Um dos maiores homens públicos do Brasil I
Diário da Manhã
Publicado em 9 de dezembro de 2021 às 17:47 | Atualizado há 3 anos
A cena não poderia ser mais imprevisível: a esposa de um grande homem público deste país, angustiada com o estado de saúde do presidente eleito Tancredo Neves, deixa o marido na biblioteca e vai para a cozinha tomar um copo d’água. Passados não mais que cinco minutos, essa senhora retorna à biblioteca e encontra o marido com o rosto deitado sobre um livro aberto. O 18 de abril de 1985 entrou para história, pois foi nesse dia que faleceu uma das maiores personalidades da política brasileira. Naquele momento, um filme de mais de 50 anos de um casamento feliz passou na memória daquela senhora que acabara de perder seu companheiro de toda uma vida. Para que possamos entender esta história, proponho que voltemos 113 anos no túnel do tempo, especificamente na pequena cidade sul-mineira de Santa Rita do Sapucaí.Foi lá que nasceu, no dia 8 de fevereiro de 1908, um menino forte e saudável, filho do modesto contador João Pereira Pinto e da dona de casa Ana Augusto Pinto. A escolha do nome da criança se deve ao fato de o pai da criança ser um fã incondicional do poeta Olavo Brás Martins de Guimarães Bilac. Não preciso dizer que estes escritos têm como figura central a biografia do notável homem público o ex-presidente da Câmara dos Deputados, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal e ex-embaixador do Brasil na França, Olavo Bilac Pinto ou, simplesmente Bilac Pinto, como assim gostava ele de ser chamado.Bilac Pinto fez seus primeiros estudos no mesmo prédio que abrigaria, décadas depois, o Instituto Nacional das Telecomunicações (Inatel). Ainda em Santa Rita, o filho do contador João Pereira Pinto concluiu seus estudos no famoso Instituto Moderno de Educação e Ensino, dirigido pelo senhor Henrique Del Castilho, este, marido de uma mamma dos estudantes de estilo italiano, a popular dona Espanha.Concluído o ensino fundamental, Bilac Pinto rumou para uma grande cidade, Belo Horizonte, e lá entrou para um dos cursos mais tradicionais de Direito no Brasil — o da Universidade de Minas Gerais. Durante os anos na faculdade de Direito, Bilac Pinto foi não só um brilhante aluno, mas, também, um líder altamente respeitado entre seus pares, como a exemplo de um mineiro de Bocaiúva, José Maria Alkmin.Conhecido e reconhecido na BH de Juscelino, o filho do contador de Santa Rita se tornou uma espécie de pupilo de uma das maiores raposas mineiras. Falo do então presidente Antônio Carlos de Andrada.Muita coisa ocorreu em tão pouco tempo para o jovem Bilac Pinto. Um futuro brilhante o levaria ao mais elevado patamar da política nacional. Faltava, para o filho do contador, encontrar sua cara-metade. A Carminha de sua vida ele encontraria pouco tempo depois, na sua Santa Rita natal.A filha do poderoso coronel casa com o filho do contador.Ao regressar à sua Santa Rita natal para passar o fim de ano na casa dos pais, já famoso e respeitado nas Gerais, Bilac foi homenageado com um sarau no Clube Literário Santa-Ritense. Na comissão organizadora do evento, encontrava-se a filha do poderoso coronel Chico Moreira, este, irmão do Ex-Presidente da República Delfim Moreira e, naquela época, sem dúvida, o homem mais rico do sul de minas. Conta seu biógrafo, Murilo Badaró, que “ao chegar ele [Bilac Pinto] ao Clube Literário, os recepcionistas perceberam o olhar derramado de Bilac em direção a Carminha Moreira, com quem trocara flertes esquivos durante encontros no período de férias”. Após um breve período de namoro, o filho de modesta família se casou, no dia 22 de abril de 1933, com a filha do poderoso coronel Chico Moreira, sobrinha do Ex-Presidente da República Delfim Moreira. No trecho que exponho a seguir, Murilo Badaró relata a generosidade do pai de dona Carminha com o, agora, genro Bilac Pinto. São suas palavras: “Dizendo-se sabedor das dificuldades com que lutara João Pereira Pinto para mantê-lo estudando em Belo Horizonte e dos percalços naturais de quem está iniciando uma carreira, o coronel Chico Moreira comunicou a Bilac estar contemplando-o com um adiantamento de legítima, o suficiente para dar-lhe forças e segurança para a arrancada inicial.” O ato de generosidade do pai de dona Carminha para com o genro emocionou Bilac Pinto, que manteve com o sogro uma estreita relação de respeitosa amizade até a morte deste.Um episódio que mostra a estreita ligação que tinha Bilac com seu sogro se reporta à perseguição do ditador Getúlio Vargas ao então deputado no momento em que este assinou um documento que chegou a abalar as hostes getulistas. Falo do “Manifesto dos Mineiros”. A resposta do regime se voltou para perseguir Bilac. Cassou suas cátedras de professor na Universidade de Minas Gerais e Universidade do Brasil. Não satisfeito com a punição, Getúlio convocou alguém que ele respeitava e admirava pelo espírito empreendedor. Esse personagem era nada mais nada menos que o Coronel Chico Moreira.O biógrafo de Bilac Pinto assim narrou o encontro com o líder político de Santa Rita do Sapucaí e o Presidente da República: “Getúlio recebeu-o fumando um charuto, com seu habitual sorriso”, no segundo momento, após uma breve pausa, sugeriu que seu genro deveria afastar dos negócios do Banco da Lavoura. A atitude do Coronel Chico não poderia ser outra. Homem de reconhecida personalidade, ele renunciou imediatamente a diretoria do Banco da Lavoura, que ajudou a fundar com Clemente de Faria. Sim, Bilac e o sogro eram homens absolutamente iguais no tocante ao caráter.