhã cedo, ao ‘Pará’, local onde nasci: Noventa Reais por dia. E compra um medicamento anti-térmico para Renatinha, a minha ‘Princesinha’, que está febril: ‘Tilenol’.
- O noticiário da TV, há dias, sobretudo hoje, está voltado para a abertura dos ‘Jogos Olímpicos’, de Atlanta. Às 21:30h, transmissão da festa apoteótica. A maior Olimpíada de todos os tempos. Por isso, e porque elas tiveram início na Grécia Antiga, a representante da Grécia encabeça o cortejo da Volta Olímpica, no Estádio, seguida dos representantes dos demais países em que, a partir de há um século, realizaram-se,a cada quatro anos, as Olimpíadas da Era Moderna, por iniciativa do genial Barão de Cobertein. A Olimpíada do Ano 2000 será na Austrália, que já a realizou uma vez. O Rio de Janeiro é candidato à Olimpíada do ano 2004, a primeira Olimpíada do Século XXI.
Licínio Júnior e Renatinha deitam-se cedo: Renatinha, por estar gripadinha; Júnior, para se levantar com vigor, amanhã, para a viagem de retorno, a Goiânia
Dia 20, sábado – Licínio Júnior, Grace e Renatinha viajam, de volta, a Goiânia, com recomendação de almoçarem no hotel de Corrente, e de pernoitarem no “Solar das Mangueiras, irão dormir em Goiânia (GO).
- Vamos às minhas raízes. Abadia, Eu e Walter alugamos uma camioneta. Ela leva o Sobrinho Laércio. E lhe passa o volante, no decurso da viagem, a pretexto com dor de barriga.
Currais – Hoje, cidade, vai eleger, a 3 de outubro, o primeiro Prefeito. É uma currutela inexpressiva, em torno de uma igrejinha bem singela. O clima, aqui, é muito bom, mais frio ou menos quente que o de Bom Jesus. Aqui, vim, algumas vezes, em romaria. E, também, à Stª Cruz, pertinho daqui, ora saindo de Bom Jesus, ora das Marimbas, antiga morada de Papai. O Projeto franco-brasileiro do Xuxa, grande fazenda agropastoril.
- Marimbas - Localidade onde morei boa parte de minha infância. Visitei o brejo, - o riacho e as ‘levadas’(canais de irrigação): O engenho de rapadura, e a oficina de farinha e tapioca (o polvilho). Papai vendeu o sítio a Tio Vicente, pai de Ivanilde, ampliando sua propriedade, era nosso vizinho. Visito o umbuzeiro, onde, na infância, tantas vezes trepei nas suas galhas. Deixo, hoje, meu nome no seu lenho, gravado a canivete. Da propriedade antiga de Papai, nada mais existe, a não ser o pequizeiro no oitão da casa-sede. A casa que foi de Tio Vicente pertence, hoje, ao Ivo, filho do casal Ivo Tia Laudelina, que, hoje, mora em Teresina, capital do Estado.
- Tucunzal - Visitamos Luísa, filha de Tia Sinhá, irmã de meu avô Francisco) e Tio Vitorino. Ela me abraça, com intensa emoção, levando Abadia às lágrimas.
- Boa Vista - Aqui, eu nasci, mas logo me mudei para ---‘Marimbas’, hoje, a propriedade pertence ao Alexandre Brito, pai de Haydé, esposa de Ivaldo, onde tomamos café, e provamos o requeijão da terra. A casa que Papai construiu, em 1932, - não mais existe. Em seu lugar, foi construída outra de mau gosto, igualmente de adobe. A casa onde nasci tinha varanda, sala de jantar, â esquerda os quartos de dormir; e à direita a cozinha e a despensa. De um lado, no quintal, um verdejante e florido bogari, e um jasmin latada, onde mamãe enterrou meu umbigo. E mais ao lado, o curral, à beira da estrada. Visitei, também, a propriedade que pertenceu a Tio Satiro, irmão de Papai, e que pertence ao Alexandre Brito, hoje esclerosado. Fui ao riacho de ambas as propriedades, de minha intimidade na infância. As ‘levadas’ e as cacimbas aí estão, de pé. Na propriedade que foi de Tio Satiro, os abacateiros à margem do riacho, que já existiam na minha época. E, também, o engenho de rapadura, e a oficina de torrar farinha de mandioca. E polvilho. Djalma, filho de Alexandre, gentil, me oferece três rapaduras e, também, três rapaduras ao Walter, meu motorista. A segunda esposa do Alexandre, bem conservada, nos oferece bananas maçãs e banana prata. Entre ambas as propriedades, tive a primeira manifestação de para-normalidade: Pedras jogadas na casa de um agregado de Papai.
- Subimos na direção norte, e vamos aos “Cocos”, onde morou meu avô Francisco Barbosa, e onde morei, nos primeiros anos de vida, disputado pelos avós e pelas tias do lado paterno.
Logo acima da propriedade do meu avô paterno, a casa de Tia Sinhá e Tio Vitorino. Aí, visitamos as primas de Papai: Noêmia, e Mariaeta. Elas estão de luto, vestindo roupa toda preta e Noêmia, hoje de cabeça branca, dentro do mais elevado padrão moral da região. Servem-nos café com bolachas. A propriedade de “Cocos” deve seu nome à floresta de Coqueiros ‘babaçu’, - uma peculiaridade da localidade, eis que a dominante, aqui, é a mata de buritizais que dominam os brejos, acompanhando os contrafortes montanhosos que se levantam, belos e soberanos, em toda a região, continuando a cordilheira que vem da Bahia, em Barreiras, e se projeta até o meio-norte, ou centro-norte: Canto do Buriti, e São João do Piauí. Agora, que retorno, 45 anos depois, me pergunto porque não me recordava dessas belíssimas montanhas ocres.
- Na volta, visitamos Teodora, viúva de Tio Cinobilino, mãe de Nonata, que visitamos na subida. Ela ainda mora na Boa Vista. Recebe-nos com toda a amabilidade. Magra e ágil, desloca-se com desembaraço, apesar de seus 85 anos. Ela era empregada doméstica de Vovô Aurealiano, pai de meu avô Francisco, avô de Papai. Tio Cinobilino ‘tirou-a’ de casa, e passou a morar com ela, causando enorme desgosto a meu bisavô. Seu marido era Tio de Papai. Ela nos serve doce de leite feito por ela mesma, corado e talhado, bem diferente do de Goiás e Minas. Como dizemos que é o doce de preferência do Licínio Júnior, Teodora prepara uma lata para ele, com a máxima espontaneidade. Ainda na ‘Boa Vista’, visitamos o Beltro, acompanhados de Nonata e Bráulio, o esposo falante. Beltro é filho do finado João Barbosa, irmão de meu avô Francisco, pai de Papai. Núbia, a filha que está noiva e mora em Teresina, me serve vinho com gelo. E de lá, retornamos a Bom-Jesus. Nas Marimbas, Bela Vista, Ivaldo, Haydée saíram, a pretexto de dar um telefonema num posto telefônico próximo. Chegamos, de volta, a Bom Jesus, às 19:30h. Das 8h às 9h, vemos a novela “O Rei do Gado”, e, após, vamos jantar no restaurante “Sabor da Terra”, da Nizete: Frango, carne de sol, arroz, macarrão regados a cerveja, refrigerante e água de coco da praia. Salvador junta-se a nós (filho de Zilda), e toma conosco uma ‘coca-cola’. A seguir, voltamos ao hotel, a tempo de ver o excelente desempenho do vôlei feminino: 3x0, contra o Peru. O Brasil estreou bem nas ‘Olimpíadas’: Gustavo Borges ganhou a Medalha de Prata de Natação, e vai competir em mais 4 Modalidades: e o basquete masculino ganhou de 101 a 98 contra Porto Rico. Abadia fala com Renatinha, em Barreiras BA. Ainda estamos repousando, e ainda não jantamos. O importante é que está tudo bem. E fizemos uma boa viagem, nesta primeira etapa. E se Deus quiser, hão de fazê-lo, amanhã, na etapa Barreiras-BA Goiânia-GO.
(Licínio Barbosa, advogado criminalista, professor emérito da UFG, professor titular da PUC-Goiás, membro titular do IAB-Instituto dos Advogados Brasileiros-Rio/RJ, e do IHGG-Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, membro efetivo da Academia Goiana de Letras, Cadeira 35 – E-mail liciniobarbo[email protected])