O amor e a paixão encontraram-se por acaso em um final de tarde e decidiram tomar juntos a um café. Impaciente, a paixão pedia agilidade ao garçom enquanto o amor folheava uma revista com olhar distraído. Sua paciência irrita a amiga: “Como você consegue manter-se tão calmo? Porque se demora tanto para fazer um café?!” O amor sorri. “Na verdade, não estou aqui pelo café, gostaria de curtir um bom papo com a minha amiga, mas ela está tão preocupada que parece não me perceber. Tomara que o café demore, assim teremos mais tempo para conversar. Já não nos encontrávamos há tanto tempo”. A paixão se ajeita no banco. “É, amigo. Você anda mesmo sumido. Quase não te vejo por aí. As pessoas parecem não precisar mais de você. Estão como eu: preocupados demais para lhe perceber. Está desempregado?” O amor fica em silêncio por alguns segundos, coloca a revista de lado e olha para a amiga. “Estou fazendo bicos, trabalho aqui e ali, nada duradouro, quase sempre restrito ao serviço de mães e avós. As pessoas estão mais propensas a você que a mim”. A paixão finalmente pega o café, coloca o açúcar, mexe e fita o amigo. “Eu estou numa correria só. Todos me querem por perto, não estou tendo tempo para nada. Antigamente meu público era bem jovem, mas hoje atendo a todas as idades. Você não tem raiva de mim, já que estou prosperando tanto, né?” O amor também recebe o seu café e sorri. “Não”, diz ele soprando e mexendo ao mesmo tempo, “esse sentimento não combina comigo. Não somos concorrentes, temos papéis diferentes. O certo é você abrir o meu caminho. As pessoas se empolgam na paixão e se realizam no amor!”. Ela não discute. Diz que está apressada, fala ao telefone o tempo todo, gesticula e tem uma agenda cheia. Ele está com a tarde livre. Ela pede a conta e tira um bolo de dinheiro da bolsa cheia de coisas que não sabe para que servem. Ele está sem um tostão e pede para a amiga pagar a conta. “Só mais esta vez”. Ambos se levantam e partem para caminhos completamente diferentes.
(Thiago Mendes é escritor)