O atentado a arma branca – coisa aparentemente inusitada – contra o presidenciável Jair Bolsonaro suscitou muita polêmica por diversas razões.
Primeiro, o achado de um cartão da Caixa Econômica Federal de uma conta com 350 mil reais na pousada onde se hospedara o quase assassino, Adélio Bispo de Oliveira, resultante de um depósito, que soou estranho para um desempregado.
Não obstante desempregado, Adélio tinha toda uma estrutura logística e financeira a sua disposição, com quatro celulares e um “notebook” impensável para um desempregado. O desempregado já estivera nos estados de São Paulo e do Rio de Janeir,o onde Bolsonaro fazia campanha, tudo pago por alguém, que a polícia não quer ou não pode declinar, o que indica que tem peixe graúdo por trás disso.
A Globo está tratando o caso como “lobo solitário” (um caso isolado, praticado por uma só pessoa por motivação pessoal própria), e o ministro da defesa, Raul Jungmann, parece que corroborou a tese global, conduzindo o caso para outra linha de investigação. O império dos Marinho (leia-se Rede Globo) deve R$ 358 milhões só de impostos, que Bolsonaro ameaça cobrar, além de cortar grande parte da publicidade governamental da empresa, o que iria “quebrar as pernas” da economia da Globo.
Não é só a esquerda que tem interesse no fim de Bolsonaro, pois gente de direita e centro-direita é quem mais se vê encalacrada no cipoal da Lava Jato e outras operações da Polícia Federal. E com a ameaça de Bolsonaro de passar um “pente fino” na pilantragem dos três Poderes torna periclitante sua situação de segurança.
Que existem mandantes, não há dúvida, e estes parece que contavam com a morte do agressor pelos seguranças de Bolsonaro, sepultando qualquer tentativa de solução do caso, pois foi adrede escolhida uma pessoa sem relações de parentesco ou amizade, sem emprego e sem qualquer possibilidade de se chegar ao mandante. E as autoridades só não chegarão se não quiserem, mas há que se levar em conta o interesse da esquerda, da direita e de todos aqueles ameaçados pelas promessas de Bolsonaro e de seu vice, general Mourão, de verem o Brasil passado a limpo.
O fato de a defesa de um desempregado estar a cargo de um renomado escritório advocatício de Minas, que mandou dois advogados em um avião particular às pressas de Belo Horizonte rumo a Juiz de Fora, na Zona da Mata, para participar da defesa de Adélio Bispo de Oliveira, soa estranho.
Agora, um fato novo aparece.
No dia 14 subsequente, uma semana após o atentado, foi protocolizada na Procuradoria Geral da República uma notícia-crime, que, em resumo, inclui como coparticipantes do atentado justamente os advogados Zanone Manuel de Oliveira Júnior, Fernando Costa Oliveira Magalhães, Marcelo Manoel da Costa, e Pedro Augusto de Lima Felipe e Possas, todos com endereço profissional no Escritório de Advocacia Nascimento, Discacciati, Costa & Mouteira, Advogados Associados (que patrocina a defesa de Adélio), pelos crimes de organização criminosa e de terrorismo. Alega a representação que na manhã seguinte ao atentado, o advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, deslocou-se em aeronave particular de Belo Horizonte para Juiz de Fora, onde se encontrou com os demais representados, para acompanharem o agressor na audiência de custódia, realizada perante a 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária daquela cidade.
Prossegue a peça de representação, informando que durante a audiência de custódia, o acusado manifestou-se de forma lúcida e coerente, demostrando frieza e plena consciência da gravidade do delito praticado, bem como de suas consequências, deixando clara a inequívoca motivação política e ideológica do crime, descrevendo o encadeamento dos fatos que resultaram em sua ação, deixando vislumbrar com certeza razoável, a possibilidade real da existência de outras pessoas no planejamento, financiamento e execução do atentado, em inequívoca associação criminosa para a prática de um ato terrorista de natureza política, e que tinha como objetivo assassinar o candidato a Presidente da República Jair Messias Bolsonaro, muito embora tal possibilidade venha sendo negada pelo acusado.
A conduta, atuação, comportamento, declarações e contradições dos advogados frente ao episódio levantam suspeitas plausíveis de que esses estejam atuando no caso não apenas na condição de advogados do autor do delito, ação plenamente amparada pelo ordenamento jurídico e constitucional, mas escudadas por uma organização criminosa responsável pela prática de um atentado de natureza política.
Dentro dessa perspectiva, à luz do comportamento dos representados, existe a possibilidade concreta de que os mesmos tenham praticado, ou estejam praticando, em tese, os delitos de organização criminosa e crimes contra a segurança nacional; em resumo, estariam enquadrados no crime de terrorismo (artigos 2°, inc. V; 3°, ”caput”; e 6°, parágrafo único, da Lei n° 13.260/16), hipótese menos gravosa, mas igualmente passível de persecução penal, capitulados nos artigos 1°, incisos I, II, III e V; e 2°, incisos I e II, da Lei n° 8.137/90, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e relações de consumo.
Dentre os elementos de suspeita estaria a estranha relação que foi estabelecida entre os representados, na condição de advogados; o autor do delito, homem alegadamente desempregado, aparentemente sem recursos financeiros para custear os honorários advocatícios de profissionais ligados a uma das mais conceituadas, e caras, bancas de advocacia do estado de Minas Gerais; e um pretenso “filantropo” que, em menos de 24 horas, se dispôs a custear a defesa do autor de um crime que causou grande comoção nacional, colocando a sua disposição uma cara equipe de advogados de renomada atuação e reconhecida capacidade profissional.
Ocorre que os representados, quando questionados sobre a origem dos recursos recebidos a título de honorários, apresentaram versões contraditórias, e que não apenas deixam de colaborar com a elucidação das dúvidas que pairam sobre seu real papel no episódio, mas acabam por embaraçar a própria investigação policial em andamento, voltada não apenas para a conduta do executor do crime, mas que também busca apurar a existência de uma estrutura organizada criada dar suporte ao cometimento do delito.
Dentre as versões oferecidas pelos advogados sobre a origem dos recursos destinados ao pagamento de seus honorários, inicialmente foi referida que o contratante e financiador da assistência jurídica seria a “Igreja Testemunhas de Jeová”, na cidade de Montes Claros/MG, o que foi prontamente repelido pela entidade citada, em nota oficial. Em um segundo momento, sobreveio a versão de que os honorários e custas estariam sendo pagos pelo membro de uma instituição religiosa, que pediu para não ser identificado e, ao final, foi oferecida ainda outra versão, de que a assistência jurídica estava sendo realizada “pro bono”, em condições vedadas pelo próprio Estatuto da OAB e Código de Ética da Advocacia.
É por demais obscura a forma de participação dos advogados na defesa do autor de um atentado terrorista, pessoa carente de recursos, mas que teve apreendido consigo quatro celulares e um computador portátil, e que vinha circulando entre cidades, sem ocupação fixa, sustentando-se com recursos cuja origem ainda permanece desconhecida; o fato tem o condão de levantar contra os mesmos fundadas suspeitas de que tenha havido a transposição de limites que devem balizar a relação advogado-cliente, principalmente pela existência de um terceiro elemento, o financiador, cuja identidade os representados insistem em manter sob sigilo.
Sustenta a notícia-crime que o alegado direito ao sigilo, inclusive, nesse caso, não encontra qualquer amparo legal, uma vez que não se refere à relação advogado-cliente, mas a um terceiro alheio a esta, que uma vez dispondo--se a custear o pagamento da defesa do acusado, não pode exigir qualquer garantia de anonimato em relação à sua pessoa.
Além disso, se alguma dúvida pairasse em relação à impossibilidade de se opor sigilo a terceiro alheio à relação advogado-cliente, ela seria fulminada pela obrigatoriedade de os advogados declararem a origem e valor dos recursos recebidos a título de honorários, mesmo que tenham ocorrido em espécie, como os próprios alegam, para fins de recolhimentos de impostos, notadamente o imposto de renda, sob pena de estarem praticando sonegação fiscal. A própria modalidade do pagamento – em espécie – que alegadamente, segundo o representado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, teria ocorrido, de per se já possui o condão de levantar suspeitas sobre a operação, normalmente realizada em atividades ilícitas com a finalidade de dificultar ou mesmo impedir o rastreamento da origem dos recursos, ação típica de organizações criminosas.
Além disso tudo, o esclarecimento da motivação, autoria ou coautoria, e a identificação de eventuais mandantes da tentativa de assassinato praticada contra Jair Messias Bolsonaro é hoje uma exigência da sociedade brasileira, uma vez que o delito, mais do que um ataque pessoal, foi igualmente um atentado à democracia e ao próprio Estado Democrático de Direito e, nesse caso, entende-se haver a supremacia do interesse público sobre questões privadas, particularmente no que tange à busca da persecução penal, com a identificação de todos os partícipes do atentado terrorista.
A conduta dos advogados representados em não revelar o nome do contratante que se dispôs, de forma inequivocamente suspeita, a custear a defesa de um criminoso de reconhecida periculosidade, e que cometeu um delito de ampla repercussão social, pode ocultar a real intenção de resguardar quem, eventualmente, pode ser o mentor intelectual, mandante do crime, ou cúmplice de um complô para assassinar um desafeto político, e que agora busca evitar que o autor material do crime, venha a denunciar tal condição, se não for auxiliado devidamente em sua defesa; de preferência com a constituição de um corpo jurídico de inegável qualificação.
Levando-se em conta as fundadas suspeitas de que o atentado possa ter sido engendrado e financiado por uma organização criminosa, a conduta dos advogados em negarem-se a revelar a identidade do seu contratante, que se imagina possa ser o elo entre o criminoso e eventuais mandantes do crime, quando não, ele mesmo, integrante de um grupo criminoso, deixa de ser resguardada pelas prerrogativas constitucionais do exercício da advocacia, e passa a caracterizar conduta criminosa passível de responsabilização penal, nos moldes já anteriormente indicados, tais como associação em organização criminosa; crime contra a segurança nacional; e crime de terrorismo.
Não se confirmando, no entanto, a existência de delitos dessa natureza, e que tenham sido praticados pelos advogados representados, hipótese que somente se poderá descartar após uma adequada investigação, a ser levada a cabo por ordem do Ministério Público ainda remanesce; ante a declaração do advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, de que teria recebido os valores de honorários em espécie, de alguém que não quis ser identificado; a possibilidade de se estar frente a um delito de natureza tributária, como a omissão de renda para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo, conduta prevista na Lei n° 8.137/90; e que deve, igualmente, ser apurada.
Em resumo, com essa notícia-crime, já em processamento na Procuradoria Geral da República, e com o criminoso confinado em um presídio federal, só não chegam ao mandante se não quiserem.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado – liberatopo[email protected])