“A minha paz vos dou”
Diário da Manhã
Publicado em 29 de setembro de 2018 às 23:17 | Atualizado há 7 anos
“Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como o mundo a dá. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize.
Ouvistes o que eu vos disse: Vou e volto para vós. Se me amásseis, certamente vos alegraríeis por eu ir ao Pai, porque o Pai é maior do que eu.
E agora vos disse, antes que aconteça, para que, quando acontecer, acrediteis. Já não falarei muitas coisas convosco, porque vem o príncipe do mundo. Ele nada pode contra mim, mas para que saiba o mundo que amo o Pai e faço como o Pai me ordenou. Levantai-vos! Vamo-nos daqui!” (Evangelho de João, cap. 14, vv. 27 a 31).
Saída do cenáculo
Tendo Jesus dito isso e depois de terem cantado o hino, ele saiu com seus discípulos e, segundo o costume, dirigiu-se para a outra margem da torrente do Cedron, saíram para o Monte das Oliveiras. (Evangelhos de: Mateus, cap. 26, v. 30 – Marcos, cap. 14, v. 26 – Lucas, cap. 22, v. 39 – João, cap. 18, v. 1a).
A caminho do Monte das Oliveiras
A seguir Jesus lhes perguntou: “Quando vos enviei sem bolsa, nem alforje, nem alparcas, faltou-vos alguma coisa?”
Responderam eles: “Nada”.
Então lhes disse Jesus: “Agora, porém, aquele que tiver bolsa, tome-a; igualmente o alforje; e quem não tiver um facão, venda o seu manto e compre um. Pois eu vos digo, é necessário que se cumpra em mim o que está escrito: Ele foi contado entre os malfeitores. Porque tem um fim o que me diz respeito”.
Eles disseram-lhe: “Senhor, eis aqui dois facões”.
Respondeu Jesus: “É o bastante!” (Evangelho de Lucas, cap. 22, vv. 35 a 38).
Depois da oração, logo depois da ceia pascal, o divino Messias disse as suas últimas palavras e depois saiu do cenáculo com os seus discípulos em direção ao Monte das Oliveiras.
Ao demonstrar confiança com os discípulos, Jesus recomendou a sua paz aos seus apóstolos: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou…”.
A paz do Cristo é a paz da consciência iluminada por intermédio do pleno cumprimento dos deveres designados por Deus. É o sentimento de bem-estar, de beatitude espiritual, provenientes de uma perfeita sintonia com o Eterno. É, ainda, a ausência de conflito consciencial por não causar qualquer dano a outrem, além de ser a suprema felicidade de quem vive nível superior de evolução intelecto-moral.
Embora a paz crística seja resultado de muitas conquistas e lutas espirituais, é possível sentir as dulcíssimas emanações dessa sublime paz advindas de quem emana amor, misericórdia, perdão e humildade.
A paz do mundo gera egoísmo e se deteriora vertiginosamente; a paz de Jesus reconforta e fortalece a esperança.
A paz do mundo adoece, gerando inércia evolutiva e indiferença diante da caridade; A paz de Jesus acalma e cura.
A paz do mundo enfraquece as energias morais, possibilitando quedas de difícil reparação; A paz de Jesus robustece o espírito para novos desafios evolutivos.
A paz de Jesus é eterna e inabalável; a paz do mundo é efêmera e amedrontada.
Mais uma vez, o Messias alertou os seus discípulos para o que ele haveria de passar, mas também os preparou para os testemunhos que enfrentariam: “Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize”.
O Mestre nos conclama à vigilância das emoções.
O coração simboliza o centro das forças emocionais, as quais devem permanecer em equilíbrio para melhor produção espiritual em todos os setores da vida.
Em relação ao medo, em nossa obra Educação Emocional, esclarecemos:
“O medo tem sua origem na ignorância, sempre geradora de incertezas ou de inseguranças diante do desconhecido. Quando se conhece bem algo, passa-se a respeitá-lo, amá-lo, suportá-lo e não a temê-lo. Existem diversos níveis de ignorância, proporcionando inúmeras manifestações de medo.”
O divino Rabi promete o seu retorno depois de seu martírio infamante e, mais uma vez, alerta os seus discípulos a respeito da alegria em se cumprir as determinações do Pai Eterno.
Depois de cantarem um hino, seguindo o costume judaico, o Mestre e seus discípulos saíram do cenáculo rumo ao Monte das Oliveiras, onde costumeiramente se recolhia em orações. Deveria ser entre nove e dez horas da noite. Passariam pelo Vale da Torrente do Cedron, onde fluíam águas das chuvas, sob as lembranças vívidas daquela ceia inesquecível.
A caminho do Monte das Oliveiras, o divino Messias ministrou sublime lição de vigilância espiritual. Ele lembrou aos discípulos de suas recomendações quando os enviou ao ministério apostolar, orientando-lhes que não se preocupassem em levar bolsas, alforges, alparcas ou qualquer bem para a viagem. Diante daquela recomendação aparentemente impossível de ser praticada, o Mestre indagou-lhes: “Faltou-vos alguma coisas?” Eles responderam: “Nada”.
Jesus, então, alertou aos seus discípulos que eles viveriam outra realidade. Ele seria condenado à morte sem julgamento, seria torturado e crucificado sem clemência entre malfeitores, conforme profetizou Isaías (53:12):
“Por isso lhe darei a parte de muitos, e com os poderosos repartirá ele o despojo; porquanto derramou a sua alma na morte, e foi contado com os transgressores; mas ele levou sobre si o pecado de muitos, e intercedeu pelos transgressores”.
A partir daquele momento Jesus recomenda aos discípulos que teriam de levar bolsas, alforjes e até facões porque seriam perseguidos implacavelmente por detratores. No entanto, essa lição é simbólica.
A bolsa do recurso financeiro simboliza o mérito para empreender o trabalho espiritual. O alforje ou alforge que guarda os provimentos materiais representa a consciência plenificada por virtudes. O facão que os pescadores usavam, simboliza a ação da caridade que substitui a capa da passividade ou da indiferença, o que lembra os ensinos do apóstolo Paulo ao asseverar:
“Tomai também o capacete da salvação e o facão do espírito, que é a palavra de Deus” (Efésios, 6:17).
“Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante que qualquer faca de dois gumes, e penetra até a divisão entre a alma e o espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração’. (Hebreus, 4:12).
A partir daquele momento, os discípulos de Jesus deveriam redobrar a vigilância em todos os sentidos. Os dois facões apresentados, os quais foram suficientes para Jesus, simbolizam a cruz em sua horizontalidade nos atos perfeitos entre os homens e em sua verticalidade por intermédio da oração perfeita com Deus.
No Monte das Oliveiras Jesus experimentaria as angústias do sofrimento moral diante da ignorância da Humanidade. Ele seria preso, humilhado, desdenhado, torturado e condenado a morte. Contudo, a história do divino Messias não acabaria com o triunfo da iniquidade e sim com a demonstração do poder infinito de Deus, que vence a morte e a dor com a ressurreição do Espírito Imortal, em seu esplendor, para que o mundo aprenda que nunca a injustiça imperará. A Justiça sempre estará presente, ainda que, aparentemente, dê lugar às loucuras da ignorância e do desamor. Jesus venceu o mundo e a caminho do Monte das Oliveiras ele nos convida a vencermos a nós mesmos ao experimentarmos a sua Paz.
(Emídio Brasileiro é educador, escritor e jurista. É autor da obra “A Caminho do Deserto”, pela AB Editora. É membro da Academia Espírita de Letras do Estado de Goiás, da Academia de Letras de Goiânia e da Academia Aparecidense de Letras)