Passada a primeira onda do tsunami eleitoral o contribuinte goiano deve estar se perguntado o que esperar de 2019. O mantra repetido em todas as entrevistas de eleitos ao Executivo País afora, e em Goiás, é a preocupação com a questão fiscal, ou seja, a saúde financeira dos Estados para fazer frente a suas demandas emergenciais e a dolorosa folha de pagamento de seus servidores.
Um recente ministro da Fazenda trouxe à tona uma frase da liberal Margareth Thatcher ao tratar da questão do dinheiro publico: “Nunca esqueçamos esta verdade fundamental: o Estado não tem fonte de dinheiro senão o dinheiro que as pessoas ganham por si mesmas e para si mesmas.”
Ou seja, ao fim e ao cabo, o dinheiro público não é autogerado, ele vem da arrecadação de tributos que são pagos pelos contribuintes, empreendedores em essência, que colocaram seu capital a risco para buscar condições de empreender e ter oportunidades de vida melhores.
E Goiás sempre foi um Estado pródigo na busca por investimentos. Pioneiro na estruturação de um programa vanguardista, o Fomentar, percebeu cedo que a baixa densidade populacional e a distância dos maiores mercados consumidores, internos e externos, seriam um obstáculo a transpor.
Nossa Constituição Federal tratou, em pelo menos oito artigos, do desenvolvimento regional, mas a efetividade não aconteceu de forma uniforme e institucionalizada. Por isso o Estados, com a única ferramenta que tem, o ICMS, foram implementando solitariamente suas próprias políticas de desenvolvimento, à revelia de uma pacto nacional.
E como progresso e desenvolvimento econômico ainda estão ligados ao desenvolvimento industrial, Goiás saiu a campo, com agressivas leis de incentivo para atrair indústrias, pois a agricultura e pecuária, orgulho do Estado e fundamentais para manter os bons índices da nossa balança comercial, têm baixa empregabilidade e maior concentração de renda.
A indústria, quando se instala, altera a realidade social e econômica da região. Há busca por mão de obra em todos os níveis de escolaridade, com garantia de carteira assinada, além de criação de pessoas jurídicas que atuam na prestação de todo tipo de serviços, fora a oferta de leitos, alimentação, incremento no mercado imobiliário e a criação de uma rede de pequenas empresas fornecedoras.
Ainda não conseguimos estabelecer um mecanismo de desenvolvimento constante e perene que não esteja vinculado à atividade industrial. O mundo está em um processo de transformação acelerado, e com toda certeza o modelo econômico será impactado. No entanto, para nós, países ainda com grande déficit social e educacional, a industrialização ainda é um modelo de grande transformação e oportunidades para as regiões mais distantes do porto e dos consumidores.
E Goiás surfou bem nessa onda, ora com planejamento e ousadia calculados, ora com agressividade e riscos elevados. Mas o fato é que tanto a legislação do Fomentar como a do Produzir foram feitas como modelos de agilidade, baixa burocracia e buscando facilitar o empreendedorismo.
Goiás foi tão eficiente na atração de investimentos que o Estados hoje efetivamente industrializados, com cidades cuja participação arrecadação são maiores do que o orçamento do nosso Estado inteiro, começaram a se movimentar com medidas legais e outras nem tanto assim para barrar a vinda de industrias para cá.
Foram anos de glosas, ainda existentes de forma pontual, de ameaças, de ações diretas de inconstitucionalidades e de pareceres de grandes juristas dançando nas mesas dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), os quais em sua ampla maioria são cidadãos oriundos das Regiões Sul e Sudeste, as mais insatisfeitas com a ousadia do pequeno Estado do Centro-Oeste.
Até que se chegou a uma lei complementar que visa acabar com as disputas como uma espécie de marco zero, que agradou a uns e desagradou a outros, a nova regra é, ninguém pode conceder mais nenhum incentivo ou benefício unilateralmente. Agora, somente com a aprovação unânime do Confaz.
Nos anos que antecederam esse marco zero a crise fiscal dos Estados foi levada aos pícaros, reflexo também da desaceleração econômica nacional. E os Estados começaram a promover cortes nos seus incentivos fiscais, bem como exigências de antecipação de ICMS, e criação de fundos de pobreza.
Em Goiás, houve claro enrijecimento na fiscalização do Produzir e do Fomentar e endurecimento das regras, com prazos mais exíguos e forte protagonismo do ente arrecadador, buscando uma forma de melhorar os números da receita.
O órgão responsável pela aprovação e apreciação das contrapartidas do Produzir foi aos poucos deixando de ser uma Secretaria de apoio à industrialização para torna-se uma ante-sala da arrecadação.
O contribuinte empreendedor, antes convidado para vir para Goiás para gerar emprego e investimento, tornava-se agora um adversário, um usurpador de arrecadação, um elitista que veio para o Estado explorar a riqueza local.
O romance acabara, e o iludido empreendedor se via agora em um Estado que o trata como expropriador, que chama seu benefício, dado em um contexto legal de amistosidade, de renuncia de ICMS e culpa-o por toda crise fiscal do Estado. Aquele ICMS que Goiás não tinha e passou a ter com a atração de indústrias, é agora o grande vilão.
Mas, a nossa balzaquiana Constituição Federal, perfeitamente talhada para proteger direitos individuais e também os arroubos do Estado, trouxe princípios que são cláusulas pétreas, muito bem conhecidos pelo governador que ora se elege, pois os defendeu inúmeras vezes enquanto Deputado Federal e com mais ênfase enquanto Senador da República.
Então, nessa virada de governo, acredito que o contribuinte pode sim confiar de que, independente de como encontre as finanças de Goiás, o novo governador vai se nortear pelos Princípios Constitucionais quando tratar dos contratos e termos de acordo de benefícios fiscais.
A proteção ao direito adquirido, a legalidade, a anterioridade e à capacidade contributiva, oferecendo ao empreendedor um ambiente de segurança jurídica, sem ameaças e ofensas.
Tenho certeza de que o novo governador não busca a desindustrialização do Estado, retirando abruptamente incentivos que agora foram recepcionados pela Lei Complementar 160/2017, o marco zero da guerra fiscal.
(Liz Marília Guedes Vecci Mendonça, advogada tributarista e sócia da Terra e Vecci Advogados Associados)