Todos conhecem o poder negativo que as Fake News alcançam e o potencial transtornante que veiculam, mas poucos discutem o mecanismo de retroalimentação destas. Como diz uma máxima: só existe fofoqueiro porque outros lhe emprestam os ouvidos. No caso do fenômeno das Fake News não há muita diferença, até porque, quase todas as notícias falsas são fofocas com uma dose extra de intencionalidade, egoísmo e maldade.
Mas no caso das Fake News, aqueles que emprestam os ouvidos, as pontas dos dedos que manuseiam a tela do smartphone ou fazem o mouse caminhar, que emprestam os olhos que leem e os mesmos dedos que compartilham ou a boca que dissemina as inverdades, são, quando inocentes e preguiçosos – o que é a melhor das hipóteses – denominados de “Fake Readers”.
Estes Fake Readers são os extremamente crédulos, aqueles que tendem a acreditar em tudo que leem. Esse tipo de leitor, o mais presente no Brasil, é preguiçoso e displicente. É um péssimo leitor, até porque não pode ser, no sentido pleno da palavra, chamado de leitor. É sem dúvida um falso leitor, pois não suporta ler mais do que aquilo que se apresenta em uma tela de celular. Esse leitor preguiçoso e displicente não se mostra incomodado pela “novidade” que acaba de ler. Dele não se espera uma simples pesquisa no Google para, minimamente, averiguar se existe alguém denunciando a suposta novidade, como caluniosa ou mentirosa.
Mas existe um outro aspecto que também retroalimenta esse processo produtivo de Fake News e, explica a miríade de Fake Readers existente em nosso país, refiro-me à devoção que se impõe à razão. Os Fake Readers acreditam em qualquer Fake News que esculacha seus desafetos, sejam pessoas ou ideias. E o mecanismo é muito simples de se entender: não há a utilização da razão, da sinceridade e da crítica no consumo das notícias, mas há, isso sim, em nome da devoção a uma ideologia ou sumidade, um consumo bovino das informações. Tudo o que é colocado no cocho – pela lógica do algoritmo do Facebook ou de qualquer outra bolha social – é engolido e aceito como verdade. Uma verdade que ao paladar do falso leitor é considerada boa, porque não traz confronto ou desconforto.
Assim, para se combater as avalanches diárias de Fake News, muito mais que um esforço de inteligência policial, é preciso uma mudança cultural. O problema, portanto, é muito mais sério do que muitos pensavam. E a mudança cultural que se evoca aqui não é a erudição das massas – embora esta seja uma mudança maravilhosa – mas apenas um pouco de ceticismo filosófico sincero e responsável. Aceitar, com sinceridade, que evidências devem alicerçar as afirmações que são apresentadas, já seria, por si só, revolucionário.
Mas assumir um pouco de ceticismo é ter de sair da bolha e isso é, para muitos, um esforço - por mais benéfico que possa ser – evitável. Para a maioria dos usuários de redes sociais no Brasil, no que tange o lidar com as informações que lhes aparecem todos os dias, vale o artifício pragmático do Carteiro Jaiminho que sempre “buscava evitar a fadiga”. Assim fazem os Fake Readers brasileiros, acreditam em todas as notícias que apoiam suas crenças e jamais ousam pesquisar sua veracidade, afinal, sentem-se confortáveis com as notícias que confirmam seus pontos de vista e, lógico, querem evitar a fadiga de terem que readequar suas opiniões.
(Márcio Greik Viana, professor, psicanalista e jornalista. e-mail: professor[email protected])