Trata-se de tema recorrente dizer que a reforma trabalhista provocou uma revolução na adormecida organização sindical, alterando a natureza compulsória da contribuição legal, do artigo 545 da CLT. Entretanto, as negociações coletivas tomaram caminhos diversos, e o custeio de sindicatos passou a funcionar como moeda de troca com contingências que devem ser consideradas, especialmente nas normas inseridas em convenções coletivas de trabalho. Também o Ministério Público do Trabalho tem sido procurado para mediar os interesses de custeio dos sindicatos.
A obrigação do pagamento de contribuição assistencial e confederativa tem entendimento pacificado no Tribunal Superior do Trabalho e no Supremo Tribunal Federal no sentido de que se vinculam ao recolhimento apenas os associados do sindicato (Precedente Normativo 119 do TST e Súmula Vinculante 40 do STF), porque, contrariamente, violaria o princípio da liberdade sindical quanto ao direito de se associar ou não a sindicato. Nesse sentido, confira-se notícia publicada na ConJur em 3 de março de 2017 sobre recurso extraordinário com repercussão geral sobre a matéria em que o STF considerou inconstitucional cláusula de acordo coletivo, convenção coletiva ou sentença normativa que impõe o desconto de salários a empregados associados ou não do sindicato.
Entretanto, a partir da vigência da reforma, as negociações coletivas criaram outras formas de custeio para sindicatos que poderiam ser classificadas como abuso do direito sindical, tanto pelos sindicatos profissionais como patronais, porque insistem no caráter obrigatório do desconto nos salários dos empregados, deixando as empresas às escuras entre a norma coletiva e sua garantia constitucional (artigo 7º, XXVI) e a citada jurisprudência que homenageia o direito à liberdade de associação.
A denominação utilizada para dar destino à arrecadação e que serviria para justificar o desconto varia segundo o interesse (cláusula de fortalecimento sindical, cláusula de formação profissional, saúde e lazer, por exemplo) e os valores são calculados sobre os reajustes ou percentuais de salários. Além dessa cláusula que pretende substituir a contribuição compulsória, fica mantida, como de praxe, a contribuição assistencial. Para finalizar, as cláusulas pretendem que a obrigação de pagamento atinja associados e não associados do sindicato. Cláusulas dessa natureza poderiam ensejar a nulidade em ação própria pelo Ministério Público do Trabalho.
De plano verifica-se a insistência dos sindicatos em pactuar cláusula de contribuição obrigatória que já fora rejeitada pela jurisprudência do TST e do STF e que são incapazes de gerar efeitos jurídicos coercitivos. A suntuosidade com que são redigidas impressiona.
Não há dúvidas de que as negociações coletivas devem ser estimuladas a fim de que se busque o equilíbrio de interesses entre trabalhadores e empregadores. Todavia, o conteúdo de cláusulas que tratam do custeio de sindicatos é de flagrante abuso de direito sindical, pois desconsidera a efetiva manifestação da autonomia da vontade coletiva. As normas coletivas devem estar condicionadas a decisão assemblear, desqualificando-se a natureza obrigatória quando celebradas sem ouvir os interessados.
Neste sentido, o Ministério Público do Trabalho poderia exercer papel relevante de guardião da ordem e do exercício da liberdade sindical, enquanto direito individual que se materializa de forma coletiva. Quando se tratar de matéria de direito coletivo, chamado ao papel de mediador, o Ministério Público do Trabalho poderá atuar de forma pedagógica, fortalecendo e estimulando a conciliação, sem deixar de observar o interesse público em detrimento do interesse particular de entidades sindicais.
Assim, a adequação de interesses de sindicatos para suprir a ausência de contribuição sindical com sustentação pelo Ministério Público não serve para adquirir eficácia jurídica obrigatória pelo fato de que fora avalizada pelo parquet, cuja autoridade foi emprestada para formalmente revestir de compulsória verba cuja natureza facultativa já foi superada pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho e do Supremo Tribunal Federal.
Por isso, não poderia causar estranheza que o Ministério Público do Trabalho se recuse a pactuar a concordância, como mediador, de repasse à entidade sindical, de diferenças salariais que seriam pagas aos empregados, obtidas em reajuste da data base, criando no âmbito da categoria econômica dúvida e insegurança na validade do pactuado porquanto ofensivo à salvaguarda constitucional do direito à liberdade sindical.
(Paulo Sergio João, advogado trabalhista e professor da PUV-SP e FGV-SP)