A paixão é o que nos perde, e nos faz sentir o arrebato da vida. Ninguém que esteja apaixonado em a posse e si mesmo. Imerso no desvario de se crer possuidor da imagem fugidia que escolheu para adorar, é por ela possuído. O que se crê possuidor vira prisioneiro de seu próprio desvario: o auto engano de crer que pode possuir, no outro, não só o seu corpo, mas sua alma e seu espírito.
Tendo só duas paixões, a de Eros, e a dos filhos, passou a vida no vazio, depois que perdeu os dois. Todo apego vira paixão inútil, depois que se dissipa. Jamais poderemos entender a real dimensão do ser daquele ou daquela que dorme conosco: quem somos é intraduzível, e o estudo do Ser é um combate mortal, em que gritamos de agonia, antes de vencer; ou ser vencidos, conforme nosso discernimento, e a qualidade não egóica de nosso (desejo) ou de nosso amor ao ser por quem decidimos nos apaixonar.
Somos frutos de nossas escolhas. Em nós dorme um Deus que deseja despertar. Este Deus desconhecido é que sustenta, com a força de seu Verbo Creador, tudo o que existe – na luz como nas trevas, em cima como em baixo, nos abismos do Ser, ou na sua imensidão. Nem mesmo a pedra dorme para sempre. Seu ser mineral vibra, como tudo vivo, e sonha pertencer ao verde mundo vegetal.
Sonhos que podemos ser
“O que foi feito daquilo que a gente tanto sonhou?”. (Belchior). Ficou na estrada do tempo, como tudo fica depois que tudo passa. O que ficou do ‘verso menino”que fizemos, e se perdeu no tempo? O que foi feito do oceano de sonhos que alimentamos, na ciranda do auto-engano? Ficou na estrada real do esquecimento, onde tudo fica, depois que tudo passa.
Engravatados de alma
A atmosfera fica carregada de respeito e contrita veneração e contido temor, quando se espera uma autoridade chegar. O público-alvo veste a roupa da dignidade momentos de entrar no palco o que manda no pedaço. Antes de sair às ruas colocou a máscara de outra persona – a de pessoa destacada na sociedade, com poder de ser convidada a ser alvo da fala da suprema autoridade. No teatro, como na conferência hermética do pós-doutor da Sorbonne, tanto representam os atores, quanto encena a distinta platéia. Os artistas vestem a dignidade de grandes sábios, de caráter impoluto e sem jaça, e o público estóico, fazendo uma cara inteligente, torce para o imbróglio acabar logo.
O ambiente fica carregado de respeito, e faz que inflem os corações dos munícipes, onde vai o senhor intendente. Quanto ao alfaiate, que se esmerou no uso da agulha e da fita métrica, não aparecerá no corte da fita, embora tenha colocado esmero e arte em sua performance de artista. Sempre haverão pessoas que se sentem honradas por estarem na mesa de pista, ou na fila do gargarejo da distinta platéia.
O imbecil coletivo e os inocentes úteis
É possível sentir piedade pelo imbecil coletivo – inconsciente de sua ignorância, e até sem maldade em seus atos perversos, condicionados pelo ambiente pérfido em que vive.
Suas colocações equivocadas ou divorciadas da verdade vem de sua ignorância quanto às origens dos acontecimentos.
Porém, não se deve ser tolerante com que se voluntariza para ser inocente útil; infelizmente não inútil, já que tem uma utilidade maléfica e destrutiva, da qual tem noção.
Este caso é o do idiota opcional. O que torna-se idiota, ou mantém=-se idiota por opção dele próprio. Por defeito de caráter, e deformação de personalidade.
Livre escolha de ser produto da mentira coletiva, e tornar-se arauto de inverdades disseminadas por sociopatas infiltrados nas mídias, partidos políticos, movimentos sociais, coletivos e organizações, governamentais ou não.
Os primeiros são inocentes de seus atos, uma vez que não têm consciência de sua ignorância. A partir do instante em que tomem conhecimento do que ignoravam, deixariam de ser ignorantes.
Porém indesculpável agente predatório da sanidade humana é o imbecil militonto, geralmente agressivo e intolerante. Quando em bandos, é violento. Revela-se depredador de bens particulares e públicos, incendiário e anarquista sanguinário.
“A ignorância é uma coisa monstruosa. Cresce como massa fermentada”. (Olavo de Carvalho)
(Brasigóis Felício, escritor e jornalista. Ocupa a cadeira 25 da Academia Goiana de Letras)