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OPINIÃO

Cigarros eletrônicos e os riscos da desinformação

Flávio César Borges Gonçalves – Professor de Biologia e Coordenador Pedagógico do Colégio Integrado – Goiânia – Goiás.

MODS (VAPE) E PODS são sistemas eletrônicos utilizados para a inalação de fumaça e nicotina que causam espanto para quem entende a banalização das suas consequências e esperança para alguns fumantes crônicos que insistem nesse tipo de recurso para solução dos males do fumo. Todavia, essa controvérsia, que qualifica os cigarros eletrônicos como forma de reduzir o uso do cigarro convencional versus o seu malefício para a saúde pública, é amplamente discutida tanto entre profissionais da saúde quanto entre jovens desavisados que inadvertidamente usam tais dispositivos.

Alguns estudos esparsos foram realizados, porém não conseguiram precisar a margem de segurança para a utilização dos cigarros eletrônicos como recursos para a eliminação do vício no fumo convencional. Estes estudos sequer garantem o uso do cigarro eletrônico como forma de mitigação da inalação regular de nicotina pelos fumantes inveterados.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o tabaco é o maior motivador de mortes de simples prevenção, superando as mortes causadas em acidentes de trânsito. A imprensa dos Estados Unidos divulgou que, até o mês de outubro deste ano, 26 óbitos em razão do uso de CE’s, e outros 2 foram registrados na Bélgica. A maioria das mortes foi causada por respostas inflamatórias graves dos pulmões, o que desencadeava uma insuficiência respiratória. Essas mortes geraram um frenesi por busca de informações seguras sobre o uso dos CE’s (Cigarros Eletrônicos). A respeito desse assunto, até o presente momento, é fato: não há dúvidas de que se não for para a tão incerta redução da inalação da nicotina em fumantes crônicos, não há o menor sentido em utilizar CE’s.

Sobre a grande especulação de que o CE não causa nenhum tipo de efeito nocivo, pode-se pensar, primeiramente, na ausência de sua regulamentação. Fato esse que implica no comércio ilícito do produto, potencializado pela falta de fiscalização. O comércio paralelo ilegal permite que diversas marcas e diversos tipos de produtos cheguem ao consumidor final. Não existe um órgão controlador específico no Brasil, há apenas a sobrecarregada ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), de qualquer forma, ela já posicionou-se sobre o assunto e condena o uso e o comércio de cigarros eletrônicos.

Em 2016, a Anvisa — em parceria com o Ministério da Saúde, com o Instituto Nacional do Câncer e com a Organização Panamericana da Saúde — proibiu o uso e o comércio dos cigarros eletrônicos por carência de provas sobre a sua segurança. Por conseguinte, a falta de uma regulamentação específica faz com que diversos tipos de marcas sejam comercializadas sem o mínimo controle de segurança de produção. Em um estudo da OMS, ficou provado que a concentração de nicotina em algumas essências variava de 6mg a 100mg.
A nicotina, além de gerar dependência, é prejudicial para grupos mais vulneráveis, como crianças, jovens, idosos, gestantes e pessoas com problemas cardíacos. Uma pesquisa publicada na “WHO framework convention on Tobacco Control”, em 2005 (Genebra - Suíça), mostra que porções altas de nicotina (0,5 a 1,0mg por peso corporal) podem ser letais. Ademais, a falta de fiscalização permite que essências aromáticas (flavorizantes) sejam adicionadas no cartucho, o que torna ainda mais agradáveis e mascarados os efeitos do CE.

Em todas as marcas de cartuchos registradas, foi encontrada uma grande quantidade de propilenoglicol, substância que evapora e chega aos pulmões entre 40º e 65ºC, e serve para volatizar a nicotina. O efeito vasodilatador do ar quente pode favorecer a difusão pelos capilares sanguíneos das diversas substâncias, não regulamentadas, encontradas em algumas marcas. Dentre elas há: dietilenoglicol, formaldeído, acetaldeído, acroleína e, até, a nitrosamina (substância altamente cancerígena).

De acordo com uma pesquisa do Jornal Internacional de Pesquisa do Meio Ambiente e da Saúde Pública (2013), algumas substâncias apresentaram um comportamento citotóxico para células do miocárdio. Já nos pulmões, tanto de fumantes passivos quanto ativos de CE, os níveis de óxido cítrico aumentaram consideravelmente. Isso pode desencadear efeitos inflamatórios agudos, num curto intervalo de tempo, por isso, provavelmente, houve tantos óbitos registrados nos últimos tempos.

A pesquisa de Moon-Shong Tang, biólogo molecular da Universidade de Nova York, mostrou os efeitos nocivos do cigarro eletrônico usando animais experimentais. Um grupo de animais foi exposto ao ar filtrado, outro à fumaça do cigarro eletrônico e um terceiro grupo foi exposto à nicotina. Os espaços alveolares aumentaram no grupo exposto ao cigarro eletrônico, esse fato indica uma maior redução das áreas de hematose (trocas gasosas) e consequente perda da vascularização. É irônico pensar num pulmão com perda de vascularização, pois a principal característica da eficiência pulmonar é a manutenção da sua vascularidade, fato que aumenta sua capacidade de difusão dos gases no organismo.

Portanto, a pergunta que não quer calar é: Por que tantos jovens estão usando cigarros eletrônicos?
A maioria das pesquisas sugere que os principais motivadores são: o desconhecimento das nocivas de tais dispositivos, a sua livre comercialização irregular e a falta de regulamentação específica. Percebe-se também um comportamento previsto pelo consagrado sociólogo Pierre Bourdieu (1930-2002) entre os jovens. Para ele, não há separação entre o agente social e a sociedade. Na sua teoria de “Habitus x Campos”, existem estruturas estruturadas que atuam como estruturas estruturantes. Assim, as trilhas a serem seguidas não precisam ser guiadas por um agente coordenador. É como se o agente, que no caso representa o nosso fumante, não vivesse à base de uma cartilha comportamental a ser seguida. A prática de fumar é uma escolha subjetiva que o insere num campo de convivência. Ou seja, a forma de agir (praticar) e pensar obedecem a uma ordem coletiva.

E agora? O que fazer? Formas eficientes de prevenção ao uso dos cigarros eletrônicos devem ser compartilhadas, e nenhuma delas se afasta do convencimento técnico e científico. Precisamos divulgar em todos os grupos da sociedade, principalmente para nossas crianças e jovens, as informações corretas e não manipuladoras. Os dados idôneos e responsáveis podem gerar na população, sobretudo em sua parcela juvenil, uma sensibilidade madura a qual valoriza a preservação da saúde.

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