Eu ouvi dos pombos-correios do Sapão Barbudo que ele planeja fugir para Marte. Em momento algum tive dúvidas da fuga anunciada. Lula é dos que acreditam que o sonho faz as coisas acontecerem. Como muitos sonhos dele se transformaram em realidade, acabei acreditando. Essa veracidade me suscitou devaneios. Eu o imaginei dizendo em seu rascante ataque de nordestinos: “Sou uma pessoa com os pés no chão. De Marte”. Não era por boniteza que dessa vez ele iria pular para construir uma casa ao lado do canal azul do mar morto do planeta vermelho, diria Leonel Brizola. A lógica do projeto é a mesma do Triplex do Guarujá mas dessa vez seria uma construção com pilastras de cristal. Como também sou devaneante, tive o súbito desejo de construir uma casa a partir do marco zero, mas sem o delírio do Lula et caterva. É lógico, mas até então eu não tinha conseguido nenhum rancho no meio do cerrado inóspito. A pantomima protagonizada pelo líder do Partido dos Trabalhadores vai chegando ao grand finale. Essa seria a sua última marcha de insensatez. Quase em estado de beatitude, eu continuava arquitetando uma lógica implacável para comprar um lote num dos sites imobiliários. Sabia que seria difícil, mas eu estava convicto de que conseguiria. O Brasil é um país de articulações surreais, até os imóveis hoje são cotados também surreais, a moeda imperante na capital do país. Esperava, portanto, achar um lote bem localizado, de tamanho razoável e barato.
Eu resolvi caminhar um pouco, após uma varredura que fiz no loteamento. Ao embarafustar por uma rua, encontrei o Lula que estava se dirigindo ao campo de lançamento de foguetes. Não titubeei em puxar conversa. O meu interlocutor com seu indefectível sotaque rascante, após afirmar que já conhecia o loteamento em que estive, fez um mapeamento irreverente dos personagens, das supostas roubalheiras, das vantagens e desvantagens do condomínio.
Sem limites nas papas de língua, as indagações sobrevinham desordenadas, mas logo que retomou a sua lógica inexorável, me interpelou se eu tinha pressa em construir a casa imediatamente. Fiquei pasmo, faltou-me sensatez. Em um súbito assomo de nervosismo, respondi que, primeiro, eu tinha que comprar o lote, mas apenas a intenção não bastaria, era preciso dinheiro.
Neste momento, em tom de novena que sempre pregou todos os dias pelo Brasil, sorriu a um só tempo, sério e jocoso, me replicando com a sua veemência de profeta de Deus: “Meu amigo, nunca diga uma bobagenzinha dessa, que não tem dinheiro. Você não sabe quais são os planos dele. As coisas imprevisíveis são também por ele decididas, inclusive, as fatoráveis. Chega a ser um sacrilégio afirmar que abdicará de um sonho porque não tem dinheiro. Nunca repita isso, acredite nas instâncias superiores, meu amigo. Diga o seguinte: ”Tenho , mas os recursos não estão disponíveis no momento.
(Edvaldo Nepomuceno, escritor)