Em várias discussões deste teor, meus interlocutores me colocam sempre na encruzilhada : você é contra ou a favor ? Não me faço entender de modo algum : sou absolutamente a favor da agenda de Amoêdo\Novo, uma agenda perfeita para um “mundo ideal” que eu sonho, um mundo onde nem a pobreza mande, onde nem o grande Kapital mande, onde nem o Estado mande. Um mundo que forneça ao indivíduo, aquele pequeno\micro\médio empresário por natureza, a capacidade de Evoluir, sem sem impedido pela pobreza, pela Grande Burguesia e pelo Estado. Neste mundo, a proposta Amoêdo\Novo me parece, de fato, a melhor, ou pelo menos a mais explicitada, mais clara, mais direta ( dizem que Bolsonaro compartilha de muito dessa agenda, acredito, mas não está “explícito”, pelo menos para mim ). O problema, então, não é, para mim, programático, ideológico. Nisso estou com Amoedo.
O problema, para mim, enquanto psiquiatra, e que tende a ver as coisas psicopatologicamente ( talvez enviesadamente ) é que o ZeitGeist do momento, o Espírito dos Tempos no momento, não favorece Amoêdo, infelizmente.
Vivemos num momento de “Guerra Civilizatória” no qual há claramente uma “agenda feminina versus uma agenda masculina”. Ou ainda melhor, uma agenda “feminizante” e uma “masculinizante”. No mundo inteiro, e no Brasil não é diferente, assiste-se a um pêndulo : décadas, um século, de agenda “feminizante” , estão cobrando seu preço. O princiipal deles repercute-se na segurança : sem um “pai”, sem uma “autoridade”, sem Deus, sem uma “Moral”, sem disciplina, sem ocupação, o mundo vem se tornando um Caos. Está virando um Caos : Só com “direitos”, só com “prazeres”, só com “amor e diálogo”, só com “igualdade à força”, só com “coitado dele”, só com “não-pode-trabalhar-pois-é-crime”, “não-pode-dar-palmadinha-senão-é-crime”, só com “vamos dialogar sobre sexo, sobre drogas, sobre violência contra a mulher, sobre mulheres-sendo-menos-e-recebendo-menos-que-homens, mulheres apanhando de homens, sendo cada vez estupradas pelos homens, sofrendo cada vez mais “assédio moral”, “sexual” dos homens, sendo “humilhadas, escarnecidas”, pelos homens”, etc. Para todos os problemas sociais de nossa Era, a agenda feminista-esquerdista é uma só : mais “diálogo”, mais “amor”, mais “igualdade”, mais “relativismo cultural e moral”. Ora, chega um momento que não dá para sermos relativistas, temos de ser absolutistas. Tem hora que precisamos dizer e bater na mesa : “servimos a uma Autoridade necessária, há uma Ciência correta, há uma Moral da Sexualidade, há um Deus Vivo” ! Tem hora que não dá para relativizar, há que ser absolutista em certos princípios, há de fazer-se uma escolha não-relativa. Uma hora em que certos princípios não estão negociáveis, não estão na mesa de um colegiado ou numa “assembléia de pobres, coitados, mulheres oprimidas , minorias, desiguais, homonormativos”, etc. Há momentos em que princípios tem valor hierárquicos, estão acima do consenso, estão acima da vontade do colegiado. Em psiquiatria existe muito disso: com dependência não se dialoga, com o vício não se tergiversa, com a drogadicção não se compõe, com os impulsos não se acorda. É cortar na raiz!
Tais princípios, em determinado momento de caos e anarquia, precisam ser defendidos por um Estado que apoie tais princípios de ordem, disciplina, necessária tranquilidade para que todos possam ter um mínimo de convivência civilizada.
O relativismo estatal, hoje amplamente usado pela Esquerda Feminista, é o bastião que se erigiu contra tais princípios absolutos sobre os quais não se pode tergiversar. Bolsonaro representa isso, pelo menos serve de projeção imaginária do povo que se revolta contra o “relativismo moral” e não consegue mais conviver com ele ou trabalhar tranquilamente sob ele.
A agenda anti-princípios-absolutos redundou, em resumo ( falo isso porque lido com isso todo o tempo, desde 1981, como psiquiatra ) em : toda uma geração que não tem o menor respeito, só quer prazer, não quer trabalho, ocupação, não quer autoridade, recusa o pai, recusa Deus, recusa o militar, o juiz, o polícia, o pastor, recusa a ciência, recusa a ordem , recusa o “trabalho” ( “não posso ser forçado a nada”) e a disciplina. Isso engendrou o caos na segurança pública. Estamos cercados e sendo atacados por bandidos e por zumbis do crack, um pessoal que não tem medo de morrer ou de matar, um pessoal sob o signo do “princípio do prazer” ( Freud ). Esse pessoal está transformando a vida de quem quer ter sossego para trabalhar e criar uma família num verdadeiro inferno. Se prende um assassino de 16 anos, ele vai para a Psicóloga do Conselho Tutelar,para a Assistente Social do Juizado da Infância, chama a mamãe-prá-conversar, a Delegada de Proteção da Infância lhe passa a mão na cabeça e diz : “você não sabe que isto que você fez é muito feio, meu filho?” “Não faz mais isso não, viu ?” “É feio e mamãe fica triste”. Pronto ! Tá resolvido o problema !!
Esse tipo de atitude vem gerando no Brasil a impossibilidade de uma família, um pai-de-família, trabalharem em paz. Ou seja, o mínimo que o Estado tem de dar, ele não dá; o mínimo que aquele Estado Hobbesbiano ( aquele do Leviathan , aquele que deve proteger o “homem que é lobo do homem” ) tem de garantir , ele não garante.
Então, vê-se bem que Bolsonaro coagula o imaginário da projeção moral popular em pontos que Amoêdo não o faz : defende a volta de um Estado Forte ( Amoêdo fala no contrário ), defende princípios absolutos ( Amoêdo defende a relativização, pois , ao defender o Estado Fraco, não pode defender o Absolutismo Moral e Autoritário ). Amoedo, então, está, perante a massa da população que vota, vítima de sua própria agenda auti-autoritária, anti-Estado, anti-imposição. É claro que esta agenda pró-Estado-Forte é um risco enorme de descambo no puro Autoritarismo Militar. Eleitores de Bolsonaro já identificaram isso, consciente ou inconscientemente, por isso tendem a ver nele características humanas, fraternas, ternas , pacíficas, familiares, religiosas, obedientes, humildes, que se contraporiam a isso. Pode ser, de fato, “desejo de ser convencido”, ou pode até mesmo ser uma “jogada esperta” por parte do candidato, na tentativa de anular seu risco autoritário. Mas não há como saber, e , na dúvida, a população está preferindo apostar na única saída anti-relativística que está vendo pela frente.
(Marcelo Caixeta, médico psiquiatra)