Como sempre disse, na minha velhice de uma vida bem vivida, enfrentando percalços e saboreando fugazes momentos de boa convivência, pude analisar o quão triste é ver-se abandonada pelos inumeráveis amigos dos bons tempos, que se reduziram a pouquíssimos, contados nos dedos da mão.
Diz o nosso sempre bem humorado e sábio sertanejo que ”amigos são que nem aves de arribação: quando o tempo é bom, eles vêm, mas quando o tempo é ruim, eles se vão”. E isto eu digo com pleno conhecimento de causa.
Todas as semanas, conto como certa a visita do amigo Liberato Póvoa, que se mostrou e se mostra amigo, passando boas e agradáveis horas relembrando nossos tempos de implantação do Tocantins, quando comíamos a poeira do “bandejão”, restaurante comunitário de Palmas, onde se misturavam os pobres e os ricos, os desimportantes e os importantes, numa convivência que parecia fadada a ser permanente.
Mas, que ilusão! Na época, eu cuidava da parte da cultura do Estado, e Liberato capitaneava a Justiça, e fazíamos das fraquezas força para construir um Estado modelo. Mas bem cedo nos decepcionaríamos, vendo que nosso querido Tocantins, que, implantado por um forasteiro, embora idealista e tocador de obras, passou a ser, de um Estado de oportunidades para um Estado de oportunistas, enriquecendo os que para ali foram tão-somente para literalmente “fazer a vida”.
Isto é apenas para chegar aonde quero.
Meses atrás, li o belíssimo artigo do respeitado criminalista Dr. Alex Neder (“Liberato Póvoa, um gigante da literatura regionalista nacional”, publicado no “Diário da Manhã”), que mostrou com precisão a trajetória de grande regionalista, considerado o maior escritor do nosso estado, com mais de 20 obras editadas, dos gêneros de conto, crônica, romance, filologia, Direito, novela e Hisória; meses antes, quando do lançamento de seu penúltimo livro (“Que saudades de São José do Duro!”), o grande jornalista e articulista do ‘Diário da Manhã” Helvecio Cardoso já fizera um minucioso panegírico de Liberato, usando palavras muito adequadas para retratar o talento do nosso conterrâneo, e seu consistente currículo, riquíssimo como poucos, diz tudo.
Recentemente, num projeto com a participação do Governo do Tocantins, Liberato foi convidado por um grupo de empresários a escrever o roteiro de um filme sobre a vida de Ayrton Senna, desafio que aceitou, mas devido aos últimos acontecimentos políticos no Tocantins, receia-se que o projeto seja suspenso até que se defina a situação.
Mas, excluindo-se a literatura, ele se revela um “factotum”, um “homem dos sete instrumentos”, desempenhando com maestria todos os misteres a ele confiados.
Conheço Liberato há décadas sempre como a pessoa em cuja simplicidade e bom humor se esconde um competentíssimo e honesto administrador. Em apenas um ano na Presidência do Tribunal de Justiça do Tocantins, em 1989, dobrou o número de comarcas, criando e instalando mais de vinte, e, como o Estado dispunha de apenas cinco juízes (um em Miracema, dois em Porto Nacional, um em Araguaína e um em Pedro Afonso), tratou de realizar um concurso, que levou ao provimento de todas as comarcas, com a particularidade de ter elevado várias à 2ª e 3ª entrâncias, criando inúmeras Varas: em Gurupi, por exemplo, que possuía apenas um juiz, ele deixou criadas e providas nada menos que mais nove varas e dois Juizados Especiais, o mesmo acontecendo com Araguaína, e as comarcas elevadas à 3ª entrância sempre estariam com dois ou mais juízes. Sou testemunha de tudo isso, pois na época eu era sua assessora no Gabinete.
Todas essas gigantescas realizações foram feitas em apenas um ano, pois foi eleito Presidente para completar o mandato do então Presidente, Osmar José da Silva, que se aposentara no meio do seu mandato. E mostrou-se um incansável administrador, sem jamais haver pairado uma tênue sombra de suspeita sobre sua honestidade. Mas sua decência, imparcialidade e independência, aliadas à inquestionável competência, abriram um clarão, e de certo tempo em diante passou a incomodar os políticos, lembrando o padre Vieira, que dizia: “o contrário da luz não é a escuridão, mas a luz maior”, e Liberato, sem poder ser superado, passou a sofrer inclemente perseguição política e dos próprios colegas de toga, colecionando várias dezenas de processos, dos quais se saiu airosamente, pois a absoluta falta de motivos conduziu-os ao arquivamento, levando-o a produzir no seu Estado de origem, como a árvore frutífera cujos galhos carregados ultrapassaram o muro e passaram a frutificar em quintal alheio, ou como o touro que, saindo da fazenda do dono, foi dar crias em fazenda alheia.
Não bastasse isso tudo, seus artigos, que valorizam sobremaneira o caderno “Opinião Pública” deste jornal, mostram sua erudição, escrevendo, numa linguagem escorreita de um vernáculo irreparável, sobre tudo quanto se pode imaginar: regionalismo, Direito, História, crítica literária, folclore, política, direitos humanos, religião, filosofia, tudo com idêntica desenvoltura, fazendo a crítica ao cotidiano, sem a preocupação de agradar ou desagradar, com uma coragem inaudita, falando o que acha certo, até mesmo contra os semideuses do Judiciário, sem receio de ser interpelado por quem quer que seja.
Na minha longa e escolada estrada, que palmilhei por mais de noventa anos, quando fui secretária de Estado e política atuante, fico imaginando o quanto Liberato Póvoa tem a contribuir com Goiás, de onde saiu e para onde retornou, e poderia ingressar na política, pois em sua palpitante e fértil cabeça existem ideias que poderão vir a contribuir para nosso desenvolvimento, pois certamente transformar-se-ão em preciosos projetos.
Goiás muito ganhará, ainda mais que foi noticiado que ele se filiou a um partido, certamente porque, lá no fundo, deseja oferecer seu privilegiado cérebro a nosso serviço, sempre avesso à corrupção e aos privilégios. E, no anúncio de sua filiação e candidatura registrada, apareceu em muito boa companhia, ao lado do senador Ronaldo Caiado, governadoriável de 2018, em cuja chapa certamente estará, se se candidatar a algum cargo eletivo.
E, conhecendo-o como conheço, com certeza marcará sua passagem com uma politica ética e voltada aos interesses do povo, pois, como homem público, ocupou os mais altos cargos na magistratura do nosso Tocantins, que chegou até a governar, saiu da vida pública tão pobre como entrou, pois jamais participou de esquemas espúrios, continuando o homem simples que sempre foi, sem arroubos de grandeza, mas com a disposição que sempre lhe marcou o procedimento.
E será o representante do povo com que todos sonham. E com isto ganha o povo, ganha a política e ganha Goiás.
Vamos fertilizar esta ideia!
(Ana Braga, acadêmica da Academia Tocantinense de Letras – Cad. 04, Academia Feminina de Letras e Artes de Goiás – Cad. 04 e Academia Goiana de Letras – Cad. 31)